6 de Dezembro de 1950. Através das evocações do que aconteceu há setenta anos, já aqui tenho dado conta de alguns dos problemas militares em que a França estava envolvida nas suas possessões da Indochina. A questão, obviamente, tinha um fundo político: a França estava apostada em prolongar a sua presença como potência colonial na Ásia, ao invés do que fizera o Reino Unido a partir de 1947, quando abandonara a Índia e o Paquistão, ou do que fizeram os Países Baixos a partir de 1949 com a Indonésia. Esta nomeação do general Jean de Lattre de Tassigny é uma daquelas nomeações de estadão, para causar efeito na assistência, de que só os franceses dominam a arte e guardam o segredo. Aliás, não é em vão que o capítulo desta sua biografia acima que narra a nomeação, começa por se perguntar quem é que o escolheu para o(s) cargo(s). Uma coisa é certa: quem não foi foi François Mitterrand, que em 1950 ainda militava numa organização de esquerda liberal e que fazia parte do próprio governo de René Pleven com o cargo de ministro do Ultramar (o governo que escolheu de Lattre...) e que na passagem assinalada acima no livro lemos a intrigar com o general, persuadindo-o a não aceitar o convite que o governo de que ele próprio, Mitterrand, fazia parte lhe endereçara... Mas, agora em benefício dos leigos a respeito da história francesa da IV República: quem era de Lattre, qual era a sua importância? Tentando sintetizar as 825 páginas dessa biografia, publicada originalmente em 1998, o general Jean de Lattre de Tassigny foi o militar escolhido para representar a França nas cerimónias da rendição da Alemanha, em Berlim em Maio de 1945, ao lado de Jukov, Eisenhower e Montgomery (abaixo). De Lattre representava a mediana possível entre uma França dividida entre as Resistências (a gaullista desde 1940 e a comunista desde 1941) e a grande massa do povo francês que se mantivera em cima do muro enquanto durara a ocupação, até ao Verão/Outono de 1944.
No seu percurso militar durante a Segunda Guerra Mundial, De Lattre combatera com distinção em 1940, permanecera como general no pequeno exército de Vichy até cair em desgraça por resistir aos alemães quando estes invadiram e ocuparam a denominada zona livre em Novembro de 1942. Caiu em desgraça por um lado, mas adquiriu uma boa reputação junto do outro lado, e é este outro lado que o irá ajudar a evadir-se da França metropolitana em Setembro de 1943. Tendo estado dos dois lados e tendo-se transferido de um para outro por um acto que a propaganda tentou tornar mais heróico do que fora, o general de Lattre era a opção conveniente aos olhos de de Gaulle para ser a imagem da França militar. Embora dotado de um ego interminável e muito cioso das suas prerrogativas - era conhecido entre o seu staff como o «Rei João»... - de Lattre, ao contrário de outros generais franceses como Giraud, não tinha particulares talentos, nem sobretudo ambições, políticas, algo que era muito do agrado de de Gaulle. E é assim que o vemos em Berlim. Como aconteceu também aos outros generais da foto acima, seguiram-se cinco anos de relativo apagamento até a este ressurgência com esta nomeação (de arromba) para a Indochina, acumulando os cargos de Alto Comissário (civil) e de Comandante em Chefe (militar). O perfil do escolhido é demonstrativo que em Paris se pensava que o factor crítico da solução passava pela questão militar. Não se sabia então, mas o futuro não iria ser caridoso para o recém empossado Rei João...
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