23 outubro 2021

RELEMBRAR QUANTO «OS PROLETÁRIOS DE TODOS OS PAÍSES NÃO ESTAVAM NADA UNIDOS»...

Apesar dos apelos dos slogans marxistas*, a ambicionada unidade do proletariado de todo os países, acaba por ser uma grande aldrabice. A sessão do congresso anual dos sindicatos britânicos de há 75 anos mostrava-o à saciedade. A sessão é descrita como «tempestuosa» e foi dominada pela hostilidade dos congressistas para com os trabalhadores imigrados polacos, descritos como «os visitantes mais impopulares que a Grã-Bretanha tem tido». Lembre-se que, depois de 1945, os comunistas se haviam apropriado no poder na Polónia. Por isso, a questão da presença de trabalhadores polacos no Reino Unido, muitos dos quais se tinham ali refugiado durante a Segunda Guerra Mundial, continha uma delicadeza política que se sobrepunha a considerações económicas da disputa dos mesmo postos de trabalho com os trabalhadores britânicos entretanto desmobilizados. A acrescer a isso, o governo britânico era trabalhista, de uma esquerda que ia buscar a sua maior sustentação política precisamente àqueles sindicatos que agora se manifestavam contra os polacos. Esta hostilidade dos proletários britânicos para com os proletários polacos que não queriam regressar ao seu país, agora teoricamente dirigido por uma ditadura do proletariado, possui uma ironia acrescida quando observada agora a esta distância de 75 anos: a comunidade polaca no Reino Unido cresceu enormemente no século XXI, tendo passado de 66.000 pessoas em 2001 até ultrapassar as 900.000 pessoas em 2016, ano do referendo do Brexit; depois disso, a comunidade reduziu-se em 25%, nomeadamente no contingente de camionistas que se encarregavam dos transportes rodoviários. Essa falta - estimada em 100.000 camionistas - está a fazer-se sentir seriamente no Reino Unido, provocando várias rupturas de stocks de muitos produtos de consumo, o mais preocupante são os combustíveis. A questão é que os camionistas polacos, instados a retomar o trabalho no Reino Unido, não se mostram interessados nisso - «Não, obrigado, primeiro-ministro», é a resposta de um camionista polaco a uma oferta de um visto de trabalho por três meses. Há que concordar que faz um certo contraste com a forma como os seus avós eram tratados há 75 anos.
* Há uma corrente do nosso pensamento intelectual muito minoritária, muito ignorante, mas muito assertiva, que atribui a autoria da frase a Lenine (Fernanda Câncio).

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