25 julho 2020

O RELATÓRIO DE RÜTLI

25 de Julho de 1940. Numa reunião magna, que juntava os 650 oficiais mais graduados do exército suíço, desde os comandantes dos corpos de exército até aos de batalhão, o general Henri Guisan (acima), Comandante em Chefe, expunha os seus planos para a contingência de uma invasão alemã, agora que os exércitos ocidentais (francês, britânico, belga, holandês) haviam sido derrotados e que o país se apresentava rodeado pela Wehrmacht ou pelos seus aliados italianos. O local escolhido para a reunião, Rütli, junto ao Lago Lucerna, possuía um significado reforçado na identidade suíça, pois fora ali que, em 1291, se pronunciara o juramento que forjara o primeiro pacto entre cantões que estivera na origem da confederação helvética. Os planos de contingência anunciados pelo general Guisan naquele dia previam à retirada do dispositivo militar que defendia as fronteiras da Suíça até um reduto nacional, ocupando o centro do país em caso de invasão. Ao contrário de tantos outros planos militares, incluindo-se neste caso, os do lado alemão, precisamente para invadir a Suíça (a operação Tannembaum), os planos e as intenções do alto comando militar suíço eram para ser conhecidos: internamente para animar os próprios suíços; e externamente para refrear as intenções dos potenciais inimigos - a Alemanha e a Itália. «Enquanto na Europa houver milhões em armas e enquanto houver forças importantes capazes de nos atacar a qualquer altura, este exército tem que permanecer mobilizado». A questão da mobilização do exército suíço era primordial, já que os seus efectivos, da ordem de mais de meio milhão de homens, só era possível de manter com a convocação dos reservistas para as fileiras. Mas havia mais um pormenor: «Não prestem atenção àqueles que, por ignorância ou más intenções, espalham notícias derrotistas e dúvidas. Devemos confiar não apenas no nosso direito mas também nas nossas capacidades, que nos possibilita, se todos manifestarmos uma vontade de ferro, defendermo-nos com sucesso.» O destinatário desta passagem era o presidente do Conselho Federal, Marcel Pilet-Golaz que, precisamente um mês antes (25 de Junho) e perante o que acontecera à França cinco dias antes, fizera um discurso radiofónico de conteúdo assaz acomodatício com aquilo que se tornara a nova realidade europeia - a hegemonia alemã. Tecnicamente, Rütli é um golpe militar, ainda para mais praticado na civilizadíssima Suíça: o poder militar subleva-se contra a condução da política externa praticada pelo poder político. Acresce-se à ironia da situação que o fascista ali seria Henri Guisan, simpatizante do SVV (Federação Patriótica Suíça), enquanto Marcel Pilet-Golaz era membro do partido Liberal. Avaliando-o pelo que sabemos agora, o Relatório de Rütli não constituiu um elemento de dissuasão: mesmo depois delas, Adolf Hitler nunca abandonou a ideia de vir a controlar a Suíça. Mas estas declarações de há oitenta anos de Henri Guisan, que deixaram Berlim em fúria, terão evidenciado em que circunstâncias é que os alemães o teriam que fazer, e eles tinham muitas outras prioridades militares para além da Suíça. Como aqui não me canso de frisar, os países que conseguiram permanecer neutrais durante toda a Segunda Guerra Mundial, para o conseguir, fizeram-no sempre em circunstâncias muito nebulosas. Já agora, e porque se trata da Suíça, vale a pena relembrar o Caso Dänicker, aqui contado em 2015.

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