28 de Janeiro de 1970. O país que acompanha a situação política é surpreendido com a notícia que na Assembleia Nacional haviam sido apresentadas duas listas para a composição da Comissão do Ultramar. Indo ao detalhe, só os iniciados compreenderiam a subtileza do que estava em causa, já que as listas concorrentes eram quase idênticas a não ser pela substituição na segunda (B) dos nomes de alguns ultras do regime (Henrique Tenreiro ou Fernando Sá Viana Rebelo, irmão do ministro da Defesa Nacional e do Exército) por deputados recentemente eleitos, conotados com o reformismo, e que formavam aquilo que se veio a designar por ala liberal (é o caso de José Pedro Pinto Leite). Mas o verdadeiro inusitado da situação, que acima aparece destacado, é que aquela constituiria a primeira vez, em mais de trinta anos de trabalhos da Assembleia do Estado Novo, que apareciam duas listas para a constituição de um mesmo órgão! Erigira-se um regime à volta do aforismo Tudo pela Nação, nada contra a Nação, escolhera-se o nome de União Nacional para a organização que o corporizava, organização essa aliás ao abrigo da qual todos aqueles deputados haviam sido eleitos três meses antes e agora acontecia isto?! Que é feito da União?
Algumas páginas mais adiante e, muito oportunamente, naquele mesmo jornal, lia-se que alguém - na revista Flama - alvitrara a necessidade de que a «União Nacional» mudasse de nome, para qualquer coisa como «Movimento Nacional Popular» e que passasse a organizar-se em alas - centro, esquerda e direita. O futuro virá dar algum fundamento a uma parte da notícia: a União Nacional virá a redenominar-se «Acção Nacional Popular» no seu congresso, que se realizará um mês depois desta notícia. Quanto à questão da constituição das alas, isso virá a ser toda uma outra história. Porém, e apesar de tanto visionarismo associado ao marcelismo, nos aspectos mais comuns parecem predominar os métodos de antanho: entre a primeira (esq.) e a segunda (dir.) edição do Diário de Lisboa de há cinquenta anos, a questão do nome do partido governamental perde importância para o Grande Prémio TV da Canção portuguesa, que se iria disputar só dali por quatro meses...
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