Eu só despertei para a coreografia das manifestações de rua depois do 25 de Abril, como não poderia deixar de ser com todos os da minha geração. E uma das regras indiscutíveis que aprendi dessa coreografia foi que o número de pessoas que se manifestam, contava. Quando em 19 de Julho de 1975, o PS, em ruptura com as chefias militares comunistas do MFA, convocou uma manifestação para a alameda dom Afonso Henriques, enchendo-a com muitas dezenas de milhares de pessoas (imagem acima), o PS lançou um repto implícito de militância aos partidos da extrema esquerda comunista: tentem lá fazer vocês agora a mesma coisa? (Eles não tentaram, pelo menos não em local tão amplo...)
Eu aprendi por essas regras do século XX, mas também me apercebi que depois de chegados ao século XXI, não apenas as pessoas deixaram de comparecer e a preferir ver quem comparecia, como aquela mesma coreografia podia ser subvertida desde que houvesse cumplicidade das câmaras de televisão. Nesta outra fotografia, de Fevereiro de 2016, por curiosidade envolvendo João Soares, um militante destacado do mesmo PS da fotografia acima, vemos como o efeito que um plano fechado das câmaras de TV (no canto superior direito) induz no telespectador a falsa sensação de que estará uma multidão por detrás do orador que não passa, afinal, de meia dúzia (se tanto!) de gatos pingados...
Agora, quando se noticia uma manifestação, e quando não é sonegado o número de manifestantes, ele é dado displicentemente, como de um detalhe se tratasse. Numa notícia de hoje da AFP brasileira, que dá conta de uma manifestação de «simpatizantes do ex-presidente de extrema-direita Jair Bolsonaro» que «protestaram no Domingo em São Paulo para exigir a saída do juiz Alexandre de Moraes do STF.» (fotografia acima), tive que esperar uns bons 30 segundos (numa notícia que pouco excede o minuto e meio) para saber que haviam sido 3 mil os manifestantes na avenida Paulista. Se isto aconteceu numa metrópole com 21 milhões de habitantes, o que é que foi mesmo a notícia?...
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