18 julho 2022

OS EXCURSIONISTAS EXÓTICOS

18 de Julho de 1962. A notícia dá conta do desembarque de 1.100 excursionistas exóticos britânicos que realizavam um cruzeiro a bordo do paquete Ibéria (por sinal, um navio azarado, onde estavam sempre a acontecer coisas, mas isso não interessava nada! - como mais tarde viria a consagrar em expressão a Teresa Guilherme). O que interessaria ao jornalista era que o navio aportara a Lisboa, com os tais excursionistas exóticos que, por uma vez e para aparente desapontamento de quem escrevia a notícia, não eram «milionários», mas apenas «remediados». Essa circunstância menor não os impedia de exibir «novos modelos de vestidos», «exuberantemente decotados», «ostentando» «chapéus das mais variadas cores e feitios». «As senhoras idosas» ou os «casais mais respeitosos» nada ficavam a dever aos restantes em «exotismo», embora a palma desse exotismo fosse aparentemente - até com direito a fotografia e tudo! - para um cavalheiro que ousara desembarcar em calções! (não se estivesse em Julho)
Enfim, pondo as ironias de parte, toda esta redacção do jornalista do Diário de Lisboa é, vista a esta distância, profundamente triste, embaraçante, evocativa de cultura complexada de provincianos de aldeia como então se vivia em Portugal e se contemplavam o comportamento dos vizinhos europeus, e ainda se torna mais indesculpável quando se constata o retrocesso em que a sociedade portuguesa havia recaído. É que, durante o princípio da década de 1940, quando Lisboa fora inundada de refugiados europeus por causa da Segunda Guerra Mundial, a cidade tivera uma oportunidade para se tornar cosmopolita. Como se percebe e aparentemente, vinte anos passados, a ocasião fora desperdiçada. A bem de uma narrativa desculpabilizadora, é comum culpar Salazar por esta mediocridade, mas, nomeadamente em termos culturais e de costumes, parece-me evidente o quanto a culpa daquela ocasião perdida é colectiva, a começar pelas nossas elites.

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