Enganei-me redondamente. Afinal, António Guterres vai ser o próximo secretário-geral da ONU. Há uma prevalência histórica das práticas ocultas da diplomacia que me leva sempre a apostar por prudência no lado negro da força. Acerta-se na maioria das vezes mas há outras em que se perde. Como aconteceu desta vez. Convém contudo recordar que a história estava do meu lado, que aquelas mesmas práticas ocultas haviam permitido eleger há 45 anos, com o beneplácito de norte-americanos mas também de soviéticos, um diplomata austríaco¹ (Kurt Waldheim) com um mais do que equívoco passado durante a Segunda Guerra Mundial. Se calhar, aqueles que estavam convencidos de que desta vez ainda iam a tempo de reverter o novo regime aberto de avaliação dos candidatos, cometeram um clamoroso erro de avaliação. E também invocaram o santo nome da Rússia em vão – e eu acreditei ... Vê-se agora que, se a Rússia estivesse mesmo interessada em explorar uma outra solução que não Guterres, ainda teríamos conversa para, pelo menos, mais umas semanas.
Como a conquista do campeonato europeu de futebol em Julho passado, a eleição de António Guterres é um daqueles acontecimentos importantes em Portugal, mas o que eu mantenho é as mesmas dúvidas que já aqui havia expresso que isso seja um acontecimento importante para Portugal. Trocava-o de muito bom grado e de coração leve por outras taxas de crescimento económico para o nosso país. Só que os assuntos não são permutáveis. Mas num universo em que me vejo acompanhado nas redes sociais por quem costuma mostrar-se de uma presciência cristalina – ou, como dizia Álvaro de Campos no seu Poema em Linha Recta, Nunca conheci quem tivesse levado porrada, Todos os meus conhecidos têm sido campeões em tudo. – tomei por natural e para contraste aqui vir confessar este meu engano evidente: António Guterres vai tornar-se o próximo secretário-geral da ONU². Só espero mesmo que não seja no turno dele que os extraterrestres nos venham visitar, para que ele não tenha que decidir... Isso já sabemos que não é o seu forte.
¹ E, já agora, recordar que a Áustria era um dos poucos países europeus considerados neutros, não pertencia nem ao Ocidente nem à Europa Oriental. Esta coisa do secretário-geral ter de pertencer por rotação a um dos blocos virtuais da ONU era uma tradição rígida que tem dias... para ser invocada. Aliás, a eleição de Guterres acabou de a desmentir.
² E, por se falar em proximidade e familiaridade com o secretário-geral da ONU, quantos se lembrarão ainda que Javier Pérez de Cuéllar tinha uma filha que residia em Portugal, onde ele vinha com alguma regularidade passar as férias de Natal?
Só o Aníbal é que nunca se engana.
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