12 novembro 2023

AS NUVENS DE MAGALHÃES E OS ASTRÓNOMOS PREOCUPADOS COM A VIOLÊNCIA COLONIAL

Comecemos por explicar que as Nuvens de Magalhães são duas, duas galáxias anãs próximas da nossa própria galáxia, a Via Láctea (a proximidade é um conceito relativo, da ordem dos 160 a 200 mil anos-luz de distância). Nesta espectacular fotografia acima podemos vê-las às duas (Grande e Pequena) devidamente assinaladas - apesar de observáveis a olho nu, elas só podem observadas a partir do hemisfério Sul - justapostas à mancha de estrelas em diagonal correspondente ao plano da Via Láctea. Mas, porque elas só são observáveis no hemisfério Sul, a sua descoberta para a astronomia europeia data apenas do século XV, com as viagens marítimas dos portugueses para Sul do Equador. Terá sido esse um dos factores tomados em conta quando, no século XIX, se quis proceder a uma normalização das designações astronómicas, o que levou a comunidade científica de há uns 200 anos a baptizá-las de Nuvens de Magalhães, já que o cronista da viagem de circumnavegação daquele navegador português tinha sido um dos primeiros a fazer registo delas. Desde que foram baptizadas, muito se descobriu a seu respeito das duas nuvens e muito evoluiu a percepção daquilo que ignoramos a seu respeito. Por exemplo, em 1987, eclodiu uma supernova na Grande Nuvem de Magalhães (SN 1987A), um momento verdadeiramente histórico para a Astronomia.

Hoje, ao ler o The Guardian, apercebi-me que há um outro problema: o da nomenclatura. Diz o título do artigo que, por ser um «colonialista violento», «Magalhães não merece ter o seu nome nos céus», na opinião de «astrónomos». Ao ser apresentada nesta forma tão assertiva, vale a pena identificar e escrutinar quem são os «astrónomos» que têm a opinião que dá origem ao artigo. O plural do título está escrupulosamente certo, mas apenas porque são escrupulosamente dois os astrónomos consultados pelo jornal. Uma delas chama-se Mia de los Reyes, tem 24 anos, foi uma criança prodígio, e foi ela a autora de um artigo científico publicado há dois meses numa revista científica que terá sido o detonador deste outro do The Guardian. (é o denominado - cientificamente - efeito carambola da asneira...) O outro chama-se David W. Hogg, ensina na Universidade de Nova Iorque, e o que acrescenta como argumento é que «a questão principal é que as Nuvens não foram uma descoberta sua» (de Magalhães). Dispenso-me enumerar os milhares de exemplos a que esta cláusula restritiva se poderia aplicar também. O que eu quero enumerar é o número de opiniões de «astrónomos» em que o artigo se sustenta: são dois. Em contraste com os números astronómicos, citando apenas dois astrónomos, este jornalismo consegue escrever um artigo de jornal invocando que a opinião de dois é a de toda a classe... Além da estupidez inerente, de que os autores dos artigos não se demarcam, pelo mesmo processo de generalização, já que encontrei (outros) dois a dar divulgação ao disparate, atrever-me-ia a concluir que «os jornalistas» são estúpidos.

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