31 janeiro 2020

«VERGONHA ALHEIA»

Ainda bem que o episódio da deputada do Livre se concluiu com a retirada da confiança política à visada, já que o arrastamento da decisão estava a levantar a hipótese de que o emprego da expressão «Vergonha Alheia» passara a ser mais uma daquelas boas expressões da língua portuguesa que fora oportunisticamente desvalorizada pela retórica da utilização política. Para mim, nem é uma questão política, trata-se mais uma questão de não malbaratar demasiado o português que vivenciamos...

NEVOEIRO NO CANAL, O CONTINENTE ESTÁ ISOLADO!

Quem o quiser fazer, pode procurar esclarecer-se se o famoso cabeçalho «Fog in Channel Continent Cut Off» é fidedigno ou não passa, afinal, de um daqueles mitos que pegaram. Em meu socorro invoco a sabedoria de um dos tais povos que irá ficar isolado a partir de hoje, o italiano, que forjaram a locução ideal para estas circunstâncias onde a verdade não será o mais importante: «Se non è vero, è ben trovato". A ocasião solene da saída do Reino Unido da União Europeia, porém, não nos deve fazer esquecer que, ao contrário da bandeira britânica em vias de ser removida na fotografia acima, quase todos e os principais problemas consequentes daquela saída permanecem pendurados de resolução. No meio do naturalíssimo barulho que a comunicação social está a fazer a propósito da ocasião, isso é aquilo que me parece mais importante de reter: depois do referendo de Junho de 2016, em três anos e meio empurraram-se os problemas com a barriga. Algures no futuro eles terão que ser resolvidos.

30 janeiro 2020

O PRIMEIRO MCDONALD'S DE MOSCOVO

30 (ou 31?) de Janeiro de 1990. Abertura do primeiro estabelecimento da cadeia McDonald's na capital Soviética. Os preços não são nada convidativos pelos padrões locais, já que um Big Mac custa o mesmo que um passe mensal de transportes colectivos, mas, segundo os números que vieram a ser mais tarde apresentados pela multinacional, só nesse dia cerca de 15.000 moscovitas fizeram fila à porta do estabelecimento para se iniciarem num dos rituais mais elementares da sociedade capitalista (abaixo). Segundo esses mesmos relatos, se os moscovitas estavam habituadíssimos às filas, não o estariam ao comportamento cortês e sorridente dos empregados...
Tanto terá sido o impacto cultural adverso em consumidores que estavam habituados a que os empregados dos estabelecimentos comerciais se estivessem positivamente cagando para cativar os clientes, que uma circular posterior da gerência do McDonald's moscovita instruiu os empregados para que fossem menos sorridentes e afáveis quando atendessem a clientela. Enquanto isso, e por cá, resistia-se como se podia aos novos tempos. O Diário de Lisboa do dia, cujas tendência pró-comunista se mantinha, fazia mais um esforço de spinning com o titulo Perestroika em apuros... Subentendido à escolha daquelas palavras, nem parecia que era o comunismo que colapsava, o cerne do problema seria a iniciativa de Gorbachev de o reformar...
Ainda hoje no nº3 da Soeiro Pereira Gomes se acredita como um dogma de fé que o que terá matado o paciente foi o tratamento para o cancro e não o cancro propriamente dito...

29 janeiro 2020

«NÃO QUERO FICAR ENTALADO ENTRE A JOACINE E O ANDRÉ»...

Sem calhar não será bem assim como se descreve acima, o entalanço é outro... Depois de o Observador ter perdido as suas apostas nas campanhas internas tanto do PSD (onde se mostraram escabrosamente parciais por Luís Montenegro) como do CDS (mais discretamente parciais por João Almeida), o que se constata é que o Observador e o seu liberalismo à outrance, a estarem entalados, estão-no agora entre o Rui Rio e o Chicão. Se a política portuguesa funcionasse por afinidades ideológicas, então poder-se-ia afirmar que o Observador estará por uns tempos confinado, na frente política, ao terceiro partido monorepresentado na AR, a Iniciativa Liberal (IL) de João Cotrim Figueiredo. Mas já se percebeu que o financiamento desta última organização vem de outras paragens. É assim improvável que se forje uma aliança entre as duas facções liberais rivais. Afinal uma foi a votos (IL) e a outra passeia-se opinando avonde pelas televisões enquanto o jornal monta campanhas de opinião para que os compromissários da causa se apoderem por dentro dos partidos pré-existentes. Que falharam, só que, como seria de esperar, no próprio Observador esqueceram-se de reconhecer isso. Não tendo dúvidas que o Observador e o seu publisher não quererão ficar entalados, mas não é no espaço político acima descrito, nem pelas causas acima sugeridas.

A QUEDA EM ESPANHA DA DITADURA DE PRIMO DE RIVERA

29 de Janeiro de 1930. Com a apresentação da sua demissão ao rei Afonso XIII, dá-se em Espanha a queda da ditadura de Primo de Rivera. Nesta época em que se nota uma certa propensão para encarar de forma benigna os homens fortes e providenciais, nomeadamente na própria Espanha, vale a pena invocar esta ditadura de mais de seis anos que há noventa anos terminou esvaziada de apoios, fossem eles do exército e da marinha ou ainda das chamadas forças vivas e dos intelectuais e também do próprio rei. Nesta mesma Espanha, Vox regressa como uma evolução dessas mesmas pulsões, agora adaptadas ao Século XXI.

28 janeiro 2020

OUSADIAS E SINCRASIAS DO MARCELISMO

28 de Janeiro de 1970. O país que acompanha a situação política é surpreendido com a notícia que na Assembleia Nacional haviam sido apresentadas duas listas para a composição da Comissão do Ultramar. Indo ao detalhe, só os iniciados compreenderiam a subtileza do que estava em causa, já que as listas concorrentes eram quase idênticas a não ser pela substituição na segunda (B) dos nomes de alguns ultras do regime (Henrique Tenreiro ou Fernando Sá Viana Rebelo, irmão do ministro da Defesa Nacional e do Exército) por deputados recentemente eleitos, conotados com o reformismo, e que formavam aquilo que se veio a designar por ala liberal (é o caso de José Pedro Pinto Leite). Mas o verdadeiro inusitado da situação, que acima aparece destacado, é que aquela constituiria a primeira vez, em mais de trinta anos de trabalhos da Assembleia do Estado Novo, que apareciam duas listas para a constituição de um mesmo órgão! Erigira-se um regime à volta do aforismo Tudo pela Nação, nada contra a Nação, escolhera-se o nome de União Nacional para a organização que o corporizava, organização essa aliás ao abrigo da qual todos aqueles deputados haviam sido eleitos três meses antes e agora acontecia isto?! Que é feito da União?
Algumas páginas mais adiante e, muito oportunamente, naquele mesmo jornal, lia-se que alguém - na revista Flama - alvitrara a necessidade de que a «União Nacional» mudasse de nome, para qualquer coisa como «Movimento Nacional Popular» e que passasse a organizar-se em alas - centro, esquerda e direita. O futuro virá dar algum fundamento a uma parte da notícia: a União Nacional virá a redenominar-se «Acção Nacional Popular» no seu congresso, que se realizará um mês depois desta notícia. Quanto à questão da constituição das alas, isso virá a ser toda uma outra história. Porém, e apesar de tanto visionarismo associado ao marcelismo, nos aspectos mais comuns parecem predominar os métodos de antanho: entre a primeira (esq.) e a segunda (dir.) edição do Diário de Lisboa de há cinquenta anos, a questão do nome do partido governamental perde importância para o Grande Prémio TV da Canção portuguesa, que se iria disputar só dali por quatro meses...

27 janeiro 2020

A DESCOBERTA DA ANTÁRCTIDA

27 de Janeiro de 1820. Hoje cumprem-se duzentos anos da data da descoberta oficial do continente antárctico. A autoria foi de uma expedição russa de dois navios, Vostok e Mirnyi, comandados por Fabian von Bellingshausen e Mihail Lazarev. Os registos do feito incluem costumam incluir os dois comandantes, provavelmente para atenuar o impacto de uma proeza russa ter sido encabeçada por alguém com um nome tão ressonantemente germânico - von Bellinghausen (era originário de uma família da nobreza balto-germânica). Mas esse está longe de ser o único indício que a questão do descobrimento da Antárctida tem muito mais a ver com o nacionalismo do que com a geografia. Para os britânicos, o feito russo terá superado o de um compatriota (Edward Bransfield) por uns escassos três dias. Para os americanos foi uma questão de dez meses e o nome do seu herói descobridor é Nathaniel Palmer. A ironia desta disputa é que desde o Século XVI, pelo menos uns 250 anos antes, houvera condições técnicas para que navegadores e exploradores se tivessem aproximado do continente austral, especialmente nesta época do ano (Janeiro), quando ali se está em pleno Verão. Isso não implica assegurar que outros navegadores de outras nacionalidades já lá tivessem estado. Mas implica relativizar a certeza da descoberta. A verdade é que, dadas as condições meteorológicas, a eventual presença de predecessores de Bellinghausen teria sido breve e inconsequente e tão difícil de confirmar quanto de desmentir. Não havia qualquer interesse económico naquela região para superar as enormes dificuldades técnicas do assentamento e ali fixar populações. Por isso, se alguém já tivesse descoberto o continente, também não teria tido qualquer estimulo material em reivindicar essa descoberta. (Sobre a dificuldade e desinteresse em colonizar locais onde se verificam condições meteorológicas tão austeras, veja-se este meu poste sobre as Ilhas Kerguelen).

26 janeiro 2020

A INVASÃO DE CAMPO

26 de Janeiro de 1970. O país informativo era dominado pelos acontecimentos da bola do Domingo precedente. Algo acontecera de inusitado. Disputara-se um derby no estádio da Luz, o Benfica - Belenenses, e o jogo não chegara ao fim. Os relatos do jogo descrevem-no feio, cheio de distribuição de pancada entre os jogadores e um resultado condizente (0-0), mas o que o tornou memorável foi o facto do árbitro se ter atrevido a expulsar primeiro um (aos 35 minutos de jogo) e depois outro jogador benfiquista, aos 43 minutos da primeira parte. Ora essa decisão parece ter violado algumas das regras subentendidas do futebol português, nomeadamente a que postula que as arbitragens dos jogos dos grandes clubes, quando jogam nos seus campos, têm que ser descaradamente caseiras. Por exemplo, um penalti contra o Benfica na Luz tem que ser uma decisão muito amadurecida pelo árbitro; e dois penaltis contra o Benfica num mesmo jogo, só mesmo por conta e risco do juiz da partida. O mesmo princípio se aplica às expulsões. Onde é que já se viu o Benfica estar reduzido a nove jogadores ainda antes do fim da primeira parte e, ainda por cima, com o jogo empatado? As justíssimas indignações dos adeptos benfiquistas concretizaram-se numa invasão de campo com intenções por definir mas que o árbitro (naturalmente) não quis esclarecer no local, tendo fugido a correr para os balneários com o auxílio de alguns jogadores. O jogo ficou suspenso e o árbitro recusou-se terminantemente a reatá-lo, tal o susto e a falta de condições de segurança. E é assim que chegamos à edição dos jornais do dia seguinte (acima), onde a história, que já era conhecida do dia anterior, é recontada mas realçando o aspecto humano do árbitro, João Nogueira de seu nome, que não é nenhum demónio malfazejo contra o Benfica, antes um homem de 46 anos, casado com uma filha, morador em Setúbal e trabalhador na SECIL, além de ter um outro gancho por fora como angariador de seguros. E que apanhara o cagaço da sua vida por causa de um complemento de 750 escudos por jogo que muito jeito lhe faziam num ordenado de 3.600 por mês. Socialmente, no dia seguinte, a atitude era a de condenação dos excessos da plebe, mostrando que são um disparate porque tudo não passa de futebol, que as vítimas das paixões também são, afinal, seres humanos. Quase ninguém se lembra do triste episódio, nem sequer das suas consequências: nessa temporada o Benfica teve o estádio interdito por oito jogos (abaixo). Agora os desafios interessantes: alguém se quer pôr a especular o que aconteceria se este mesmo episódio tivesse ocorrido agora? Haveria um tratamento contemporizador do assunto nos programas televisivos de paineleiros do dia seguinte? E será que o Conselho de Disciplina da FPF teria coragem de sancionar o Benfica tão severamente com oito jogos de interdição?

25 janeiro 2020

O FALSO ALERTA DE UM MÍSSIL BALÍSTICO

25 de Janeiro de 1995. A partir do Centro Espacial de Andøya, ilha do extremo setentrional da Noruega, uma equipa mista de meteorologistas noruegueses e americanos lança um foguete tipo sonda Black Brant para estudar a Aurora Boreal na ocasião mais propícia do Inverno Ártico. Apesar dos protocolos internacionais estabelecidos para estas ocasiões terem sido formalmente cumpridos, notificando previamente os países da vizinhança (Suécia, Finlândia e Rússia) do lançamento, algo terá falhado entre os russos, cujos serviços de rastreamento por radar se viram confrontados com um míssil nos ecrãs que o seu software classificava como podendo ter origem num submarino nuclear norte-americano que estivesse em operação no Oceano Ártico. Declarado o alerta, o presidente Boris Yeltsin viu-se durante uma meia dúzia de minutos perante a famosa mala com os códigos nucleares e confrontado com a decisão de reagir simetricamente ao que parecia configurar uma ameaça de um ataque nuclear dos rivais norte-americanos. Só depois de passados esses poucos mas densíssimos minutos, os técnicos russos puderam confirmar que a trajectória do foguete o afastava de território russo. A história acabou uns escassos 24 minutos depois do lançamento, quando a ogiva do Black Brant se despenhou (como previsto) no mar, ao largo da escassamente povoada ilha norueguesa de Spitsbergen. Do que se sabe até agora, esta foi a ocasião em que, já depois do fim da Guerra Fria, o Mundo mais perto se encontrou de uma potencial guerra nuclear.

UM CONGRESSO DO CDS SOB O SIGNO DA VACA?

O Observador - que, como sabem, é o centro geométrico (e único) do pensamento político da direita portuguesa - foi de uma crueldade desnecessária ao fazer uma síntese da disputa que se trava no CDS, ao produzir um conjunto de notícias onde a coloca, à disputa, sob a égide... de uma vaca. Eu bem sei que por causa da amizade com o ambiente se tornou aceitável a referência, sem qualquer desprimor, aos animais - por exemplo, na China, acabou de começar o ano do rato - mas, que raio, o CDS e uma vaca? Ainda por cima uma vaca leiteira? E então o título mais extenso, com uma redacção que faz um alusão muito pouco disfarçada à letra de uma velha canção espanhola?
Só ficou mesmo a faltar aos jornalistas do Observador rematarem os seus comentários trocistas com o refrão do tolon tolon, tão característico da canção. Não me pareceu apropriada a alusão, que não aproveita a qualquer dos cinco candidatos, nem mesmo ao Chicão que é, entre todos os candidatos, aquele onde se reconhece um maior à vontade com estas coisas do campo e da pecuária, quase uma propensão natural para cabo de um grupo de forcados ribatejano. Vaca por vaca, sugiro eu e também por que a minha sugestão é mais patriótica, vamos pugnar para que o congresso do CDS que agora se inicia se reja sob a égide de uma verdadeira Vaca de Fogo como a dos Madredeus!
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Na porta daquela igreja vai um grande corrupio
Na porta daquela igreja vai um grande corrupio
Nas voltas duma coisa velha reina grande confusão
Nas voltas duma coisa velha reina grande confusão
Os putos já fogem dela deitam o fogo a rebentar
Os putos já fogem dela deitam o fogo a rebentar
Soltaram uma vaca em chamas com um homem a guiar
Soltaram uma vaca em chamas com um homem a guiar

São voltas ai amor são voltas
são as voltas
são as voltas da maralha
Ai são voltas
Ai amor são voltas
são as voltas da canalha
Ai são voltas
Sete voltas
São as voltas da maralha
Ai são voltas
Sete voltas
São as voltas da canalha

À porta daquela igreja vive o ser tradicional
À porta daquela igreja vive o ser tradicional
Às voltas duma coisa velha e não muda a condição
Às voltas duma coisa velha e não muda a condição
À porta daquela igreja vai um grande corrupio
À porta daquela igreja vai um grande corrupio
Às voltas duma coisa velha reina grande confusão
Às voltas duma coisa velha reina grande confusão

São voltas ai amor são voltas
são as voltas
são as voltas da maralha
Ai são voltas
Ai amor são voltas
são as voltas da canalha
Ai são voltas
Sete voltas
São as voltas da maralha
Ai são voltas
Sete voltas
São as voltas da canalha
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24 janeiro 2020

SOBRE O BREXIT...

...até pode ser que corra tudo essencialmente bem para as duas partes, União Europeia e Reino Unido. Ou então bem pode ser que haja algumas coisas a correr pior para uma delas. Ou então que haja muitas coisas que venham a correr mal. Na verdade, fica a sensação que, descontando as famosas casas de apostas britânicas, onde se aposta sobre tudo, ninguém se apresentará em condições - nem quererá correr o risco político - de apresentar garantias firmes quanto ao que se sucederá daqui por uma semana, quando o Reino Unido abandonar a União Europeia. Até ver, ficou assente a imagem do «agora vocês vão-se embora que isto já parece mal, mas nós depois temos que tratar das coisas a sério.» Uma coisa parece certa: como aparece no anúncio acima, estamos todos avisados que o chão está molhado e que, por isso, pode ser muito escorregadio; maldade minha será a de insinuar pela escolha da foto que, de tão molhado, passear por aquele chão é capaz de deixar o transeunte, mais do que tombado, completamente encharcado, e os ex-parceiros europeus (UE e UK) a contas com consequências imprevistas do seu divórcio. Esperemos que não.

A SEMANA DAS BARRICADAS DE ARGEL

24 de Janeiro de 1960. Início da semana das barricadas em Argel. As razões imediatas invocadas são outras, mas o que os manifestantes argelinos de origem europeia (pieds noirs) reclamam é do progressivo afastamento das intenções do governo francês no suporte a uma solução integracionista para a Argélia. A atitude é considerada por eles uma traição, especialmente depois de eles - pieds noirs - terem contribuído de forma muito significativa para o clima de tensão que esteve por detrás da crise de Maio de 1958, que culminou com a chegada do general de Gaulle ao poder e a fundação da V República. A redacção que é dada aos acontecimentos pelos jornais portugueses é inequívoca na sua parcialidade: repare-se nos títulos acima que os manifestantes são qualificados por «ultras» e que o seu chefe - Joseph Ortiz - nem sequer tem direito a ser nomeado ao lado do nome do general Challe, que representa a autoridade. Mais importante, as notícias daquele dia ainda não davam conta dos custos humanos dos combates travados - a tiro - entre os insurrectos e as forças da ordem nas ruas de Argel: 22 mortos, 14 do lado da polícia e 8 do lado dos manifestantes, para além de 147 feridos. A situação permaneceu tensa por mais uma semana, com insurrectos e forças da ordem, acantonados nas suas posições, até à rendição dos primeiros a 1 de Fevereiro e o exílio dos cabecilhas do movimento. Uma ironia final em toda esta história é que o general Maurice Challe, que acima aparece em destaque na representação da ordem legal em Argel, virá a ser, por sua vez, o cabecilha de uma outra insurreição na Argélia, em 22 de Abril de 1961, o chamado Putsch dos Generais.

23 janeiro 2020

TRUMP PASSA POR DAVOS DESAPERCEBIDO

Há dois anos, a presença de Donald Trump na cimeira de Davos na Suíça foi assinalada com o chinfrim mediático que tradicionalmente as deslocações do género dos presidentes dos Estados Unidos desencadeavam. Chegavam, cheios de estadão (imagens acima) diziam coisas (raramente importantes), mas publicavam-se porque haviam sido proferidas por quem fora. Este ano foi preciso ter estado muito atento para ter dado pelo regresso de Trump ao mesmo local, fazer a mesma coisa, onde disse mais coisas (a acrescer ao raramente importantes, estas agora são também raramente verdadeiras), mas num enquadramento mediático global onde prevalecia o desinteresse pelo que dizia e pela sua pessoa. A opinião publicada no país de Trump parece interessada é no folhetim a respeito da sua destituição e esse decorre em Washington; quanto à opinião que se publica no resto do Mundo, está-se cagando para os disparates de Donald J. Trump, enquanto reza para que aqueles que o rodeiam o segurem para que ele não desencadeie uma Terceira Guerra Mundial só por capricho. Como tradicional, a comunicação social portuguesa foi na manada, mas alguns órgãos de comunicação - como foi o caso abaixo da Euronews - tentaram ser criativos e acirrar uma rivalidade mediática Trump/Greta. Suponho que deve ter fracassado porque está tudo farto do Trump... e está tudo farto da Greta.
O exemplo de Davos elucida-nos de como, quando se fecha a torneira, deixa de jorrar água, os assuntos desaparecem do radar informativo, o segredo estará em quem a manipula, à torneira. Mas, em aparte, é da natureza emblemática (e caricata) dos tempos que correm quando um órgão de informação com algumas responsabilidades como o canal Euronews tenta forjar um despique entre o presidente do mais poderoso país do Mundo e uma garota sueca que é famosa por se ter tornado famosa. O sucessor de Trump vai ter uma trabalheira enorme para recuperar o prestígio do cargo!

«WHERE NO MAN HAS GONE BEFORE!» (Só que «DEEP TREK» em vez de «STAR TREK»)

23 de Janeiro de 1960. O batiscafo Trieste, ao serviço da marinha dos Estados Unidos (em primeiro plano, na fotografia acima), realiza um mergulho que o irá levar até ao fundo da depressão Challenger, no Sul da Fossa das Marianas no Oceano Pacífico (assinalada a vermelho no mapa abaixo). É nessa depressão que se situa o ponto mais baixo de toda a superfície terrestre, o fundo marinho dista cerca de 10.900 metros da superfície do mar. O batiscafo, concebido originalmente por uma equipa dirigida pelo explorador suíço Auguste Piccard, fora construído em Itália em 1953 para a exploração das profundidades abissais. Em 1958, fora comprado pela US Navy com esse mesmo fim (mas com outros meios de financiamento da actividade...), o que o tornara no USS Trieste. É assim que o vemos na foto acima, feita no próprio dia da imersão, acompanhado do destroyer USS Lewis, um veterano da Segunda Guerra Mundial a meses de ser retirado de serviço. Este último era um dos vários navios encarregues de acompanhar com o seu sonar a descida do Trieste. A descida demorou quase cinco horas (4h47). A tripulação, de dois homens, era uma justaposição dos primeiros com os actuais proprietários do Trieste: um oficial norte-americano, o tenente Don Walsh e o oceanógrafo Jacques Piccard, filho de Auguste. Os dois homens estiveram apenas 20 minutos no fundo do oceano, a pressão que incidia sobre o veículo era de 1,25 toneladas por cm², as comunicações com o navio de apoio à superfície tinham um desfasamento de 7 segundos. A viagem de retorno, algo mais rápida, demorou, mesmo assim, 3h15. Foi uma proeza, mas correram um risco enorme. Ao passarem os 9 km de profundidade uma das placas exteriores de uma das vigias rachou-se... Comprova a dimensão do risco (e do susto!) o facto de, nos sessenta anos que se seguiram, mais nenhum submarino tripulado tenha repetido a façanha. Todos os que já voltaram àquelas profundidades foram sempre automáticos. Quanto aos Piccard e à reputação da ousadia das suas explorações, o seu apelido perpetua-se na personagem do capitão Jean-Luc Picard, da saga de Star Trek.

22 janeiro 2020

SUSAN SARANDON

As fotografias são, a começar do canto superior esquerdo e no sentido do movimento dos ponteiros de um relógio: de autor desconhecido, tomada em 1963 quando a actriz tinha ainda 17 anos, Milton H. Greene, Annie Leibovitz, Milton H. Greene, Gary Heery e Timothy White.

21 janeiro 2020

A MORTE DE GEORGE ORWELL

21 de Janeiro de 1950. Morte do escritor britânico Eric Blair, que era - e que continuaria a ser - muito mais conhecido pelo seu pseudónimo de George Orwell. Morria de tuberculose quando ainda não completara 47 anos e já publicara duas obras que, ainda nos dias que correm, se contam entre os verdadeiros clássicos: Mil Novecentos e Oitenta e Quatro e A Quinta dos Animais. Mais do que as circunstâncias em que foram publicadas, qualquer das duas obras continuou a exibir a sua qualidade mesmo depois do colapso do comunismo, de que ambas eram uma magistral denúncia. Costuma ser um dos lugares comuns dos elogios fúnebres, a referência à magnitude da perda pelo falecimento. No caso concreto de Orwell, e ainda com 46 anos, é por demais evidente o quanto isso seria verdade, seriam de esperar dele mais uns vinte anos de uma produção intelectual de qualidade. E no entanto, quem lhe conheça o resto da obra sabe que as suas obras mais conhecidas formam, com as outras (como a que aparece abaixo), um todo bastante complexo e que intriga muitos dos poucos que a conhecem extensamente. As obras e reflexões políticas que ele, hipoteticamente, poderia vir a produzir no futuro, não tivesse morrido, são verdadeiramente um mistério, mas isso também será, para mim, uma indicação do génio da pessoa.

20 janeiro 2020

ABERTURA DA MESA REDONDA BELGO-CONGOLESA EM BRUXELAS

20 de Janeiro de 1960. Têm lugar em Bruxelas as cerimónias de abertura de uma conferência negocial entre as autoridades coloniais belgas e as diversas formações políticas representantes dos congoleses, que os primeiros designaram por Table Ronde (Mesa Redonda). O discurso de abertura de Gaston Eyskens, o primeiro-ministro belga parece ser cristalino quanto às intenções belgas. «A mesa redonda tem por fim pôr em presença congoleses, entre eles, por um lado, e congoleses e belgas por outro. Deverão encontrar em conjunto, sendo esse o objectivo da conferência, os meios de virem a organizar o exercício do poder. Esta obra inspirar-se-á não só nos princípios democráticos e nas aspirações profundas das populações africanas, mas ainda nas exigências do interesse geral do Congo. O governo não deseja propor-vos uma agenda rígida preparada de antemão, pois caberá à conferência assentar nas suas próprias modalidades processuais mas é essencialmente em problemas políticos que se centrará a actividade desta reunião, empenhando-se mais precisamente em definir as modalidades concretas da aplicação das primeiras estruturas nacionais do Congo.» Antecipadamente, os belgas haviam acautelado uma composição o mais heterogénea possível para a delegação congolesa, formada por 44 membros mas representando 14 formações políticas diferentes para além dos chefes tradicionais que também foram convidados para estarem presentes. Todas estas precauções dos belgas para um calendário negocial que fosse conduzido a um ritmo pausado de nada serviram. Do outro lado os nacionalistas congoleses queriam a independência o mais depressa possível, e entre os belgas não havia força anímica para se baterem, política e mesmo militarmente no terreno, por uma transição mais regrada. O Congo tornou-se independente a 30 de Junho de 1960, uns escassos cinco meses depois desta Table Ronde. O discurso de Eyskens fora atropelado pela História. Num momento não desprovido de um significado maior do que o próprio acto, durante a cerimónia da independência, um dos membros da assistência tentou roubar a espada do rei dos belgas à frente de toda a gente(!), histórias pequenas que comprovam que as crónicas da descolonização foram quase sempre embaraçosas, que não se trata de um exclusivo português.

CIDADÃO CLEM

As biografias parecem ser um género literário que medra, mas a popularidade dos livros do género dependerão da popularidade do biografado: ainda neste Natal, alguém, numa rede social, pedia a opinião a quem considerava entendido, sobre se a leitura de uma segunda biografia sobre Winston Churchill acabada de publicar se justificaria para quem já havia lido uma outra sobre o mesmo Churchill, que fora editada há apenas cinco anos. A resposta lá veio, redonda e inconclusiva, como seria de esperar: «A do Gilbert é magnífica, mas vale a pena ler esta também». Mas, se conto este episódio, é para realçar o quanto parece haver predestinados para serem tópico de biografia e haver sobre eles biografias muitas, talvez demasiadas (como será o caso de Churchill, mas também Lenine, Estaline, Trotsky,...), e como haverá outras figuras históricas que estarão vocacionadas para a sombra, de que exemplo excelente para contrapor a Churchill, é Clement Attlee (1883-1967), o seu segundo durante o governo de coligação de guerra de 1940 a 1945 e depois primeiro-ministro do Reino Unido de 1945 a 1951. A biografia acima é muito interessante, para mais quando se conhece de antemão a exuberância de Winston Churchill, de que Clement Attlee é um quase perfeito contraponto - mas apenas para aqueles que, menos sensíveis à promoção e à superficialidade, conseguem ver para além das aparências. Clement Attlee parece ser uma demonstração de que uma carreira política é feita não apenas do homem - no caso, sem carisma - mas também, nas imorredouras palavras de Ortega y Gasset, da sua circunstância. Attlee não seria o mais ofuscante dos dirigentes trabalhistas para assumir a liderança do partido trabalhista em 1935, mas seria o mais fiável e foi assim que foi escolhido; ninguém daria grande coisa pela sua liderança mas lá se aguentou; a partir de 1940 e no governo de coligação nacional, Attlee nunca se compararia em brilhantismo a Churchill mas, quando terminou a Segunda Guerra Mundial, nas eleições que tiveram lugar em Julho de 1945, os britânicos preferiram a sobriedade e confiança que ele transmitia à atitude do seu rival - um momento que é sempre difícil de contornar explicativamente em todas as biografias de Churchill que tive oportunidade de ler. E a actuação do governo trabalhista do Reino Unido nos anos imediatamente a seguir à guerra são uma experiência que poucos conhecem e sobre a qual, mesmo os simpatizantes da esquerda da Europa continental, por desconhecimento, não sabem muito bem o que dizer. Este livro bem poderia ser traduzido para português em vez das incontáveis biografias de figuras históricas mais à moda, mesmo (ou especialmente) quando há queixas disparatadas de que aquelas que existem ainda não chegam...

19 janeiro 2020

A MORTE DE SIR BERNARD WOOLLEY

Constato que há imenso por fazer no domínio da inteligência artificial quando aplicada à área da informação. O meu telemóvel, que se farta de me dar notícias para as quais me estou positivamente cagando, esqueceu-se de me dizer que morrera, aos 82 anos, Derek Fowlds aka Sir Bernard Wooley, o secretário do ministro dos assuntos administrativos, Jim Hacker, na série Yes Minister. O actor teve uma carreira preenchida, desempenhou outros papéis, mas, em termos de popularidade internacional, Derek Fowlds era Bernard Woolley, o último sobrevivente do trio nuclear de personagens da famosa série que é também um interessante estudo sobre ciência política e a arte de governar. Nos (inesquecíveis) diálogos, Bernard representava a terceira perspectiva de um mesmo assunto, entre a política e a burocrática dos seus dois superiores hierárquicos. A maioria das vezes era a perspectiva apaziguadora, discreta e de bom senso, mas também podia ser irritantemente irrelevante ou mesmo irreverente - como nesta famosa passagem abaixo, sobre o perfil típico do leitor de cada um dos grandes jornais ingleses, em que tinha que ser Bernard a rematá-la com o comentário de que o leitor típico do Sun (jornal tablóide) não tem interesse algum em saber quem governa o país desde que tenha umas grandes mamas (um conteúdo tradicional da sua terceira página).

Um apontamento final com alguma dose de ironia. Os textos de Yes Minister foram redigidos a partir de 1981 acompanhados da ficção que se tratava de um estudo académico redigido algures no futuro, com o contributo de Sir Bernard Woolley, o único dos três intervenientes que ainda estava vivo. Do livro consta um ante-texto ficcionado com os agradecimentos da praxe, que aparece datado como sendo de Setembro de 2019. Acabou por vir a conferir...

O JANTAR DE DESPEDIDA AO CAPITÃO SPÍNOLA

19 de Janeiro de 1945. Na página social do Diário de Lisboa uma pequena notícia dá conta de que a revista de Cavalaria está a promover um jantar de despedida para o capitão António Sebastião Spínola. Ora o exército português contaria com muitas centenas de capitães e, certamente, haveria muitas dezenas desses oficiais a despedirem-se das unidades onde estavam colocados sem que os eventuais gestos de simpatia na hora da partida merecessem tanto destaque da imprensa. Para além disso, fiquem a saber os leitores deste blogue menos conhecedores das modas daquela época que o local escolhido para a realização do referido jantar dava logo indicação de uma importância superior do evento: a Pastelaria Marques situava-se no Chiado e o que ela significava socialmente pode ser consultado neste outro blogue. Coisa mesmo fina, mesmo em tempo de guerra e de racionamentos. Que factores se conjugam para que um recém promovido capitão de cavalaria (Spínola fora promovido àquele posto há menos de um ano, em Março de 1944) seja objecto de um jantar de despedida num local tão selecto é, para mim, especialmente a esta distância de 75 anos, um mistério. Do que não me parece restarem dúvidas é que o futuro governador-geral da Guiné (1968-73) e futuro presidente da República (1974) sempre soube promover muito bem a sua pessoa.

UMA AMÉRICA ISOLADA DO RESTO DO MUNDO

Franklin, Georgia, Estados Unidos, 1941. Nesta povoação remota do interior de um estado sulista, vê-se toda a descontracção de uma freguesia de loja (não por acaso, toda branca!...) que contempla o esforço de um deles à volta de uma mesa de bilhar, completamente alheios a um Mundo então em guerra. O instinto isolacionista que elegeu Donald Trump sempre existiu, latente, na América. O que este do século XXI tem de novo, é que, queixando-se, acreditam que podem beneficiar mundialmente somente pelo facto de serem, sem que os outros tenham nada a ganhar com isso. Ora o mundo lá fora não é só bilhar.    

18 janeiro 2020

O ANTI-RACISMO, UMA CAUSA «MODERNA» DA ESQUERDA «MODERNA» DESDE HÁ TRINTA ANOS

18 de Janeiro de 1990. Nas últimas eleições legislativas, que se haviam realizado dois anos e meio antes, em Julho de 1987, o Partido Socialista Revolucionário (PSR) recebera uns míseros 33 000 votos, sem qualquer representação parlamentar (obviamente). Nada distinguiria esta formação da miríade de outros pequenos partidos em iguais condições (MDP, PDC, PPM, MRPP), a não ser o facto de ter um dirigente bem quisto - e ser, por isso, uma organização bem querida - entre a classe jornalística, então dominada por um pensar bem de esquerda (hoje, trinta anos passados, estamos no ciclo oposto, predomina um certo pensar bem de direita). Esses flirts intensos do colectivo de jornalistas por uma formação política irrisória têm tanto de súbito quanto de inexplicável e só têm tendência para morrer quando, nas urnas, o eleitorado deixa os jornalistas a falarem sozinhos (já aqui publiquei no Herdeiro de Aécio o exemplo caricato do Diário de Lisboa a promover a UEDS em finais de 1979). Mas, mutatis mudandis, naquele jornal parecia evidente que não se aprendera grande coisa: dez anos transcorridos e uma nova coqueluche da esquerda bem pensante era apresentada na última página do jornal com o destaque que a imagem acima documenta: Francisco Louçã. Três meses antes, um dos militantes do PSR fora assassinado com uma facada numa refrega contra um gangue de neonazis, à porta da sede do partido. O acontecimento gerou uma onda de repulsa e um capital de simpatia generalizado, tendências que a imprensa explorou e que ali acima vemos a serem aproveitadas (naturalmente) por Louçã nos espaços mediáticos que lhe concederam. O que é menos imediato é que, por causa de uma refrega violenta entre a extrema esquerda e a extrema direita, o assunto tenha sido redireccionado para o racismo. Relembre-se que, nos tempos do PREC, houvera imensas refregas do mesmo género entre formações políticas; numa delas, em Outubro de 1975, entre o MRPP e a UDP, por sinal duas organizações maoistas de extrema esquerda, morrera mesmo um militante da primeira das organizações, um episódio praticamente esquecido, sem aproveitamento político ulterior para outras causas a combater, como a violência política, a pobreza... ou o racismo.

O militante do PSR que fora assassinado era caucasiano, nada nos relatos do assassinato associava a questão racial como tendo estado associada à refrega, a não ser o facto de esse - o racismo - ser o aspecto antipático das organizações de cabeças rapadas que haviam perpetrado o crime estarem tradicional e desagradavelmente conotadas com o racismo. O tema do racismo surgirá assim, na circunstância, como uma excelente arma de arremesso político e um dos aspectos engraçados da entrevista acima é que a citação que foi escolhida para se tornar no título - «temos que ser todos africanos contra os racistas» - ainda hoje permanece tão imaginativa e moderna (...e inócua) que bem poderia ser apropriadamente reciclada para uma entrevista num jornal de 2020. O racismo, como a pobreza, a miséria e tantas outras chagas sociais, combate-se, mas nunca se chega a erradicar. E apresentava-se como um combate bonito, uma das potenciais novas causas da esquerda, algo que poderia substituir as tradições marxistas-leninistas numa época (1990) em que as notícias de todos os dias mostravam a Revolução e as revoluções a desagregarem-se em quase todos os paraísos socialistas. Há o mérito de Francisco Louçã em ter inflectido o discurso político numa altura em que era necessário mas também vejo ali mérito do jornalista no formato como estrutura a entrevista para que o entrevistado brilhe a passar a sua mensagem adaptada aos novos tempos: são dez perguntas, mas aquela onde se pergunta como fazer a revolução (o que é muito pertinente quando colocada ao dirigente de um partido socialista revolucionário!...) é a sétima pergunta, e as três últimas perguntas já são todas a respeito do racismo. (Ironicamente, e enquanto escrevo isto, a deputada Joacine Katar Moreira do Livre está a fazer uma extensíssima intervenção que, creio, que se pode sintetizar em: «está fora de questão» (ela) renunciar ao mandato de deputada)

PROCESSO SOCIALISTA SOVIÉTICO PARA TORNAR OS CABELOS ENCARACOLADOS

Cidade de Bratsk, Sibéria, União Soviética, 1967. Uma camarada submete-se a um tratamento de beleza, encaracolando os cabelos com a ajuda de um aparelhómetro indistinguível, de onde sobressai sobretudo o aspecto arcaico. A expressão e o glamour expresso pela cliente desse cabeleireiro de uma das remotas cidades da Sibéria, dir-nos-á muito mais sobre o carácter científico dos tais métodos socialistas soviéticos para alcançar futuramente a sociedade sem classes do que a colecção de seis compêndios com as obras escolhidas de Lenine.

17 janeiro 2020

APRESENTAR CUMPRIMENTOS DE DESPEDIDA

Domingo, 17 de Janeiro de 1960, por volta das 10 da manhã. Nas instalações da placa do aeroporto da Portela podia assistir-se à magnificente cerimónia da apresentação de cumprimentos de despedida, com guarda de honra, fanfarra e tudo o resto, ao ministro da Defesa da Alemanha Federal, Franz Josef Strauss (ao centro). O ministro alemão estava a terminar uma visita de sete dias a Portugal, e a importância que o governo português dedicara à sua visita podia ser avaliado pela qualidade das presenças que se haviam disposto a comparecer na cerimónia, mesmo a um Domingo de amanhã. Para além do seu homólogo Júlio Botelho Moniz (ao lado de Strauss, de chapéu e sobretudo), a lista de presenças era vasta, conforme era descrita muito exaustivamente os jornais: almirante Quintanilha Mendonça Dias, ministro da Marinha, almirante Vasco Lopes Alves, ministro do Ultramar, coronel Almeida Fernandes, ministro do Exército, embaixador Marcello Mathias, ministro dos Negócios Estrangeiros, todos acompanhados naturalmente, assim como Botelho Moniz, pelas esposas; coronel Costa Gomes, subsecretário do Exército, tenente-coronel Kaulza de Arriaga, subsecretário da Aeronáutica (e esposa), general Beleza Ferraz, chefe de Estado-Maior das Forças Armadas, almirante Guerreiro de Brito e generais Luís da Câmara Pina e Costa Macedo, chefes de Estado-Maior respectivamente da Armada, do Exército e da Força Aérea; brigadeiro Albuquerque de Freitas, comandante da 1ª Região Aérea, general Humberto Pais e comodoro Armando Reboredo, respectivamente subchefes do Estado Maior das Forças Aéreas e Naval,  generais Matos Maia, Veríssimo e Lopes Pires, subchefes do Estado Maior do Exército, almirante Sousa Uva, secretário-adjunto da Defesa Nacional, almirante Nuno de Brinon, comandante naval do Continente, general Luís Domingues, governador militar de Lisboa, brigadeiro Barbieri Cardoso, 2º comandante do Governo Militar de Lisboa, António Champalimaud, presidente da Siderurgia Nacional, coronéis Alves de Sousa e Silva Ferreira, directores, respectivamente, das Fábricas de Material de Guerra de Braço de Prata e de Munições para Armas Ligeiras, coronéis Santos Paiva, oficial às ordens, e Viana de Lemos, ajudante de campo do ministro alemão, e ainda o comandante Carlos Beja, director do aeroporto. Era assim, com esta pompa, que os embarques (e desembarques) de entidades oficiais se passavam há sessenta anos, mas a composição reforçada do elenco mostra que o governo português tinha um particular interesse nesta visita de Strauss e no estabelecimento de acordos com os alemães, não apenas para a aquisição de material militar actual, mas, sobretudo, para a modernização das indústrias portuguesas de armamento - daí a explicação para a presença inopinada do civil António Champalimaud, enquanto presidente da Siderurgia (produtora de aço!), no meio de todas aquelas patentes militares. A produção nacional da espingarda automática G-3 terá saído um dos acordos firmados por ocasião desta visita.

16 janeiro 2020

O PRIMEIRO DIA DE TRABALHO DO PRIMEIRO GOVERNO VERDADEIRAMENTE DE MARCELLO

Ainda 16 de Janeiro de 1970. Só quinze meses depois da sucessão a Salazar, é que Marcello Caetano conseguirá formar um governo seu, que não resultasse dos equilíbrios de circunstância, substituindo antigos rivais de pastas de relevo (nomeadamente Franco Nogueira nos Negócios Estrangeiros) e trazendo os seus homens de confiança para junto de si (será o caso de Baltazar Rebelo de Sousa para a pasta das Corporações). Sinal de que este último, enquanto governador-geral de Moçambique, adquirira um staff verdadeiramente especializado em lidar com a imprensa e que era muito mais eficaz do que o que acompanhava os seus colegas de governo e mesmo o presidente do Conselho, é que é a sua cerimónia de cumprimentos no ministério que domina as páginas centrais da edição do Diário de Lisboa daquele dia. É muito desvelo para 45 minutos de apertos de mão mais algumas palavras de circunstância que não se devem ter distinguido das cerimónias quase simultâneas em tantos outros ministérios. Por aqui se constata como filho de peixe - o Marcelo, este - sabe nadar. Em contraste, o chefe de governo - o Marcello, o outro - aproveita a ocasião para conceder uma entrevista ao jornal francês Le Figaro, onde passa um recado ideológico verdadeiramente relevante para quem queira descortinar quais serão as suas intenções políticas: «Não podemos juntar-nos completamente à Europa». Mas, tanta seria, comparativamente, a falta de jeito do staff de Marcello para a imprensa, que, nessa mesma página, esse aspecto crucial do nosso posicionamento estratégico acabou chutado para um canto, quase misturado com o anúncio de uma descoberta científica («depois de milhares de experiências»): o superalimento vitaminado Dynavit, comercializado pela diese, de que uns poucos gramas haviam recuperado um pombo quase moribundo, com direito a fotografia (do pombo, não de Marcello).

A ESTREIA NACIONAL DE «THE GRADUATE»

16 de Janeiro de 1970. No cinema São Jorge estreia um «filme sensacional», The Graduate, que recebera o «Óscar para o melhor realizador»... dois anos antes. «Uma pedrada no charco da hipocrisia!» Mas atentemos antes na peculiaridade de como o filme era promovido, uma promoção grandiosa, toda uma página do jornal, ao mesmo tempo que a famosa perna escultural, que se tornou a imagem de marca do filme*, aparece desenhada (quiçá consequência da censura...), mas desenhada num estilo pin-up, o que acaba por distorcer o conteúdo essencial do filme, iludindo, com alguma probabilidade, o potencial espectador interessado.

* Perna escultural essa que, soube-se muitos anos depois, não pertencia à actriz Anne Bancroft mas antes a Linda Gray, que se tornou depois muito conhecida pelo seu papel em no folhetim televisivo Dallas.

15 janeiro 2020

O GOVERNO DOS CINCO MINUTOS

15 de Janeiro de 1920. Naquele que deve ser um dos episódios politicamente mais caricatos da Primeira República, o ministério encabeçado por Francisco Fernandes Costa (é dele a cara da cabeça meteórica do cartoon acima) nem chega a tomar posse. Segundo as crónicas, uma manifestação de activistas conotados com o Partido Democrático (oposição) juntou-se no Terreiro do Paço, onde o elenco do proto-governo se reunira previamente antes da cerimónia de posse, e invadiu o edifício numa demonstração de força. A GNR, que estava encarregue de restabelecer a ordem, mas sob as ordens de oficiais com simpatias para com os manifestantes, demitiu-se completamente de o fazer. Assim, quando o presidente do futuro ministério finalmente se conseguiu deslocar ao palácio de Belém, onde o presidente da República o aguardava para a cerimónia de posse, foi para apresentar a demissão do governo que nem o chegara a ser.

14 janeiro 2020

A CRISE DO AQUECIMENTO GLOBAL

Quando se desejaria que fossem os castelhanos a aprender com os ingleses, os factos parecem demonstrar que o que está a acontecer é precisamente o contrário: são os ingleses que mostram querer lidar com os escoceses como os castelhanos o fazem com os catalães. O «aquecimento» a que me refiro em título não é o climático, é o político, desta deriva política progressiva das práticas democráticas em direcção às autocráticas, mesmo (sobretudo) na Europa.

A EPIFANIA TARDIA DE JOÃO MIGUEL TAVARES

A epifania aparece descrita na wikipedia como «um sentimento que expressa uma súbita sensação de entendimento ou compreensão da essência de algo». E é isso mesmo que parece ter acontecido a João Miguel Tavares depois da primeira volta das eleições internas do PSD. A vários concorrentes seus no ramo do opinismo político, os resultados apurados no fim de semana que findou deram-lhes imensos problemas de digestão, especialmente na Rádio Pepsamar. Todos parecem ter sido atingidos com uma mesma certeza prática que até deixará a ideia que bem se poderia dispensar a disputa da segunda volta do acto eleitoral. Montenegro já foi. No que concerne ao nosso opinador do Público, o único senão do valor da sua opinião será o facto da sua epifania ter surgido talvez um pouco tardiamente. Atrasada não apenas em relação a outra epifania do calendário religioso, a de Jesus Cristo, que se celebra a 6 de Janeiro e cuja data entre nós é mais conhecida por Dia de Reis, mas sobretudo porque a epifania de descobrir que Rui Rio é o melhor líder para o PSD (sic) só terá acometido João Miguel Tavares depois do escrutínio dos votos do serão de Sábado. Ele até pode dispor-se a explicar-nos muito bem porquê (o Rui Rio) mas a explicação já vem um bocadinho atrasada e, sobretudo, parece-me ser precisamente a mesma atitude que marcou o anedotário da cultura portuguesa quando se celebrizou por ser atribuída ao ex-jogador João Pinto e aos seus famosos «prognósticos, só no fim do jogo».

CONSTATANDO ESTA E EVOCANDO OUTRAS ONDAS DE FRIO

Para quem se esteja a queixar desta actual onda de frio, aproveita-se a oportunidade para informar que, há precisamente 75 anos, nevava abundantemente em quase todo o país... Como se podia ler na edição daquele dia do Diário de Lisboa, até no extremo sul de Portugal continental, a temperatura havia descido até aos 6º negativos em Vila Real de Santo António! Num registo mais sofisticado e com direito a destaque de primeira página, perto de Lisboa, na serra de Monsanto, «coberta de neve em toda a sua extensão», e para além de alguns bonecos de neve que ilustravam a notícia, apareceram logo pela manhã - era Domingo - uns «desportistas munidos de skis»! Ele há sempre malta para se exibir.

13 janeiro 2020

RÁDIO OBSERVADOR - RÁDIO PEPSAMAR

Ontem, porque seria Domingo e a noite anterior fora um tal desapontamento que ainda estariam com dificuldades em engolir a crueldade dos resultados das eleições internas do PSD, parece que foi só hoje, retomada a rotina laboral, que as opções que nos sugerem para que ouçamos a Rádio Observador se tornaram de uma tal acidez que não se tornaria despropositado o patrocínio radiofónico de um anti-ácido como o Pepsamar. Apetece apelar para que esperem pelo próximo Sábado e pelos resultados definitivos da contenda entre Rio e Montenegro, para nos exibirem o contentamento ou a azia que o desfecho lhes poderá suscitar. Ou será que a organizaçãolargou Montenegro e vai tentar encabeçar a direita política de outra maneira?... Tão espanhol é o albergue de pessoas que vemos por aquelas paragens (a quem não faria mal mastigar um comprimidito), que em cabeçalhos como o de baixo não se percebe se se trata também e ainda de azia, ou já de wishfull thinking.

SÓ PARA OS BONS ENTENDEDORES

Há noventa anos uma parte significativa do jornalismo era produzido tomando em consideração dois níveis diferentes de leitores: os entendidos e os outros. Tomemos o exemplo da notícia em destaque acima, na edição do Diário de Lisboa de 13 de Janeiro de 1930, que remete para «um mistério que se desvendara, envolvendo a morte da bailarina Gaby Deslys». O cerne da questão, que eventualmente justificaria a publicação da notícia era Gaby Deslys (1881-1920). Gaby Deslys morrera cerca de dez anos antes desta notícia e não era propriamente (apenas) uma bailarina como a notícia a designa. As entradas na wikipedia dão-na como actriz, cantora e também uma corista de nacionalidade francesa. Como tantas outras suas colegas daquele tempo, a carreira de Gaby Deslys fora promovida simultaneamente não só pelos seus talentos, como também pela notoriedade dos seus amantes conhecidos. Ora o mais famoso dos amantes de Gaby Deslys - e é aqui que se explica o eventual interesse dos leitores portugueses pelos mistérios associados à sua herança - fora o ex-rei de Portugal, D. Manuel II (1889-1932). Fora um problema político explorado pela oposição republicana quando durara (por volta de 1910), mas nada sobre o assunto aparece referido na notícia. Admite-se que, porque o antigo soberano fosse vivo, houvesse o cuidado de não referir esse facto. Ou então essas coisas não apareciam nos jornais. Ou então, ainda, poderão ter sido os cuidados da censura. O que interessa compreender é que, sem essa informação, que teria que lhe chegar por outras vias (extra-jornal), o leitor jamais perceberia qual o remoto interesse desta notícia - que é que lhe interessaria as vicissitudes da herança de uma obscura actriz francesa que morrera há dez anos?...

12 janeiro 2020

REFLEXÃO A PRETEXTO DAQUELES QUE SÓ SABEM APRECIAR OS RÓTULOS DAS GARRAFAS

Há já uma boa dúzia de anos eu tinha um convidado regular cá de casa que bebia whisky a um ritmo que vários factores desaconselhariam: a moderação, a contenção, a educação. A cada incursão, muito mais de metade da garrafa de serviço vinha abaixo, transformada numa exuberante boa disposição de fala arrastada por parte do conviva à saída. Mas não havia maneira de o sensibilizar. Não havendo nada que se pudesse fazer para cercear a regularidade das suas visitas e não se podendo fazer mais nada em relação aos outros incómodos, tive, ao menos, que tomar medidas para reduzir os encargos com o special guest star. Sendo o visado pessoa cuidadosa na avaliação da reputação dos rótulos dos whiskys, foi seleccionada uma garrafa de uma dessas marcas reputadas, que teve a particularidade de, por muitas visitas, jamais se esvaziar, já que depois era regularmente reabastecida com whiskys de mais baixa proveniência. Mas o importante é que o destinatário de tal garrafa cativa parecia não dar pela diferença, lembro-me até de que os elogios à qualidade da bebida que eu servia continuaram a fluir. O importante é que eu, o anfitrião, continuava a deixar o meu convidado feliz, embora a um custo mais em conta. Anos depois, e em conversa com um outro amigo, ele confessou-me que fizera precisamente o mesmo com uns primos, que o que sabiam apreciar no whisky era o rótulo da garrafa. Tal seria a incapacidade de apreciar a bebida independentemente da apresentação da garrafa que a esse amigo devo uma frase assassina a respeito deste assunto: - Eles (dizia ele, referindo-se aos primos) até podiam depois cegar, mas do whisky é que não fora, de certeza: se o rótulo era de uma marca prestigiada!...Nestes fenómenos sociais, as caricaturas tendem a repetir-se mudando as circunstâncias. No caso, nota-se, nas redes sociais, uma tendência muito difundida para que as opiniões sejam valorizadas tomando em consideração a identidade do autor (ou seja, o rótulo da garrafa) em vez da avaliação incidir, caso a caso, conforme a valia da opinião que é emitida (ou seja, o whisky). Ainda muito recentemente, e a propósito do equilíbrio ideológico e da valia das opiniões emitidas pelo jornalista José Gomes Ferreira da SIC, a apresentação do exemplo flagrante da sua opinião de que o BES era um banco sólido, dada a um mês do seu colapso(Junho de 2014!), não chegou para convencer o meu interlocutor que talvez não estivéssemos na presença do mais presciente dos jornalistas. Como o meu convidado de outrora, também este meu interlocutor recente se regerá (intelectualmente) pela lei de que um whisky que venha de uma garrafa com um rótulo que lhe tenham dito que era bom, é equivalente a considerar que se trata de um whisky que não provoca má ressaca. Mesmo que o próprio esteja a padecer da ressaca...
Para eles, há os opinadores que escrevem aquilo que se gosta de ouvir e com os quais se concorda a 100% e há os outros, que são os nossos alvos de estimação e com os quais nunca se concorda. Todos somos humanos e temos dias melhores e piores, mas também todos padecemos em algum grau dessa pecha do primarismo de avaliarmos os conteúdos pelos embrulhos e é para me penitenciar do pecadilho que hoje venho destacar pela positiva uma das apreciações de um dos meus alvos de estimação, Vasco Pulido Valente, que na coluna de opinião semanal do Público, foi o único que li a chamar a atenção - e, a meu ver, muito bem - para a ligeireza como na América se contemporiza com as execuções extra-judiciais (acima). É que a execução extra-judicial de Ossama bin Laden há nove anos permanece um assunto incómodo, com o qual os Estados Unidos não lidam, enterrando o assunto e evitando regressar (muito menos responder) às perguntas ainda em aberto. Contudo, a execução de Qassem Suleimani, porque se trata de um alto funcionário iraniano, é um gesto substancialmente mais grave e que, como Vasco Pulido Valente regista, foi arrumado mediaticamente nos Estados Unidos (e quase por arrasto, no resto do mundo) com a simplicidade maniqueista de um enredo de uma história do faroeste. Suleimani era um índio e não houve ninguém que se pronunciasse pelo direito aos índios, mesmo maus, a terem um julgamento prévio. (Ninguém será ingénuo para admitir que esta mesma lógica se aplique aos cowboys; se, por exemplo e oportunamente, os iranianos montarem uma operação para liquidarem Gina Haspel, a directora da CIA, que terá responsabilidades tão sórdidas na condução de operações clandestinas quanto as de Suleimani, a reacção seria diametralmente oposta.) Mas, e porque o assunto é mesmo sobre a apreciação ao conteúdo e aos rótulos das garrafas de whisky, não gostaria de o terminar sem dar um exemplo oposto ao de um bom whisky numa garrafa de proveniência duvidosa, com Vasco Pulido Valente a produzir opiniões atendíveis. E esse exemplo bem pode ser o artigo de hoje de Vicente Jorge Silva no mesmo Público sobre a aprovação do orçamento. Normalmente gosto do que ele escreve mas hoje, se não lhe tinha batido a inspiração, não tinha escrito nada. Se o Vasco falou de algo que ninguém teria falado, o Vicente falou de algo que todos já tinham falado.