16 julho 2024

O IMPACTO EM JÚPITER DO PRIMEIRO FRAGMENTO DO COMETA SHOEMAKER-LEVY 9

(Republicação)
16 de Julho de 1994. O primeiro de vários fragmentos em que se desagregara o cometa Shoemaker-Levy 9 colidiu com o planeta Júpiter. Ao longo dos seis dias seguintes mais vinte fragmentos viriam a embater com o planeta, sempre no hemisfério meridional, deixando observar, à laia de "cicatrizes", as marcas dos violentos impactos, cada um deles libertando quantidades de energia capaz de desafiar a nossa imaginação. Com o maior deles, o G (cada um dos impactos foi designado pelas letras encadeadas do alfabeto), ocorrido em 18 de Julho, estima-se que terá sido libertada uma energia equivalente a seis teratoneladas de TNT (milhão de milhões de toneladas). Impressionante que seja, trata-se de um valor dezasseis vezes inferior ao que se estima que terá sido libertado há 67 milhões de anos na Terra, com o impacto do corpo celeste que pôs fim ao Cretáceo, muito embora aquilo que presenciámos em Júpiter há trinta anos se tenha multiplicado por vinte fragmentos o que aproximará a dimensão dos dois fenómenos. As cicatrizes dos impactos permanecerem visíveis em Júpiter por meses, criando um novo respeito por tudo aquilo que anda por aí a vogar pelo espaço próximo.

15 julho 2024

DONALD TRUMP VAI GANHAR?...

Eu desconfio que a previsão que Donald Trump vai ganhar as próximas eleições presidenciais americanas terá alcançado o estatuto de axioma no panorama do opinionismo nacional. O homem apanhou um tiro de raspão, fizeram-lhe uma excelente foto na ocasião e o eleitorado norte-americano apresenta-se rendido à evidência mística. Até Miguel Esteves Cardoso, que só costuma escrever sobre fait-divers acha que sim. Pois eu acho que talvez não. Não o faço com aquela assertividade de Vasco Pulido Valente, que avaliava a distribuição relativa de opiniões para depois se engajar resolutamente num artigo onde defendia a minoritária e menos razoável, mas com a precaução de quem já se convenceu do desfecho de eleições envolvendo Trump e se enganou redondamente. Mas isso aconteceu em Novembro de 2016 e a lição ficou-me de emenda. Ao contrário do que terá acontecido com mais figuras gradas do opinionismo nacional que, em 2020 e também ainda a meses das eleições, já manifestava opiniões muito concretas sobre o seu desfecho. Miguel Sousa Tavares, que não escreve só sobre fait-divers e que, se calhar, devia escrever apenas sobre fait-divers, aparece-nos abaixo em Agosto de 2020 a dar as eleições daquele ano decididas de antemão para Donald Trump. por todas as razões que ele lá escreve. Ora, interpretar o comportamento e as prioridades do eleitorado americano aqui deste lado do Atlântico, a ponto de antecipar categoricamente o desfecho do que acontecerá em Novembro de 2024, continua a ser um exercício arriscado. Primeiro porque faltam quatro meses até às eleições e, até lá, muitas outras coisas podem acontecer. Em segundo lugar e sobretudo, porque querer interpretar o pensar do eleitorado norte-americano é um exercício arriscadíssimo: ter presumido, por exemplo, que uma percentagem maioritária deles se indignaria com o patrocínio que Donald Trump deu ao assalto ao Capitólio em Janeiro de 2021 foi apenas o maior erro de um encadeado de mal-entendidos quanto à forma como o americano médio pensará. Porque o comportamento do eleitorado nos Estados Unidos é assim tão errático, nada me parece garantir que o episódio de ter apanhado um tiro transformará em simpatias muitas das antipatias anteriormente geradas por Donald Trump. Pode ser que sim, mas nada melhor do que esperar para ver... Para não fazer a mesma figura que Miguel Sousa Tavares fez aqui há quatro anos.

O GOLPE DE ESTADO EM CHIPRE

15 de Julho de 1974. Com o patrocínio da Junta Militar grega a Guarda Nacional cipriota dá um golpe de Estado em Chipre. A ilha de Chipre, que se tornara independente da tutela britânica em 1960, vivia desde então um equilíbrio político periclitante. Os seus habitantes dividiam-se entre uma comunidade grega significativamente maioritária (quase 80% da população), onde, para mais, existia uma facção política que militava pela sua união com a Grécia; mas também existia uma comunidade turca (quase 20%) que recebia uma protecção ostensiva da Turquia, que era o país geograficamente mais próximo. O equilibrista no meio desta situação era um arcebispo ortodoxo, Makarios III, que fora eleito e reeleito e presidia aos destinos da ilha desde a independência. É esse arcebispo-presidente que é dado como morto na notícia acima. Não estava e o assunto irá ter várias outras repercussões, mas dentro de dias regressaremos ao assunto.

POR CAUSA DA ORELHA DE TRUMP, DEVE TER HAVIDO MILHARES QUE SE LEMBRARAM DESTE EPISÓDIO DE «BREAKING BAD»...

...e vieram a este vídeo recordar como ficou a pontinha da orelha descaída de Mike Ehrmantraut depois do tiroteio... Isto de apanhar um tiro na orelha pode ter muito que se lhe diga.

14 julho 2024

O APARECIMENTO DA QUINTA VÍTIMA DE JACK-THE-STRIPPER

Se quase todos ouvimos falar de Jack the Ripper (Jack o Estripador), um assassino em série que, em 1888, se notabilizou por assassinar e esventrar prostitutas em Londres, quase ninguém conhece esta história de um outro assassino em série que apareceu em Londres em 1964. O seu alvo eram também as prostitutas, só que, em vez de as estripar depois de mortas, estrangulava-as e depois despia-as, o que levou a imaginativa imprensa local a baptizá-lo de Jack the Stripper. Porém, a denominação menos imaginativa do caso que perdurou foi a de Hammersmith nude murders. E como o caso precedente do século XIX, a sucessão de assassinatos também parece ter cessado sem qualquer explicação e sem qualquer remota suspeita de quem possa ter sido o seu autor. Mas os contornos da história vieram a ser aproveitados para o argumento de um filme de Alfred Hitchcock.

13 julho 2024

CONSIDERAÇÕES SOBRE A SENILIDADE DOS AUTORES DOS ARTIGOS DE OPINIÃO

Esta piada da edição de hoje do Expresso, publicada naturalmente na secção de o Inimigo Público, e que tem por alvo simultaneamente Cristiano Ronaldo e Joe Biden, teve a virtude de me chamar a atenção para que, caso o actual presidente norte-americano abandonasse a política activa e se remetesse apenas à opinião escrita, os problemas associados às suas condições mentais, que agora suscitam tanta controvérsia, desapareceriam como por milagre. É um milagre dispormo-nos a aceitar por genuínos textos atribuídos a pessoas que vemos, noutras circunstâncias, com visíveis dificuldades em exprimirem-se coerentemente. Assim também é cá em Portugal, onde a opinião de antigos presidentes e de outras venerandas figuras políticas costuma ser publicada com uma deferência acrítica que apenas descredibiliza os responsáveis da comunicação social que lhes dão repercussão (no exemplo abaixo, ironicamente, o protagonista é o mesmo Expresso da piada acima).

CRIAÇÃO DO COPCON, GRADUAÇÃO DE OTELO SARAIVA DE CARVALHO EM BRIGADEIRO

13 de Julho de 1974. Tem lugar a cerimónia de graduação em brigadeiro de Otelo Saraiva de Carvalho, para que este, como oficial general, possa assumir o comando do Comando Operacional do Continente, que virá a ser conhecido por um expoente político-militar do PREC sob a sigla de COPCON. Mas isso seria depois, há cinquenta anos era ainda «uma força militar para defesa do programa do MFA» embora a soberba do seu comandante - abaixo - nada prognosticasse de bom para depois desse Verão de 1974, que ainda foi ameno...

12 julho 2024

«QUANDO SE FIZER A HISTÓRIA DOS ACONTECIMENTOS...»

12 de Julho de 1934. No noticiário internacional, lê-se que Adolf Hitler se tenta demarcar da autoria da purga interna do seu partido, acção essa que ocorrera duas semanas antes e que veio a ficar conhecida pelo título de «Noite das Facas Longas» e que tivera a sua maior expressão política e mediática na execução de Ernst Röhm, o dirigente supremo das SA (Sturmabteilung). Como se pode ler acima, Hitler concedera uma entrevista a um jornal italiano, proclamando a sua impotência em deter a horda de sublevados que assassinara Röhm, nomeadamente porque Röhm não seguira os seus conselhos. No remate da mais despudorada hipocrisia, Adolf Hitler vai ao ponto de dizer que «quando mais tarde se fizer a história dos acontecimentos se verá que ele não é o culpado do fuzilamento de Röhm»... Este é um caso exemplar de quanto a mentira tem a perna curta, muito curta. No dia seguinte ao desta notícia, a 13 de Julho de 1934, Adolf Hitler proferia um discurso no Reichstag que foi radiodifundido e em que ele justificou os assassinatos alegando uma teoria da conspiração e um suposto golpe de Estado iminente por parte das SA: afinal, e ao contrário daquilo que estivemos a ler acima, Röhm fora muito bem assassinado...

Este é o tipo de actuação política típica da extrema direita (como agora temos oportunidade de apreciar em Portugal com André Ventura): um dia dizem uma coisa, no dia seguinte dizem outra completamente distinta, sem se incomodarem sequer a explicar as razões da pirueta.

11 julho 2024

«PASSOS (COELHO) RECUSA NECESSIDADE DO ESTADO INTERVIR NO BES»

11 de Julho de 2014. Ocasião para lembrar como foi a conduta dos responsáveis políticos e financeiros no caso do colapso do Banco Espírito Santo, neste caso concreto o então primeiro-ministro Pedro Passos Coelho. E para relembrar que o tão propagado escrutínio alternativo da comunicação social (o tal quarto poder...) foi uma vergonha. Claro que não se pode pedir à própria comunicação social que agora faça - pelo décimo aniversário - uma evocação séria do seu próprio fiasco.

UM INCIDENTE DE «FOGO AMIGO»

No quadro de uma profunda opacidade informativa quanto a muitos dos acontecimentos associados às guerras que as tropas portuguesas travavam então em Angola e na Guiné, não deixa de ser surpreendente ver esta admissão publicada, de um incidente por «fogo amigo», quando tropas portuguesas dos fuzileiros foram alvejados pela própria FAP no Sul da Guiné, incidente esse de onde haviam resultado três mortos e um número não publicado de feridos. Não é o género de notícia que qualquer serviço de informação de quaisquer forças armadas goste de dar publicidade. O incidente teve lugar em 8 de Julho, três dias antes desta notícia, depreende-se que a presença de forças anfíbias no Sul da Guiné seja ainda uma consequência da Operação Tridente, que decorrera nos três primeiros meses de 1964, mas nada de mais substantivo encontrei sobre o assunto nas pesquisas que efectuei na internet.

10 julho 2024

OS «BOLETINS CLÍNICOS» QUE DEFINEM A «SAÚDE» DO REGIME (2)

Em contraste com os boletins clínicos de Franco do poste anterior, o problema que se põe actualmente com Joe Biden é a pretensão por parte da sua administração de que não são precisos boletins clínicos a respeito das capacidades do presidente. E é assim que nos deparamos com esta situação insólita, sugestiva de que os responsáveis estão a esconder informação, onde as páginas de informação mais honestas a respeito desse assunto serão as do showbiz (acima). É que a George Clooney confesso que tenho uma certa dificuldade em lhe descobrir taticismos políticos que condicionem a manifestação da sua opinião. Acho-o genuíno quando pede que Joe Biden desista. O que não acontece com as restantes grandes figuras do partido democrata. A esses tenho ouvido argumentos sobretudo contra a oportunidade da troca do candidato presidencial nesta altura e nestas circunstâncias, não a favor da prossecução da candidatura.

OS BOLETINS CLÍNICOS QUE DEFINIAM A «SAÚDE» DO REGIME (1)

Dois meses e meio depois do 25 de Abril, Portugal podia agora contemplar de forma distanciada a importância pessoal de um ditador quando ele personificava o regime (como acontecera no próprio país com Salazar). Era só preciso acompanhar as notícias que, a 10 de Julho de 1974, chegavam de Espanha e a importância noticiosa que era concedida ao internamento do caudillo Francisco Franco, e tudo por causa de uma tromboflebite. «Comeu gaspacho, frango e fruta e viu, depois, um programa de televisão a cores num aparelho que foi colocado especialmente no seu quarto» (a televisão a cores era então uma novidade em Espanha). A Espanha entrava então numa fase em que os boletins clínicos a respeito do ditador se tornavam progressivamente mais importantes para a definição de qual era a saúde do regime franquista. Franco contava então 81 anos, a idade com que morrera Salazar.

09 julho 2024

VALE A PENA RECORDAR...

...que se Joana Marques Vidal tivesse sido reconduzida no cargo em 2018, como toda a comunicação social e os comentadores do costume asseveraram que sim, então era muito provável que a procuradora geral da República tivesse hoje morrido em funções. 

A SÉRIO? NÃO ENCONTRARAM MAIS OUTRAS PESSOAS QUE COMPARTILHASSEM A OPINIÃO DO «HACKER PORTUGUÊS RUI PINTO»?

Dando uma vista de olhos à página do Google Notícias deparamo-nos com as reacções à entrevista dada ontem à noite pela procuradora Lucília Gago à RTP. Entre as reacções em destaque, uma que se afigura assaz razoável, muito do senso comum, criticando aquilo que de mais embaraçoso ela ontem disse - a ausência de qualquer contrição pelos erros cometidos pelo ministério público durante algumas destas últimas investigações mais mediatizadas. «PGR "deve ser responsabilizada quando comete erros flagrantes"» É só pena que, naquela página, a opinião não venha acompanhada da identificação do autor... Accionada a conexão para a página original, descobre-se que afinal o autor é o «hacker português Rui Pinto» e que a opinião foi repescada de um tweet que ele publicou... A sério? Lá no Notícias ao Minuto não encontraram mais ninguém que exprimisse aquela mesma ideia? Outras pessoas que não tivessem sido condenadas a quatro anos de prisão com pena suspensa? Pessoas que tivessem o cadastro limpo, por exemplo? Há por aí uma grande confusão entre os jornalistas, quando se decidem a dar destaque à opinião de pessoas só porque elas são conhecidas, quando o que acontece é que as razões pelas quais elas são conhecidas são precisamente as razões que desqualificam as opiniões que elas possam ter.

THE ECONOMIST: UM ENGANO EM GRANDE E UM DISFARCE EM MAIOR

Mesmo para o jornalismo de qualidade é valido aquela princípio que as avaliações dos erros próprios só se conseguem ler nas páginas da concorrência... Foram os próprios que anteciparam resultados que depois os deixaram chocados ao não se concretizarem. E quanto ao problema da governabilidade da França, ele já existia de antemão, as premissas para a sua resolução é que são completamente distintas daquilo que havia sido antecipado por eles.

O DESMENTIDO DOS RUMORES DO ROMANCE DE GINA LOLLOBRIGIDA COM ROCK HUDSON

9 de Julho de 1964. Os jornais dão destaque a uma daquelas fofocas sobre estrelas de cinema que o futuro se encarregará de desmentir implacavelmente. O romance de actriz italiana Gina Lollobrigida com o actor norte-americano Rock Hudson - que haviam acabado as filmagens de Strange Bedfellows - era impossível porque - como se veio a descobrir mais de 20 anos depois - o actor era homossexual. No entanto, estes rumores podiam não ser involuntários, já que dispersavam os outros rumores.

08 julho 2024

«GANDA CAPA. GRANDE VERDADE.» ENORME FIASCO. DESCOMUNAL PIRUETA.

Não me costumo referir por aqui às actividades dos blogues da vizinhança, mas hoje creio justificar-se a excepção, tanto mais que o autor do blogue em causa até dá na televisão. E aquilo para que quero chamar a atenção é para a descomunal pirueta que foi protagonizada pelo autor do blogue em pouco mais de uma semana. Ainda na semana passada Seixas da Costa socorria-se da - inspirada - capa da The Economist para subscrever a tese que o centro político em França iria colapsar. A culpa era do Macron, mas isso já não tinha nada a ver com as opiniões da The Economist, é apenas uma implicação antiga e persistente do embaixador-comentador com o presidente francês. Se ontem terá sido um dia muito feliz para o comentador-embaixador, porque ganhou o seu clube, colateralmente as previsões de Francisco Seixas da Costa a respeito do enterro do centro político francês e de Emmanuel Macron mostraram-se manifestamente exageradas como o havia sido a famosa notícia da morte de Mark Twain. O que os profissionais do palpite costumam fazer nestas ocasiões é ignorarem o assunto, fingirem que não tinham dito nada, mudarem de tema. Ora o bom do nosso embaixador ignorou a gaffe, esqueceu-se do que dissera, mas não mudou de tema. E ainda por cima, fá-lo depois das eleições, para enfatizar - «uma coisa que tem sido pouco dita» - que muitos dos eleitos do centro político («macronistas e LR») devem a sua eleição à desistência dos candidatos de esquerda. Eu não sei quantos foram, teria sido bem melhor e mais intelectualmente honesto que Seixas da Costa os tivesse contado, nem que fosse para comparar esse número com o número de deputados de esquerda eleitos que «devem esse resultado à desistência dos candidatos do centro». Tenho a certeza absoluta que nesse jogo eleitoral táctico contra o Rassemblement National nenhum dos blocos fez um favor ao outro, nem ninguém se terá mostrado mais generoso do que o antagonista.

Como se depreenderá, ontem interrompi o acompanhamento das eleições francesas nos canais franceses e vim ver o que estava a acontecer nos canais informativos nacionais. Num deles pontificava Seixas da Costa a celebrar umas coisas de cachecol posto e a esquecer-se de outras que ele vaticinara. No caso, e em contraste com a atitude dele, eu não tenho qualquer pudor em admitir que ter vindo ver os canais nacionais foi uma péssima decisão e que me enganei redondamente.

A INAUGURAÇÃO DO AEROPORTO DO FUNCHAL

8 de Julho de 1964. Com a pompa e a circunstância como estas ocasiões eram vividas durante o Estado Novo, inaugurava-se na tarde daquele dia o novo aeroporto do Funchal, como se dá conta na primeira página do Diário de Lisboa do mesmo dia. O inauguração foi presidida pelo almirante Américo Thomaz e o primeiro avião comercial a ali aterrar foi um Lockheed L-1049G Super Constellation da TAP (veja-se a fotografia com a assistência ao fundo). Contudo e talvez por causa dos seus quase 70 anos e ainda da sua formação como oficial de Marinha, naquilo que não pode deixar de ser considerado como um anacronismo, o presidente da República deslocara-se para a Madeira... de navio. Não se pode dizer que Américo Thomaz se incomodasse muito a tentar galvanizar os portugueses, dando um exemplo pessoal de adaptação aos tempos modernos, utilizando o transporte aéreo e o novo aeroporto. Ou isso, ou então a confiança na segurança da obra não seria nada por aí além e não quiseram pôr a segurança do presidente em risco - o aeroporto veio a ser local de um grande acidente em Novembro de 1977.

O DIA DO 7-1 DA ALEMANHA AO BRASIL

8 de Julho de 2014. O placard do jogo acima acabou com um Brasil 1 x Alemanha 7. Acresce à humilhação do muito mau aspecto da derrota, o facto de ela ter ocorrido em Belo Horizonte, durante o Mundial de Futebol, em que o Brasil estava a ser o anfitrião e quando as duas selecções disputavam já a meia-final, visando o jogo que decidiria o título. Para além da tragédia nacional que aquele placard representou, o Brasil destacou-se pela rapidez como fizeram humor da situação e como arranjaram logo um bode expiatório, o treinador Felipão.
E como é costume no Brasil, o(s) paineleiro(s) é que tinha(m) explicação para tudo! (abaixo) Aquele é um país em que o que é bom é ser-se paineleiro. Aliás, ontem e a propósito dos comentários nacionais às eleições franceses e aos golpes de rins a que se assistiu, percebeu-se que Portugal também é um bom país para se ser paineleiro

07 julho 2024

JEAN-LUC MÉLENCHON, RUI RIO E A ARTE DE SABER REAGIR A BUSCAS DOMICILIÁRIAS

Quando há poucas horas vi Jean-Luc Mélenchon a antecipar-se a todos na reacção à vitória eleitoral da esquerda nas eleições legislativas francesas, não pude deixar de me recordar desta sua cena a reagir às buscas policiais que, há cinco anos e meio, fizeram, quer a sua casa, quer à sede do seu partido. Foram cenas que, pela sua exuberância insólita (acima e também aqui), percorreram a Europa, e disseminaram uma imagem ridícula, mesmo caricata, daquele político francês. Por muito pertinentes que fossem as suas razões para protestar. Concebê-lo a encabeçar um governo de França é inimaginável, também, ou talvez sobretudo, fora de l'Hexagone. E, porque nestas coisas os jornalistas portugueses se esquecem sempre de fazer comparações com o estrangeiro, especialmente quando essas comparações nos são favoráveis, vale a pena recordar, pela positiva, a atitude contida mas cínica e sarcástica de Rui Rio quando lhe aconteceu precisamente o mesmo, há quase precisamente um ano.

MODERAÇÃO NO IRÃO

No caso do desfecho das recentes eleições presidenciais iranianas, a melhor moderação que se pode aplicar é às expectativas que se queiram fazer sobre a eleição de um presidente considerado... moderado. Isso já havia acontecido há onze anos (notícia da esquerda) e nada mudou de substantivo no Irão. E nada mudará porque o poder de facto pertence ao Supremo Guia Espiritual Ali Khamenei, que sucedeu originalmente ao Aiatolá Khomeini e que detém o verdadeiro poder no Irão desde há já 35 anos. Convém ter presente que nestas eleições presidenciais iranianas não é o verdadeiro poder que está em disputa. Assim como acontece também nas eleições legislativas francesas, já que o assunto vem a propósito...

«CHARIOTS OF FIRE»

7 de Julho de 1924. Tem lugar a final da corrida de 100 metros de atletismo dos Jogos Olímpicos de Paris. A corrida foi ganha pelo britânico Harold Abrahams. A ocasião tornou-se conhecida muitas décadas depois porque constitui o clímax do filme «Chariots of Fire» de 1981 (acima a reconstrução da ocasião feita para o filme, abaixo as verdadeiras imagens da ocasião, desprovidas do charme das primeiras).

06 julho 2024

A SENHORA LÁ ATRÁS QUE, DISCRETAMENTE, VALE € 767 MILHÕES

A esposa de ar macambúzio que agarra desajeitadamente um chapéu de chuva e que aparece por detrás de Rishi Sunak à despedida do nº10 de Downing Street tem uma fortuna pessoal estimada em € 767 milhões (é uma das herdeiras de um dos co-fundadores da Infosys). Apesar da cenografia calculada da ocasião, a verdade é que, para quem não esteja informado, as aparências podem iludir.

OBSERVEM COMO A SIC AINDA O DEIXA POR AÍ À SOLTA...

Aquilo que João Marques de Almeida representa (em termos de imbecilidade) para a comunicação social portuguesa escrita tem o seu correspondente audiovisual na pessoa de José Gomes Ferreira. Também com ele se constatam dez anos de previsões (disparatadas) encadeadas, que são acompanhadas da mais completa impunidade.
Em Julho de 2014, portanto há precisamente dez anos, podemos apreciá-lo acima a jurar pela solidez do Banco Espírito Santo (BES) numa antecipação desastrada ao desfecho de que todos nos lembramos...
Pouco mais de um ano depois, em Novembro de 2015 vêmo-lo falando em economês, mas a agoirar descaradamente o futuro, por causa da perspectiva da formação próxima do governo da geringonça...
Mas, mais do que isso, a prodigiosa capacidade intelectual de José Gomes Ferreira fê-lo transbordar dos terrenos estritos da Política para a (um certo género de) História e mesmo para a Astronomia (como se constata acima)
E demonstrativo que o tempo passa e ele não lhe perde o jeito, ainda em Novembro passado e em plena crise política desencadeada pela demissão do primeiro-ministro António Costa, ei-lo a abocanhar acriticamente um falso tweet desse mesmo António Costa. O seu colega Bernardo Ferrão mal disfarça o desdém enquanto lhe corta a palavra...

A INDEPENDÊNCIA DO MALAWI

6 de Julho de 1964. Com a presença do príncipe Filipe em representação de Isabel II, têm lugar em Blantire, as cerimónias da independência do Malawi, o novo nome da antiga colónia britânica da Niassalândia, adjacente ao Grande Lago do mesmo nome e fronteiriço com Moçambique. O homem forte do novo país, o primeiro-ministro Hastings Kamuzu Banda, era um sexagenário de idade incerta (ainda não havia registos de nascimento na época em que nascera, pouco antes de 1900), que se educara nos Estados Unidos e posteriormente na Escócia, onde se viera a formar em medicina e onde chegara a praticar como clínico. Mas a sua condição de membro da pequena elite africana tornou-o num elemento dirigente natural das organizações nacionalistas que surgiram nas colónias depois de 1945 e que vieram a herdar o poder quando da concessão das independências pelo Reino Unido. A continuação da história do Malawi é uma, mais do que previsível, transformação progressiva do regime numa ditadura pessoal por parte de Banda. Menos de dois meses depois das cerimónias acima, dá-se uma crise em que Banda afasta a maioria dos ministros do seu gabinete. Em 1966, o Malawi torna-se uma república e Hastings Banda o seu presidente. O seu partido passa a ser único. Em 1971 aquele cargo passa a ser vitalício. E o reinado de Banda dura até 1993. As imagens abaixo dão, em contraste com as de cima, uma imagem do que eram as manifestações políticas durante esses primeiros trinta anos de um Malawi independente.

05 julho 2024

«SE ISTO É O QUE ELES TÊM EM STOCK, MAIS VALIA COMEÇAREM JÁ A FAZER O LEILÃO!»

Há muitos anos havia um programa de televisão chamado Rock em Stock. Certo dia, a minha mãe entra na sala durante o programa e, ao ouvir os acordes da banda que então tocava, saiu-se com o comentário «Se isto é o que eles têm stock, mais valia começarem já a fazer o leilão!» A frase perpetuou-se até hoje como o exemplo do que não passa de um ensaio medíocre, mau grado a pretensiosidade do título do programa. A intenção do Expresso e da SIC Notícias ao publicitar a entrevista exclusiva ao procurador Rosário Teixeira era mesmo pretensiosa: alegadamente, ele sairia «em defesa do Ministério Público». Porém, ouvindo os 26 minutos da entrevista é melhor, como recomendava a minha mãe, organizarem já o leilão... Apresentado a princípio como «o procurador da Operação Marquês» (a Operação do processo de José Sócrates), o que ele tem a dizer a respeito dos arrastamentos daquilo que os do MP classificam como mega-processos - o de Sócrates vai em 10 anos! - o que ele disse foi isto:

«Não é desejável, mas é algo que nos é imposto pela própria realidade. A realidade impõe-se porque há mega-processos, porque há mega-realidades. E nós não podemos espartilhar a realidade sob pena de nós começarmos a ver as árvores isoladas e depois não vemos a floresta. E estamos a passar ao lado daquilo que pode ser um ilícito porque simplesmente estamos a olhar para... coisas individuais e sem sentido. E aí coloca-se uma outra necessidade, que é a de apreciarmos as... aaahm... as capacidades instaladas para gerir aqueles processos. É óbvio que uma pessoa que tem um processo desses e que tem, ao mesmo tempo, um conjunto de outras responsabilidades e outros processos, não consegue, ou dificilmente consegue concentrar a sua atenção nesse processo ou nesse mega-processo que requer um envolvimento grande.»

A resposta continua, mas, com a transposição da resposta oral para a sua forma escrita, creio que já deu para perceber que se trata de um nada polvilhado de palavras. E ainda por cima eximindo-se de qualquer responsabilidade por dez anos de investigações que até agora se concretizaram em... coisa nenhuma. Socorrendo-me das suas próprias palavras, entre o «algo que nos é imposto pela própria realidade» considerem a mediocridade dos protagonistas que saem «em defesa do MP».

É ENGRAÇADO COMPARAR AS PROJECÇÕES QUE SE FAZIAM DA ASSEMBLEIA NACIONAL FRANCESA NO PRINCÍPIO E NO FIM DESTA SEMANA

Os 250 a 280 lugares projectados para a União Nacional e aliados reduziram-se subitamente a 190 a 220. O que vale é que, abstraindo-nos deste frenesim opinativo palpiteiro, tudo ficará esclarecido este Domingo.

O 30º ANIVERSÁRIO DA FUNDAÇÃO DA AMAZON: INDISPENSÁVEL E DETESTÁVEL

5 de Julho de 1994. A Amazon é fundada numa cidade dos arredores de Seattle, no estado norte-americano de Washington. Nestes trinta anos tornou-se indispensável: é o sítio onde passei a comprar a maioria dos livros que leio, mas é, ao mesmo tempo, uma organização detestável pela reputação que adquiriu a respeito da maneira como (mal)trata quem lá trabalha.

04 julho 2024

APARENTEMENTE, NO CHEGA TÊM QUE ORGANIZAR MELHOR O «FÜHRERPRINZIP» DE ANDRÉ VENTURA

Afinal, a votação do programa do governo madeirense foi rodeada de intervenções muito assertivas do Chega - «deixa ultimato a Miguel Albuquerque para viabilizar o Programa» seguido de «Miguel Albuquerque volta a não ser claro sobre o que fará se for acusado» - para se concluir com este acima - «Ventura só soube da votação na Madeira no fim do debate». Uma votação em que, ainda por cima, os quatro deputados regionais se dividiram no sentido do voto. Ora qualquer formação política que se preze não gosta de dar estas mostras de descoordenação. Para mais se for uma formação política de extrema direita, descendente dos saudáveis princípios de unidade de comando e de obediência ao líder - o conhecido Führerprinzip. Quando isso não funciona... a referência história e organizar-se uma noite das facas longas, para sanear o partido dos membros mais renitentes como parece estar a acontecer lá pela Madeira. Não sei é se esta última hipótese de trabalho se coloca a André Ventura... (Ah, e não venham com a desculpa que o homem andava entretido com os polícias).

EU NÃO SOU NORTE-AMERICANO, A REVISTA «THE ECONOMIST» TÃO POUCO, MAS HÁ QUE CONVIR QUE APOIADO NUM ANDARILHO «NÃO É MANEIRA DE GOVERNAR UM PAÍS»

«O último debate presidencial foi horrível para Joe Biden, mas o encobrimento que lhe sucedeu está a ser pior. Foi uma agonia assistir a um velho confuso a lutar para se lembrar das palavras e dos factos. A sua incapacidade de argumentar contra um fraco oponente foi desanimadora. Mas a operação dos membro da sua campanha para negar aquilo que dezenas de milhões de americanos viram com os seus próprios olhos é mais tóxica do que qualquer um desses dois aspectos, porque a desonestidade subjacente provoca o desprezo entre aqueles que ouvem as explicações.
A grande consequência foi a de colocar a Casa Branca ao alcance de Donald Trump. Sondagens posteriores revelam que os eleitores daqueles estados que Biden tem de vencer se voltaram contra ele. A sua vantagem pode estar em perigo mesmo em estados antes considerados seguros, como a Virgínia, o Minnesota ou o Novo México.
Joe Biden merece vir a ser lembrado pelo sua actuação e pela sua imagem de decência, não por este seu declínio. É apenas normal que tenham surgido os primeiros políticos democratas destacados a pedir abertamente que ele se afastasse da corrida presidencial. No entanto, aquelas manifestações públicas não serão nada se comparadas a uma onda crescente de consternação que apenas se manifesta em privado. As pessoas têm que se consciencializar que, se não se manifestarem agora, será Trump o vencedor. Para trazer a tal renovação política que a América agora tão claramente precisa, são eles que devem pedir mudanças. E não é tarde demais.
O argumento - correcto - dos democratas é que Donald Trump não tem aptidão para ser presidente. Mas o debate e as suas consequências mostraram é que Joe Biden também não. Primeiro, por causa de seu declínio mental. É verdade que o presidente ainda pode parecer dinâmico durante aparições que sejam curtas e devidamente coreografadas. Mas não se pode administrar uma superpotência apenas com telepontos. E não se pode suspender uma crise internacional apenas porque o presidente padece de jet-lag. Alguém que não consegue terminar uma frase a respeito do Medicare pode ser confiável quando o assunto envolve códigos nucleares?
Pode dizer-se que Joe Biden está inocente do facto das suas capacidades estarem a falhar, mas ele não pode ser absolvido desta sua insistência, instigada pela sua família, pela equipa de topo e pelas elites democratas, de que ele ainda estará à altura do desempenhar a função mais difícil do mundo. A alegação do presidente Biden de que esta eleição é entre o que está certo e o que está errado é destruída pelo facto - prosaico, mas arrasador - de que a existência da sua campanha agora depende de uma mentira.»

O FIM DE TODOS OS RACIONAMENTOS NO REINO UNIDO

4 de Julho de 1954. Só neste dia é que se assinala o fim do racionamento de qualquer produto no Reino Unido. Imposto por causa da Segunda Guerra Mundial, que durou seis anos (1939-45), prolongou-se por mais nove anos depois de ela ter terminado (1945-54).
Numa desforra apenas natural, dali por dez anos, em 1964, os mesmos britânicos elevavam esta outra canção ao seu top de vendas de discos, «Downtown» (a Baixa, em tradução muito livre), um verdadeiro hosana ao consumismo.
Como coincidência adicional, hoje os britânicos vão a votos depois de terem votado para sair da União Europeia em 23 de Junho de 2016, tendo abandonado essa mesma UE em 31 de Janeiro de 2020. O assunto parece encerrado.

03 julho 2024

PAÍSES BAIXOS E A NOTÍCIA QUE HOUVE UM CÃO QUE MORDEU NO CARTEIRO

Quase sete meses e meio depois das eleições legislativas de 22 de Novembro de 2023, finalmente tomou posse o novo governo dos Países Baixos. Há seis meses, houve uma grande animação mediática internacional porque as eleições haviam sido ganhas pelo PVV. O PVV é mais um daqueles partidos-de-um-homem-só-de-discurso-radical, como acontece com o Chega nacional, e o André Ventura lá do sítio chama-se Geert Wilders. E como é um homem só, quando o encarregaram de formar governo... ficou a falar sozinho. OS restantes partidos recusaram-se a integrar um governo que fosse encabeçado por Wilders. Este acabou por desistir ao fim de mais de três meses de esforços, em Março deste ano. Foi uma clamorosa derrota pessoal do próprio, ostracizado pelos seus pares. Os detalhes da constituição do novo governo constam das notícias que ontem saíram a este respeito. Geert Wilders não faz parte do elenco. Se fizesse, as notícias da tomada de posse em Haia não teriam recebido a cobertura discreta que receberam. Consciencializem-se que a comunicação social não é absolutamente nada neutra na forma como nos transmite os acontecimentos. Quando é o cão a morder no carteiro não lhes interessa nada - o que importa é ser o carteiro a morder o cão! Extrapole-se daqui que, entre nós, André Ventura não tem a importância que parece nos media, a importância vem de quem dá ressonância ao que ele diz e faz.

O PROJECTO «ITHACUS»

Entre os projectos militares mais surpreendentes que nunca avançaram conta-se este foguetão intercontinental de transporte que constituía notícia a 3 de Julho de 1964, após o encerramento da 1ª Reunião Anual do Instituto de Aeronáutica e Astronáutica. Será desnecessário explicar em que consistia a ideia: a notícia acima explica-o. Assim como se afigura óbvio que essa ideia estava muito longe de se concretizar: seria necessário esperar ainda uns dez a doze anos (1975) e investir os «fundos necessários» (que não são estimados sequer...). Mas o objectivo estratégico do foguetão «Ithacus» parecia límpido: como potência hegemónica, os Estados Unidos passariam a dispor de meios para colocar uma unidade militar de poder de fogo significativo em muito poucas horas em qualquer local do mundo onde Washington considerasse que os seus interesses estivessem a ser ameaçados: um golpe de estado hostil num país aliado, por exemplo.
O projecto e a ideia de «Ithacus», apesar de imaginativa e engenhosa, tinha dois óbices. O primeiro e mais imediato era o seu custo e a sua eficácia, quando comparado com uma operação aerotransportada mais convencional, que colocaria os mesmos efectivos e as mesmas cargas no mesmo local, só que uma dúzia de horas depois. Seria que os custos - astronómicos - do projecto valeriam essas escassas horas de antecipação? O segundo óbice era de cariz mais estratégico e os responsáveis militares e políticos norte-americanos só se vieram a aperceber dele depois de efectuarem vários outras intervenções no Mundo, como a do Vietname, do Iraque ou do Afeganistão. O problema principal para os Estados Unidos nunca se põe quanto à celeridade como chegam aos locais de intervenção, localizem-se eles onde for por esse Mundo fora; o grande problema dos Estados Unidos têm sido sempre as condições de dignidade como depois conseguem sair desses locais. No Afeganistão, por exemplo, passaram 20 anos (2001-21) por lá e os resultados finais foram os que foram...

02 julho 2024

SOBRE UMA CERTA MEDIOCRIDADE DO ACOMPANHAMENTO INFORMATIVO DE ELEIÇÕES ESTRANGEIRAS

Este Domingo houve eleições legislativas em França e na próxima Quinta-Feira havê-las-á no Reino Unido. Qualquer delas muito interessantes e importantes. Só que o acompanhamento que os canais informativos portugueses fazem destas eleições é... medíocre. A culpa nem é dos convidados. Alguns, nem todos, sugerem, pelas suas intervenções, quão aprofundados são os seus conhecimentos sobre a matéria. O problema é que eles são convidados pelos jornalistas do estúdio a reexplicar (pela enésima vez!) todas as particularidades daquele acto eleitoral - que são as mesmas dos actos eleitorais precedentes! É uma forma de se perder e de enxotar uma parte importante da audiência: os espectadores que sabem esses detalhes elementares mudam imediatamente de canal e só lá ficam a assistir aqueles que já se tinham esquecido do elementar. Forma-se assim um circuito fechado em que os comentadores portugueses em estúdio, uns mais esforçados, outros mais pedantes, dissertam sobre uns tópicos mais elementares, outros tópicos mais superficiais, para uma audiência que as circunstâncias do formato do programa tornaram pouco exigente: por exemplo, ficaram a saber que as eleições francesas são a duas voltas, e que tudo - a composição da Assembleia Nacional - só ficará decidido daqui por uma semana, mas da próxima vez que houver eleições em França eles já se esqueceram disso tudo. É que as últimas eleições legislativas francesas tinham sido apenas há dois anos...

Indo recuperar aqueles que, a meio da narrativa precedente já se tinham ido embora, cansados de ouvir lugares comuns, vamos encontrá-los durante estas noites eleitorais nos canais mais elevados e escondidos das grelhas, acompanhando a informação e a opinião junto de fontes mais originais (no duplo sentido da palavra...). Foi assim no Domingo passado (França) e irá ser assim na Quinta-Feira (Reino Unido) e no Domingo próximos (outra vez em França). Confesso que fico bastante intrigado quando vejo certos comentadores televisivos domésticos de assuntos internacionais a mostrarem-se tão cheios de si próprios.   

O CASO DO DUELO DE ESGRIMA DO PRESIDENTE DO MINISTÉRIO

O dia 2 de Julho de 1924 foi muito animado. Da parte da manhã houve um duelo de Honra na Tapada das Necessidades entre o próprio chefe do governo, o presidente do Ministério, Álvaro de Castro e um dos oficiais-aviadores, o capitão Ribeiro da Fonseca, daqueles que se haviam sublevado no início do mês anterior contra as directrizes do governo. Refira-se que o desafio para o duelo de esgrima que a fotografia mostra, partira do chefe de governo. Concluído o duelo, e como se pode ler noutra notícia do jornal, os duelistas haviam ido para o hospital de São José tratar dos ferimentos, mais graves no capitão Ribeiro da Fonseca que ficou internado. Depois dos curativos, e crendo-se reforçado pelo significativo político da sua vitória no duelo, depreende-se que o presidente do Ministério fora tentar reconstituir o Ministério, já que se encontrava a braços com mais uma crise governamental. Ao fim da tarde, já Álvaro de Castro se convencera que a espadeirada fora em vão e desistira de organizar um novo gabinete, enquanto dois representantes do Partido Democrático se apresentavam em Belém para indicar o nosso conhecido Rodrigues Gaspar como sucessor de Álvaro de Castro. Apesar dos predicados do novo presidente, o novo Ministério não vai chegar sequer ao fim do ano. Quando leio estes episódios da politica da primeira República tendo a dar a mão à palmatória nas minhas críticas à incompetência e irresponsabilidade de Pedro Santana Lopes: nomeado primeiro-ministro em 2004, ele pode ser visto como alguém que chegou apenas com 80 anos de atraso à política... Se calhar, em 1924 ele teria passado desapercebido.

A FUNDAÇÃO DA FORÇA AÉREA FRANCESA

(Republicação)
2 de Julho de 1934. Foi a data da fundação da Força Aérea Francesa (Armée de l'Air) como um ramo autónomo das suas Forças Armadas. Já se haviam passado 16 anos depois da criação equivalente da RAF (Royal Air Force) entre os seus antigos aliados britânicos, ainda durante a Primeira Guerra Mundial (a 1 de Abril de 1918), mas acredita-se que esta decisão terá sido precipitada pela criação no ano anterior e ainda às escondidas, da equivalente Luftwaffe, entre os seus antigos inimigos e ainda rivais alemães. Porém, formalmente, esta última só aparecerá em 26 de Fevereiro de 1935. Mas, ao contrário das outras duas, a Armée de l'Air francesa, derrotada na Primavera de 1940, teve uma importância negligenciável para o desenrolar das operações aéreas da Segunda Guerra Mundial. O prestígio do ramo, com as Aventuras de Tanguy e Laverdure, são uma criação bem posterior, da década de 1960, na BD e na televisão...

01 julho 2024

ELE QUE TENHA CUIDADO E NÃO DEIXE CAIR O SABONETE QUANDO ESTIVER NO DUCHE

Entre aquela fauna que rodeia Donald Trump, há aqueles que, se isso for concebível, são ainda mais detestáveis do que o próprio, pela insolência e pela arrogância como se exprimem na comunicação social. É reconfortante por isso vê-los a pagar judicialmente o preço dessas atitudes, neste caso concreto, a cumprirem penas de prisão por se terem recusado a acatar as intimações para comparecerem diante de comissões do Congresso que investigavam temas - o assalto ao Capitólio - em que lhes seria inconveniente prestar contas. Depois de usarem todos os expedientes legais (dois anos a emperrar!), os craques que alegavam não se intimidar com nada que a comissão lhes fizesse, acabaram finalmente dentro. Já em Março deste ano isso aconteceu com Peter Navarro, hoje calha o dia a Steve Bannon. Ambos apanharam quatro meses e os votos - maldosos mas sentidos - para o que já lá está e para o que hoje vai lá para dentro, são para que não deixem cair o sabonete quanto forem ao duche...

ALGUMAS MODALIDADES OLÍMPICAS DE HÁ 120 ANOS

1 de Julho de 1904 foi o dia do início das competições dos Jogos Olímpicos de 1904, que se disputaram na cidade norte-americana de Saint-Louis no Missouri. Estas edições iniciais dos Jogos Olímpicos - esta era a III Olimpíada, depois das de Atenas (1896) e Paris (1900) - são hoje eventos que só ocasional e discretamente são evocados pelo Comité Olímpico, por causa de várias circunstâncias exóticas a eles associadas: neste caso concreto de há 120 anos disputaram-se competições olímpicas de corridas de sacos, saltos do barril e cuspidelas de tabaco. Concordemos que são aspectos que retiram dignidade ao passado olímpico...
Mas convém fazer estas evocações com o distanciamento e a consciência de quanto as modas e as dignidades são passageiras, para imaginar aquilo que se virá a comentar em 2144 sobre uma nova modalidade olímpica intitulada breakdance que irá ser estreada nos próximos jogos olímpicos de Paris...

OBSERVEM COMO O OBSERVADOR AINDA O DEIXA POR AÍ À SOLTA...

1 de Julho de 2014. O quase recém nascido Observador ainda anda à procura de nomes de colunistas que o projectem. E então desencantaram este João Marques de Almeida. Nem vale a pena desancá-lo. Basta que o leitor leia o que ele há precisamente dez anos antecipava que aconteceria com a candidatura presidencial de Marcelo Rebelo de Sousa. Ou então aquilo que, noutro rasgo de presciência, nem duas semanas depois, augurava para o futuro do Bloco de Esquerda (abaixo). Mas o que eu considero verdadeiramente prodigioso, não é apenas, nem sobretudo, João Marques de Almeida ter escrito estes disparates há dez anos e ter saído impune. O prodígio é ele ter continuado a escrever aleivosias deste mesmo género, e o Observador ter continuado a dar-lhe palco por dez anos a fio. Ainda lá continua. Entre a colecção de disparates que tem escrito mais recentemente, destaco, mais pelo impacto imediato dos títulos do que pelos conteúdos: Miguel Morgado para o Parlamento Europeu (não foi sequer escolhido) ou então O Chega ajuda a democracia portuguesa (tem-se visto a ajuda que o governo da AD tem recebido do Chega!). O que é misterioso nestes casos não é a existência destes medíocres, são os processos misteriosos que os fazem subsistir com esta projecção por anos a fio.

30 junho 2024

OPERAÇÃO RESGATE DE BIDEN

O subtítulo deste artigo da The Economist de hoje marcou-me: «Há qualquer coisa de trumpico na atitude negacionista da realidade do(s responsáveis) do partido democrata.» Como se pode ler no artigo, entre esses responsáveis obtusos contam-se os ex-presidentes Barack Obama e Bill Clinton e a antiga presidente da Câmara dos Representantes, Nancy Pelosi. Tudo gente respeitada e influente que coloca a sua recomendação em confronto com aquilo que os eleitores americanos - como diria uma poeta portuguesa - «vemos, ouvimos e lemos, não podemos ignorar». E as cenas que são visíveis audíveis e legíveis são múltiplas, como esta ocasião exemplar que aparece abaixo, recolhida na Cimeira do G7 em Itália ainda há quinze dias, onde o presidente americano se comporta durante a cerimónia como se fosse aquele avozinho senil que é preciso vigiar discretamente para não fazer asneiras quando não pode ter pessoas do staff por perto. Eu não sou americano, mas, se o fosse, e depois de ter desistido de compreender porque é que o candidato republicano iria tornar a ser Donald Trump, alguém teria de me explicar agora porque é que o candidato democrata ainda tem de ser Joe Biden.

A NOITE DAS «FACAS LONGAS»

(Republicação)
30 de Junho de 1934. Depois de 17 meses no poder, Adolf Hitler procede a um ajuste de contas com aqueles que, dentro do próprio aparelho do partido e mesmo das áreas ideológicas que lhe são adjacentes, ele considera ainda passiveis de o desafiar. Para ilustrar a vaga de execuções que então teve lugar, o cabeça de cartaz costuma ser Ernst Röhm (acima vemo-lo ao lado de Adolf Hitler e na foto abaixo, autoconfiante, aparece acompanhado de um Heinrich Himmler que parece escutá-lo atentamente). A entrada da Wikipedia em alemão relativa aos acontecimentos, em vez da referência às facas longas comuns a todos os outros idiomas, tem até o título de «Röhm-Putsch», como que a validar a versão oficial de que houvera uma tentativa de golpe a justificar a violência que se seguiria. A identidade dos executados caracterizou-se afinal pela sua heterogeneidade, porque para além de Röhm e outros que lhe eram considerados próximos, incluiu pessoas de perfis tão díspares quanto um antecessor do próprio Hitler como chanceler (chefe de governo), dissidentes da ala esquerda do partido nazi e políticos bávaros com quem os dirigentes nazis tinham contas pessoais a ajustar. Quanto ao número de assassinados, cerca de uma centena, talvez menos, ele pode afinal ser considerado pequeno, considerando tudo aquilo que o III Reich virá a fazer, mas convém não perder de vista a forma intimidatória como os acontecimentos foram apreciados na época, ao assistir-se ao próprio regime que está no poder a permitir-se recorrer a execuções extrajudiciais para regular as suas disputas políticas internas, qual gangue de mafiosos. Esta última comparação até faria sentido se na Alemanha houvesse mafiosos; ora na Alemanha não há mafiosos: os alemães são um povo muito organizado em tudo, menos no crime - o crime organizado que exista na Alemanha deve-se às mafias italianas, turcas, russas, etc. Mafias alemãs não há, nem nunca ninguém ouviu falar...