18 dezembro 2020

A REJEIÇÃO DO APELO PARA A COMUTAÇÃO DA EXECUÇÃO DE WILLIAM JOYCE, ALIÁS «LORDE HAW-HAW»

Londres, 18 de Dezembro de 1945. A Câmara dos Lordes rejeita o apelo para a comutação da execução de William Joyce. Joyce fora o locutor mais proeminente de Rádio Berlim ao longo da Segunda Guerra Mundial. E, para que o leitor avalie por si mesmo a sua competência e capacidade de persuasão, pode ouvi-lo mais abaixo, comentando - na perspectiva de Berlim, evidentemente! - os acontecimentos que estavam a acontecer em Maio de 1940. Para o desvalorizar, a contra-propaganda britânica atribuiu-lhe uma alcunha ridícula: «Lorde Haw-Haw». Mas o que as autoridades britânicas verdadeiramente pensavam a seu respeito só se veio a perceber no fim da guerra, quando, ocupando a Alemanha, foram deliberadamente à sua procura para o capturar e julgar. A captura foi atribulada: Joyce, que já possuía uma distinta cicatriz facial alegadamente adquirida numa antiga cena de ciúmes (abaixo, à esquerda), foi ferido a tiro, e logo com uma bala que o atingiu e perfurou simultaneamente as duas nádegas (abaixo, lado inferior direito).Mas nem mesmo o aspecto algo burlesco do que lhe acontecera quando da captura o salvará do que os britânicos lhe tinham preparado quando do julgamento.
William Joyce nascera numa família de origem irlandesa, embora com simpatias unionistas (i.e. pró-britânicas). Mas, mais do que isso, Joyce nascera nos Estados Unidos (em 1906) e com isso adquirira a nacionalidade americana desde nascença. Anos depois a família regressara à Irlanda e mudar-se-á para Inglaterra quando da independência irlandesa. E é em Inglaterra que Joyce militará na organização fascista BUF. A sua participação na política britânica terá sido conseguida a partir de documentação forjada, uma vez que Joyce continuava a ser um cidadão americano. Em 1939, William Joyce refugiar-se-á na Alemanha. E, no ano seguinte, naturalizar-se-á alemão. Por este percurso se perceberá o quão forçado foram as acusações de «traição à pátria» que sobre si impediam quando foi presente a julgamento. Era importante que a acusação fosse essa, para que a sentença se revestisse da gravidade da execução. O problema era que a acusação de «traição à pátria» não se sustentava porque Joyce nunca fora britânico. Mas a acusação conseguiu impressionar o tribunal com a alegação que Joyce obtivera um passaporte britânico prestando falsas declarações sobre a sua nacionalidade e, com isso e por causa disso, tornava-se elegível para ser julgado como súbdito de Sua Majestade.
É o género de argumento que só podia mesmo ter acolhimento naquelas condições delirantes de desforra do após-guerra... Impressionando não apenas o juiz que presidiu ao julgamento, mas também, como lemos mais acima, quatro dos cinco lordes que haviam sido encarregues de apreciar o seu apelo. «S. Magestade» não interveio e «Lorde Haw-Haw» foi enforcado a 3 de Janeiro de 1946. Por ser um bom locutor de rádio a trabalhar para uma causa absolutamente errada - 6 milhões de audiência regular no Reino Unido em 1940, mas um enorme decréscimo nos anos seguintes... Vários anos depois, com um distanciamento e uma clarividência diferentes, o historiador britânico A.J.P. Taylor comentava a respeito do julgamento de William Joyce: «Tecnicamente, Joyce veio a ser enforcado por ter prestado falsas declarações quando solicitou um passaporte, o género de falta que costuma ser sancionada com a aplicação de uma multa. No fundo, o seu verdadeiro crime foi ter atraído para si a reputação mítica de ter sido a encarnação de Lorde Haw-Haw». O homem que chegou a disputar à propaganda oficial a capacidade de influenciar os ingleses. E, a propósito, remate-se que o regresso dos excessos contra estes homens de que ninguém gosta, são sempre de lamentar: com Ana Gomes ou com Marisa Matias.

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