Tobruk é uma
cidade líbia, um dos desperdícios da natureza quando colocou um dos melhores
portos naturais do Mediterrâneo no meio de nenhures. Quiseram as vicissitudes
da Segunda Guerra Mundial que se tivesse transformado de um objectivo táctico secundário
num objectivo simbólico importantíssimo: capturada aos italianos logo em Janeiro
de 1941, veio a ser depois cercada quando do contra-ataque do Afrika Korps germânico
três meses depois. No meio do colapso provocado pelas forças de Rommel, a resistência da guarnição multinacional¹ de Tobruk, que se veio a prolongar por
240 dias, tornou-se numa epopeia amplamente explorada pela propaganda aliada.
Mais ainda quando o cerco veio a ser levantado em Dezembro de 1941.
Imagine-se
agora a reacção da opinião pública britânica quando, por ocasião de um novo
contra-ataque do Afrika Korps de Rommel, a cidade vem mesmo a cair em seu poder
em 21 de Junho de 1942! Milhões que não faziam sequer a mínima ideia da
existência de Tobruk antes de 1939 mostravam-se agora ultrajados com a sua
queda, que se tornara em mais um acontecimento funesto num encadeamento deles
que se sucediam desde 1941: a expulsão da Grécia e de Creta, o afundamento do
Prince of Wales, as perdas de Hong Kong, da Birmânia, da Malásia e de
Singapura. É aproveitando este ambiente político hostil que um deputado conservador,
John Wardlaw-Milne, apresenta uma moção de não-confiança no Parlamento.
O debate
teve lugar a 2 de Julho de 1942. O proponente é um franco-atirador da ala mais
conservadora do próprio partido de Churchill, mas a moção, que propõe que se
atribua a condução política e militar da guerra a duas pessoas distintas, tem o
apoio explícito da acrimónia de algumas personalidades que haviam sido aliadas
do primeiro-ministro em 1940, mas que entretanto se haviam afastado dele como Hore Belisha ou o prestigiado Almirante Roger Keyes. Como é costume, a posição da
maioria dos deputados era... reservada. É verdade que o movimento cometeu um
verdadeiro hara-kiri político quando propôs o Duque de Gloucester, irmão do
rei, para o lugar de generalíssimo, mas vale a pena conhecer a habilidosa
resposta de Winston Churchill…
Longe de
deflectir as críticas aos resultados da condução da guerra, o primeiro-ministro britânico acentuou-as no discurso que dirige à
Câmara dos Comuns: As nossas forças eram superiores às do Eixo. Tínhamos cem
mil homens, entre as várias forças do nosso Império, contra noventa mil, dos
quais apenas cinquenta mil eram alemãs. Possuíamos superioridade em artilharia
na proporção de oito para cinco (…) Contudo, Tobruk caiu num único dia de
combates. Recuámos (…) colocando cento e vinte milhas de deserto entre o VIII
Exército e o inimigo. Cinco dias depois, Rommel apresentou-se em frente desta
nossa nova posição e tivemos de partir novamente, regressar ao Egipto, recuar
até El Alamein (…) Não compreendo o que se passou…
A moção foi amplamente derrotada: 476 votos contra 25. Mas isso é o que menos
interessa que se conclua desta história. As grandes carreiras políticas – e
poucos se poderão orgulhar de ter tido uma que supere a de Winston Churchill – não
se fazem apenas de momentos de grande assertividade e de proclamações de inflexibilidade. Ele há também que saber fazer a contrição de reconhecer o que está mal quando está mal. Será
essa flexibilidade que as torna grandes...
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