28 abril 2022

OS «ULTRAS» DO ESTADO NOVO

28 de Abril de 1972. Numa intervenção que proferira antes da ordem do dia, o parlamentar Alberto Franco Nogueira analisara a «evolução do mundo pós-guerra atacando os "novos mitos" apoiados, segundo declarou" (e os qualificava...), no socialismo a Oriente e no demo-liberalismo, a Ocidente". Só na aparência se tratava de "mais uma" intervenção na Assembleia Nacional, onde se falava muito mais do que legislava. Alberto Franco Nogueira não era um deputado qualquer. Fora o último ministro dos Negócios Estrangeiros de Salazar (1961-69) e um dos candidatos à sua sucessão em 1968, pretensão que perdera para Marcello Caetano. Era sabido portanto que fora - e continuava a ser - um rival do actual presidente do Conselho e que a alusão que fizera à Rodésia (a que o jornal dava, aliás, o maior destaque) configurava uma discordância política de fundo quanto à política colonial (A Rodésia era uma colónia britânica que se auto-governara através de uma minoria branca de 250.000 pessoas, uma comunidade de europeus de dimensão sensivelmente idêntica às existentes em Angola e Moçambique. Só que, ao sentir as pressões da metrópole para transferir o poder para a maioria negra, o governo da Rodésia decretara unilateralmente a independência em 1965). A discordância fundava-se no facto de que Franco Nogueira era aquilo que se designava por um integracionista - defendia a constituição de uma estrutura política que aglutinasse Portugal e as suas colónias. Os integracionistas como Franco Nogueira escreviam coisas explicando como isso se faria, mas não tinham que resolver os problemas concretos que essas coisas causariam. Marcello Caetano, pelo contrário, tinha que resolver problemas concretos, nomeadamente ceder a reivindicações cada vez maiores das colónias para mais responsabilidades e mais autonomia. É no quadro desse contraste entre a facção mais pragmática e a mais lunática do final do Estado Novo, que se pode perceber o alerta deste discurso de Franco Nogueira contra insolências à rodesiana, não fosse Luanda ou Lourenço Marques um dia destes oporem-se a Lisboa! (Ainda hoje me impressiona ver Jaime Nogueira Pinto falar destes tempos em que ele era um júnior destes ultras do regime, e absolvê-los de tanto disparate, como se aquelas fantasias que eles então propunham tivessem alguma exequibilidade!)

9 comentários:

  1. reivindicações cada vez maiores das colónias para mais responsabilidades e mais autonomia

    Quando o A. Teixeira nesta frase diz "colónias", refere-se exatamente e concretamente a quem? Aos negros nativos dessas colónias? Aos colonos brancos delas? E a que parte concreta destes ou daqueles? A que movimentos organizados (se é que havia alguns)?

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    1. OK, obrigado pela resposta. Portanto, a frase do texto deve ser lida "reivindicações cada vez maiores das administrações coloniais para mais responsabilidades e mais autonomia".

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    2. Pois, mas como não me diz nada em resposta: chegou a perceber como tem (tinha?) as ideias formatadas sobre as sociedades luso-africanas dos princípios dos anos 70? Às vezes é mais importante desmontar os preconceitos sobre os quais formula as suas perguntas, Lavoura.

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  2. Às administrações coloniais. Faço notar que as suas perguntas estão eivadas de preconceitos. Aos negros nativos dessas colónias? Aos colonos brancos delas? Pelos vistos, para si, não havia essa figura de «brancos nativos» dessas colónias, era tudo a preto (doméstico) e branco (exterior)... É o que de mais «concreto» se me oferece dizer sobre aquilo que me pergunta: mostra que tem uma ideia muito formatada sobre aquelas sociedades naquela época e, sobre isso, não pergunta nada.

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    1. Quando escrevi "os negros nativos dessas colónias", "os colonos brancos delas" simplifiquei a escrita para não me alongar. Naturalmente que sei perfeitamente que havia brancos que não eram colonos (já lá tinham nascido), que havia negros que não eram nativos, que havia diferentes cambiantes de mulatos, etc.
      Da próxima vez tentarei ser mais exaustivo na minha descrição abrangente dos habitantes das colónias.

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    2. Faça isso. Não apenas neste caso concreto, mas em geral, porque não vou perder oportunidade de me «armar em Lavoura» consigo. É humilhante, porque me dá uma imagem de ter um QI de 60, mas tenho que confessar que é divertido obrigá-lo a explicar-se porque me nego a deduzir e avalio tudo o que escreve pelo seu valor facial.

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  3. Comece talvez por perceber isso e talvez depois possa compreender porque é que aquilo que os «integracionistas» da época - onde se contavam, ainda júniores, o Jaime Nogueira Pinto mas também o Pacheco do Amorim - propunham era uma paródia. Avançavam galhardamente com propostas para a transferência da capital para Luanda (por exemplo) mas depois, no concreto, fartavam de se "coçar" quando se falava na abertura do ensino superior nessa «capital».

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    1. propostas para a transferência da capital para Luanda

      Da capital de Portugal, de Lisboa para Luanda??!!

      Que proposta tão parva...

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    2. Era uma coisa assim. No domínio dos disparates que se diziam naquela época, ele fala-se muito dos vultos que foram do MRPP, confrontando-os com os delírios que a organização escrevia. Fala-se muito menos (e injustamente) dos vultos que militaram em outras "coisas" da extrema radical como o MES, a UDP, etc. Disso já dei conta aqui no Herdeiro de Aécio. Mas existe uma verdadeira "omertá siciliana" à volta da recuperação e confrontação do que diziam então os vultos da extrema direita como os supracitados Jaime Nogueira Pinto e Pacheco do Amorim neste caso do integracionismo, mas também, noutros disparates de teor fascizante, os visibilíssimos José Miguel Júdice ou Pedro Santana Lopes.

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