16 junho 2020

A INTRODUÇÃO DO METICAL EM MOÇAMBIQUE

16 de Junho de 1980. Se ontem se falou aqui de uma operação de substituição do dinheiro em circulação há 75 anos em França, hoje fala-se de uma operação idêntica ocorrida em Moçambique há 40. Só que, para além da operação de permuta, o país adoptou uma nova denominação para a sua moeda, metical, em substituição do escudo do período colonial. O processo estava concebido para tomar três dias (é o que se pode ler na notícia acima), mas irá prolongar-se por muito mais tempo, já que o estado moçambicano estava longe de possuir as capacidades logísticas para montar os milhares de locais de troca que seriam necessários para que os prazos fossem cumpridos. Só mesmo havendo um milagre*... Mas não era de nada disso, dos absurdos de esperar resultados de uma logística que não existia, que se falava nas notícias que por cá se publicavam a respeito do assunto. A ênfase ia inteira para a ideologia e a política, pelas notícias de cima ficava-se a saber que o metical era uma denominação utilizada outrora pelos mercadores árabes e que agora «reaparecia». Nas notícias de baixo, no último dia do prazo, o tom é de satisfação, porque a operação iria ser um«rude golpe para alguns colonos portugueses» que, porque estavam fora de Moçambique e porque as fronteiras permaneceriam encerradas durante o período autorizado de permuta, não poderiam trocar o dinheiro na sua posse pelos novos meticais. Nesse aspecto, não consigo encontrar resultados tangíveis sobre o resultado da operação de introdução do metical que fossem equivalentes aos 92% de sucesso do caso francês. Sobre aquilo que eu considero que seria a verdadeira notícia, o completo fiasco logístico, isso ficava reduzido a um pequeno parágrafo sobre «serem vistas longas bichas de pessoas a trocarem as notas», mas isso era no Maputo, a capital. Do Moçambique profundo, de Nampula ou do Niassa, não se sabia nada de como estava a correr a troca de escudos por meticais mas desconfio que, para o Diário de Lisboa, até era melhor que fosse assim...
* Recorde-se que no exemplo francês de ontem, para os 40 milhões de franceses espalhados por 550.000 km², houvera 34.000 postos em operação durante doze dias; no exemplo moçambicano eram 12 milhões de pessoas espalhadas por 800.000 km² e pretendiam-se obter os mesmos resultados em três dias... Claro que a economia francesa de 1945 estava muito mais monetarizada do que a moçambicana de 1980, mas, mesmo assim, teriam sido precisos muitos milhares de postos de troca guarnecidos por protecção armada para que os moçambicanos pudessem cambiar os escudos por meticais no prazo estabelecido... E, se os houvesse, a propaganda, como o fez a francesa, não teria perdida a oportunidade de se exibir. 

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