Os Últimos Cem Dias de John Toland foi outra releitura recente. Publicado originalmente em 1966, o livro apareceu no mesmo ano e acabou por ficar na sombra – por causa da semelhança do tema – de A Última Batalha escrito por um Cornelius Ryan que se popularizara imenso depois da autoria de O Dia Mais Longo. Enquanto, fazendo jus ao título, o livro de Ryan se preocupa mais com a conquista de Berlim, este fornecerá uma melhor imagem do que foi a desagregação do III Reich – e também o que se passou nalguns dos restantes países do Eixo. Descreve minuciosamente os passos que acabaram com o fuzilamento de Mussolini. Mas é sobre a Hungria e o desmoronamento do regime do almirante Horthy que não resisto a condensar os parágrafos que o descrevem (pp. 149-150):
No dia 15 de Outubro de 1944, Miki Horthy (o filho do almirante, passou a viver exilado em Portugal depois do fim da guerra, morreu em 1993) foi capturado pelos homens de Skorzeny e da Gestapo, embrulhado numa carpete e transportado secretamente para o aeroporto. Quando o almirante foi informado de que o seu filho acabava de ser transportado para a Alemanha, denunciou os nazis e ordenou ao Conselho da Coroa que desse instruções aos negociadores de Moscovo para se renderem aos russos em quaisquer condições.
Nessa tarde (...) uma gravação de voz do almirante repetia pela rádio a informação de que a Hungria havia concluído uma paz separada com os russos. (...) nada disto havia sucedido (...) os russos estavam aborrecidos (...) mandaram uma mensagem a Horthy dizendo-lhe que não haveria armistício a menos que ele aceitasse as condições impostas. O almirante e os ministros discutiram pela noite fora sem chegarem a acordo e, por fim, Horthy foi-se deitar, muito desgostoso. Finalmente os ministros concordaram entre si que se deviam demitir e procurar asilo na Alemanha e enviaram um mensageiro informar Horthy da decisão. Qualquer pessoa que conhecesse a Hungria teria previsto o resultado: Horthy enfureceu-se, recusou a abdicação implícita no gesto dos ministros e voltou para a cama. O que se seguiu pode considerar-se também tipicamente húngaro: para não ser portador de más notícias, o mensageiro disse aos ministros que Horthy aceitara o plano deles “na totalidade”.
Consequentemente, o ministro presidente enviou uma nota ao embaixador alemão informando-o que o Conselho da Coroa se demitia e que Horthy abdicava do seu estatuto de regente. No dia seguinte muito cedinho (antes das 6H00 da manhã), e depois de uma troca frenética de telegramas durante toda a noite entre Budapeste e Berlim, Horthy foi acordado pelo embaixador alemão irrompendo pela Cidadela para descobrir estremunhado que abdicara. Para rematar à confusão, alguém se esquecera de avisar um comando alemão, dirigido pelo mesmo Skorzeny acima, que se preparava àquela mesma hora para atacar a mesma Cidadela e obter pela força das armas aquilo que fora já obtido de forma equivocamente pacífica. Uma meia hora depois, e à custa de sete mortos desnecessários, Skorzeny concluía a sua operação com sucesso...
Enfim, são estas pequenas histórias que nos fazem consumir com alguma moderação tudo aquilo de que agora se quer acusar os húngaros a propósito dos refugiados. Um bom livro de se ler, uma releitura sobre a Segunda Guerra Mundial, uma releitura também sobre o ambiente de Guerra Fria, detectável na forma como está redigido.
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