04 agosto 2020

OS ESTRANGEIRADOS EM VERSÃO MARXISTA-LENINISTA

4 de Agosto de 1980. Se o meu poste de ontem foi sobre o Diário de Lisboa e as férias (no estrangeiro) do sr. dr. Joaquim Manso, o de hoje é uma espécie de continuidade do mesmo tema, só que com uma mudança de protagonista, já que se passaram 30 anos e que, a partir do 25 de Abril, parece ter passado a ser importante para o Diário de Lisboa informar os seus leitores em que sítio do estrangeiro é que o sr. dr. Álvaro Cunhal havia passado as suas. Há quarenta anos e como se percebe pela notícia ao lado, o secretário-geral dos comunistas portugueses estava na Crimeia. E também lá estava Leonid Brejnev, entre uma ida e vinda a Moscovo, à cerimónia de encerramento dos Jogos Olímpicos que tivera lugar no dia anterior (a notícia não o menciona, mas é verdade). A Crimeia era a estância de férias do Who's Who do marxismo-leninismo e era importante que em Portugal se percebesse que Álvaro Cunhal fazia parte desse círculo íntimo. Marx não escrevera sobre isso, Lenine tão pouco, mas era uma nova maneira de se ser um estrangeirado

RELAÇÕES PCUS-PCP CONTINUAM AS MELHORES

O secretário-geral do Partido Comunista da União Soviética, Leonid Brejnev encontrou-se sábado na Crimeia, com o seu homólogo português Álvaro Cunhal – anunciou a agência soviética Tass. Na reunião foi afirmada a necessidade de consolidar a coesão dos partidos comunistas, como condição importante para intensificar acções conjuntas com outras forças democráticas com vista à paz e ao desanuviamento. Depois de salientar o significado da política externa do PCUS relativamente à paz, Álvaro Cunhal referiu também o poder económico da União Soviética e a sua importância no desenvolvimento do nível de vida do povo soviético. Os dois dirigentes partidários afirmaram, por outro lado, que o PCUS e o PCP continuarão a desenvolver esforços no sentido de melhorar o actual clima político internacional e a «opor-se às forças agressivas do imperialismo que tentam impor aos povos uma nova etapa na corrida aos armamentos». Brejnev e Cunhal confirmaram ainda que serão suportes (apoio) da consolidação da cooperação e solidariedade entre «as três grandes forças revolucionárias actuais: os países socialistas, o movimento da classe operária nos países capitalistas e os movimentos de libertação nacional». Durante o encontro foi ainda salientado «o reforço da amizade e cooperação entre os dois partidos dentro dos princípios do marxismo-leninismo e internacionalismo proletário». O encontro entre Brejnev e Cunhal foi o último de uma série que o presidente soviético manteve na sua residência de férias com dirigentes comunistas, segundo informa o «Pravda».

Descontando o blá-blá-blá tradicional destes encontros (compare-se a semelhança da redacção acima com a de um encontro também em 1980 entre Brejnev e o homólogo francês de Cunhal, George Marchais), o que interessaria a Cunhal é que cá por Portugal ressoasse a notícia de que ele se havia encontrado com Brejnev («Precisava que aparecesse a notícia na imprensa: "Brejnev encontrou-se com Cunhal!"», como se pode ler no livro de José Milhazes). E, como se vê, o Diário de Lisboa fazia-lhe(s) a vontade! O PCP (e Cunhal) analisavam a situação política portuguesa de uma forma assaz dramática: depois de terem alcançado 18,8% nas eleições intercalares de Dezembro de 1979, parecia-lhes que a fasquia psicológica dos 20% dos votos estava perfeitamente ao seu alcance nas próximas eleições de Outubro de 1980, senão mesmo o sonho de superar a votação dos socialistas, feito que na Europa Ocidental só os comunistas franceses e italianos haviam alcançado. Mas, mesmo com o encontro com Brejnev, o PCP iria ficar bastante desapontado.

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