Tudo isto que vou descrever é do domínio das aparências, mas o que é estranho é que, num mundo jornalístico em que as especulações são moeda corrente, há aquelas deduções que nos entram pelos olhos dentro e os jornalistas, estranhamente, nunca lá chegam. Ou são estúpidos, ou não há qualquer vantagem material em se mostrarem inteligentes ou ainda, e esta última não é incompatível com as duas anteriores, quando deduzem, resulta-lhes melhor deduzirem acompanhados. Neste processo da apresentação da demissão por Marta Temido em finais do mês passado, percebeu-se que o primeiro ministro António Costa havia amarrado por uma última vez a ex-ministra às conveniências do seu calendário, empurrando a nomeação do sucessor daquela pasta pelo menos por uma quinzena de dias: (Marta Temido) «...tinha neste momento em curso um conjunto de propostas importantes para robustecer o Serviço Nacional de Saúde...» era a treta da desculpa de Costa, e a apresentação dessas tais propostas seria a missão que a amarraria ao cargo, dando ao primeiro ministro a folga para uma nomeação de um novo titular para a pasta da Saúde, nomeação para a qual já começou uma campanha, por sinal, intensíssima. Lendo as notícias de ontem (acima), fica-se a saber que Marta Temido terá cumprido a sua parte do acordo, mas que entretanto fintou o primeiro-ministro, despachando o assunto numa semana: adeuzinho! Evidentemente que os spin doctors do gabinete de António Costa já se terão posto a correr atrás do prejuízo, anunciando a promessa da anunciação do nome de um novo ministro da Saúde antes do próximo fim de semana, mas o facto, inelutável, é que, num processo de comunicação bem gerido, ao anúncio da saída de Marta Temido se deveria seguir imediatamente o anúncio do nome do seu sucessor, para não deixar a bola bater no chão. O que é patente que não aconteceu. Estará António Costa com dificuldades em obter alguém que queira aceitar a pasta? Enfim, o que me parece seguro aceitar é que, no fim desta história, construída apenas a partir dos dados à vista, terá sido Marta Temido que, com toda a solidariedade política, deu a volta a António Costa e o deixou a falar sozinho. A ter sido, acho que foi bem feito!
PS - E quatro horas depois da publicação deste poste, torna-se notícia a nomeação de Manuel Pizarro para o cargo. A tomada de posse do novo ministro terá lugar no dia seguinte ao que escrevo, ao fim da tarde, em Belém. Ainda assim, e embora não se veja ninguém a comentá-lo, o esforço que foi feito para cobrir o buraco destapado pela saída previsível, mas abrupta, de Marta Temido é notório. Entre os despojos do incidente fica a derrota nítida de uma das facções da saúde do PS a que, mais uma vez, a comunicação social deu crédito e cobertura acriticamente (abaixo), abrindo as suas páginas à promoção do seu candidato à desgarrada, sem agora se penitenciar sequer do logro.
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