Para poder apreciar devidamente a entrevista conjunta dada por Jean-Claude Juncker e Martin Schulz à revista alemã Der Spiegel e publicada pelo Diário de Notícias de hoje (acima), o melhor será ter um ataque de amnésia para esquecer como aquelas duas figuras se rivalizaram na campanha das eleições europeias de Maio de 2014, como candidatos ao mesmo lugar de presidente da Comissão. Aliás, na época ambos vieram cá a Portugal para nos dizer o quanto, na sua rivalidade, nos adoravam, a nós portugueses (abaixo). Agora isso estará tudo esquecido - a rivalidade decerto, a adoração por nós também talvez... - e o que se consegue interpretar do essencial da mensagem que pretendem passar com a entrevista supra é o grau de cumplicidade que estabeleceram entre ambos: telefonam-se logo de manhãzinha, por exemplo. É uma relação que, com os últimos desenvolvimentos da correcção política das designações de género, se poderá classificar por de beijo na boca (agora já sem vislumbre de ironia). Este é o modelo de funcionamento das instituições políticas que alemães e outros europeus setentrionais mais apreciarão, mas que os portugueses e os outros meridionais nunca se disporão, creio, a compreender. A perspectiva dos Europeus do Norte nestas coisas costuma ser integradora - na sua ascensão ao poder o partido nazi alemão incluiu outra formações nacionalistas de extrema direita - enquanto a perspectiva dos Europeus do Sul tende a ser miseravelmente fraccionista - mesmo no seu apogeu no poder, o partido fascista italiano nunca passou de uma confederação de clãs rivais. Aliás, naquelas mesmas eleições europeias de 2014 onde Juncker e Schulz se enfrentavam civilizadamente, à escala nacional e embora Paulo Rangel fosse federalista e o seu rival Francisco Assis apenas um euroentusiasta, a ideia das respectivas máquinas de campanha era passarem o tempo a agredirem-se reciprocamente, acentuando nos pormenores aquilo que não os dividia no campo das ideias para a Europa. É esta conjugação de circunstâncias, esta atonia distintiva, que transforma as eleições europeias num soporífero. Em que o voto só tem consequência se escolhido algum candidato (ou opção) que parta a loiça (seja qual for a loiça que se parta): em 2014 em Portugal era Marinho e Pinto; em França é a sempiterna Marine Le Pen; no Reino Unido de há poucas semanas foi escolher o Brexit. Quem se queixa das respostas desestruturadas dos eleitorados, esquece-se que as perguntas raramente são colocadas por forma a permiti-las, às respostas, estruturadas. E também não é só uma questão de os alemães e quejandos apreciarem soluções em jeito de große Koalition, como a imagem abraçada que Juncker e Schulz procuram impingir nesta sua entrevista; é que desconfio que, entre a esmagadora maioria de todos os outros, não é nada daquilo que essa (hipotética) maioria quererá, da Europa, da política e da política europeia. Concretamente, um prosaico (mas consequente) nacionalista de direita português, depois do desaparecimento do Partido Popular de Manuel Monteiro já há quase 20 anos, onde é que ele tem podido votar depois disso?...
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