
Gerberto de Aurillac foi muito possivelmente a figura intelectualmente mais proeminente da Europa do Século X. Nasceu entre 940 e 950, muito provavelmente de uma família de origens humildes mas conseguiu ser educado no
Mosteiro beneditino de São Geraldo em
Aurillac, próximo do local onde nascera, na região do
Auvergne, no Centro-Sul de França. Terá sido em 967 que
Borrell II, o Conde de Barcelona, de passagem pela Abadia descobriu aquele jovem promissor e integrou-o na sua comitiva.
Durante os dois ou três anos seguintes, Gerberto aproveitou a sua estadia no
Mosteiro (também beneditino) de Santa Maria de Ripoll na
Catalunha para estudar algumas das disciplinas técnicas como a matemática e a astronomia que, na cultura árabe, estavam então mais avançadas do que as suas congéneres no mundo cristão ocidental. Em 970 Gerberto partiu com Borrell II em visita a Roma, onde acabou por impressionar e ficar, primeiro integrado na corte do Papa
João XIII, depois na do Imperador
Otão I.
Já então com uma reputação firmada como professor de matemática, astronomia, lógica e retórica e próximo dos poderosos do Ocidente, Gerberto mudou-se em 972 para
Reims, na região da
Champanhe, no Norte da França, onde continuou a ensinar, acumulando com as funções de secretário de
Adalbero, o poderoso Arcebispo local. Daí, até à data da morte deste em 989, Gerberto foi um dos especialistas em manobras políticas da época, incluindo a eleição em 987 de
Hugo Capeto como Rei de França
¹.
Apesar das enormes ambições de Gerberto de Aurillac, o sucessor de Adalbero como titular da arquidiocese de Reims acabou por ser
Arnulfo que, como filho ilegítimo de
Lotário IV, possuía ascendência real. Contudo, Arnulfo veio a ser deposto através de um Sínodo de Bispos, organizado por Gerberto em 991 que, sem surpresa, acabou por recomendar este último para o substituir no cargo. O
Papa João XV envolveu-se na disputa, promovendo um outro Sínodo que anulou as manobras de Gerberto.
Despojado do cargo, Gerberto resolveu aproximar-se da corte imperial, cujo titular era então o jovem
Otão III (nascido em 980) de quem se tornou um dos professores. E depois daquele Imperador ter forçado a eleição do seu primo direito
Bruno de Kärnthen como Papa, Gregório V (996-999), e depois deste ter morrido de uma forma misteriosa(...), Gerberto de Aurillac viu-se finalmente eleito em Abril de 999 como o primeiro Papa francês, com o nome de Silvestre II. Veio a falecer em Maio de 1003.

Se contei a história da vida de Gerberto de Aurillac desta forma e escolhi o título que lhe dei, foi para distinguir duas formas, uma muito mais correcta que outra, de estruturar uma biografia. É a da carreira de alguém de origem modesta mas muito inteligente, ambicioso e sem escrúpulos que chegou a ser Papa. Mas se a perspectiva fosse apresentada como
a biografia de Silvestre II, a história tenderia a ser regressiva e justificativa de uma carreira que sabíamos de antemão culminaria com o seu Pontificado...
¹ Iniciando uma dinastia que iria reinar ininterruptamente em França até 1789.