16 novembro 2023

O ASCENSO SIMÕES DA AMÉRICA

Para aqueles leitores deste blogue pouco conhecedores das idiossincrasias marginais da política portuguesa, esclareça-se que Ascenso Simões é um deputado socialista de 60 anos que se notabilizou pelas continuadas altercações em que se envolve. Para além de um estilo exageradamente confrontativo nas redes sociais, o político já foi condenado em tribunal depois de se meter à porrada com um agente da PSP. É alguém que ainda há poucos dias pretendia que o problema dos envelopes de notas do chefe de gabinete do primeiro ministro se resolveria com «um par de lambadas». Enfim, é um cromo que não deve ser levado a sério. Foi secretário de Estado de António Costa enquanto este foi ministro entre 2005-7 e, quanto à impressão que terá deixado, em oito anos como primeiro-ministro, António Costa nunca se lembrou dele para o desempenho de qualquer função governamental. Eloquente.
Mas, pelos vistos, cada país terá os seus cromos deste género, nós é que desconhecemos que eles existem. Nos Estados Unidos descobri esta semana um deles, um senador do Oklahoma de 46 anos chamado Markwayne Mullin. É um senador noviço, já que assumiu o cargo em Janeiro deste ano, mas nada disso pode justificar o seu comportamento acima, quando de uma audição no Senado há dois dias. Veio-se a descobrir que a altercação com uma testemunha, convocada para uma audição de um comité do Senadocomeçara havia oito meses. A testemunha, um sindicalista de 51 anos chamado Sean O'Brien comporta-se da mesma maneira confrontativa que o senador. O que os deve frustrar aos dois, já que a coreografia intimidatória do bullying não funciona quando são dois a praticá-la. Em qualquer dos casos, são as marteladas vigorosas do senador Bernie Sanders, que põem fim aos incidentes.
Onde esta última história começa a divergir das nossas é que na América parece haver quem se mostre preocupado com o controlo de danos à reputação. A do senador Markwayne Mullin, por muito valentão que se tenha mostrado no vídeo, afundou-se subitamente, já que não é bem aquilo que se espera de um senador dos Estados Unidos. A tournée televisiva incidiu sobre os canais conservadores trumpicos - já que Mullin é um daqueles republicanos que apoia a ideia que as eleições presidenciais de 2020 foram roubadas - mas que incluiu canais mais abertos como (acima) a CNN. Quem preparou a justificação a Mullin foi buscar exemplos a episódios apropriadamente esquecidos de meados do século XIX (1856, abaixo) em que episodicamente senadores chegaram a vias de facto com colegas. Parece-me evidente o quão despropositado será invocar, como justificação para o que aconteceu, episódios com 167 anos.
Mas o que me frustra é a comprovada falta de cultura das televisões que deixam passar impunes e sem contraditório estes argumentários preparados de antemão: as referências históricas de Mullin invocadas em seu abono, incluíram também uma referência aos (supostos) nove duelos travados pelo presidente Andrew Jackson (1829-37) antes da sua eleição para presidente. Esta era indiscutivelmente a ocasião ideal para a jornalista Dana Bash da CNN perguntar-lhe pelo mais famoso duelo da história dos Estados Unidos, travado em 1804 (219 anos) entre o vice-presidente dos Estados Unidos, Aaron Burr e o antigo Secretário do Tesouro, Alexandre Hamilton, que se saldou pela morte do segundo. Dada a estrutura da argumentação do senador Markwayne Mullin, defendendo a agressão física, era caso para lhe pregar uma rasteira irónica, perguntando-lhe se se ficava por ali, ou se, como no duelo Burr-Hamilton, se podia ir um bocadinho mais longe?...

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