Se bem percebi, a Linha Vermelha é uma via rápida concebida para escoar mais facilmente o trânsito do centro do Rio de Janeiro para as suas periferias. Todos aqueles que habitam metrópoles reconhecerão nas suas o mesmo género de rodovias que desempenham funções similares às da Linha Vermelha, embora com outros códigos: IC 19 em Lisboa, VCI no Porto. As funções serão as mesmas, mas a funcionalidade das mesmas é que não, a atender às imagens abaixo, que datam de 1 de Junho, há pouquíssimos dias. No Rio de Janeiro o trânsito pode parar, não pelo excesso de viaturas, mas tão somente por haver uma troca de tiros entre gangs rivais um pouco mais adiante. E, mais do que aguardar e como se ouve no desabafo, as pessoas saem dos carros e agacham-se
Para quem fique chocado com a cena, condutores e passageiros agachados, alguns rezando, saiba-se que os episódios não só são frequentes como, quando acontecem de noite até tendem a revestir-se de uma certa beleza para quem aprecia fogo de artificio (abaixo). Ao vê-los e por associação, lembrei-me de como estas imagens poderão parecer reminiscentes a quem vivesse em Luanda há uns 41 anos. E de como a multiplicação de episódios semelhantes, no caso em que se defrontavam o MPLA com os seus rivais da FNLA e da UNITA (na foto mais abaixo, o estado em que ficou a sede da FNLA em Luanda depois de sessões contínuas de tiroteio e flagelação), levaram a população da classe média luandense (que era esmagadoramente de ascendência portuguesa) a uma situação de insegurança tal que desencadeou o seu êxodo: foram muitos dos que ficaram conhecidos por Retornados.
O que os distinguirá é que só a insegurança do Rio de Janeiro se equivale à de Luanda. Não há um problema político subjacente - não me consta que os traficantes queiram destituir o governador ou o prefeito do Rio para os substituir por homens da sua confiança... - e, por outro lado, a classe média carioca também não tem uma metrópole para onde emigrar. Mas, mesmo assim, é com este quotidiano (que em 1975 afugentou centenas de milhares para Portugal) como pano de fundo que se tem de analisar a actual crise política brasileira. Tenho-nos visto a nós, estrangeiros, demasiado assertivos nas opiniões que emitimos sobre o que ali se tem passado. Paira por aí uma indignação que me parece mais expressa de fora do que compreensível por dentro.
O problema da insegurança não foi decididamente criado pelo PT nem muito menos por Dilma Rousseff. Se calhar até é verdade a tese de que o PT fez muito mais quando no poder do que os outros partidos para reduzir as desigualdades sociais da sociedade brasileira que estarão na origem da insegurança. Agora o que também é intolerável em qualquer estado que se queira dar ao respeito é que um condutor numa situação corriqueira tenha que se confrontar com a situação acima, deitar-se no alcatrão e rezar para não ser alvejado. Ninguém tem orgulho neste estado de coisas e duvido que, excepção feita aos incondicionais do PT, alguém levante um dedo que seja para defender um poder que (não) se exibe desta forma.
PS - Os Jogos Olímpicos começam dentro de dois meses.
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