(Republicação)
3 de Outubro de 1993. A verdade é que há precisamente trinta anos os norte-americanos já não sabiam muito bem o que é que andavam a fazer na Somália, mais precisamente na sua capital Mogadíscio. Os fuzileiros haviam lá desembarcado em 9 de Dezembro do ano anterior, numa operação que tivera um nome pomposo (Restore Hope - Restaurar a Esperança) e uma coreografia ridícula: o grosso da chegada dos fuzileiros fazia-se por mar e tivera lugar durante a madrugada local, não por qualquer razão militar objectiva, mas apenas para que fosse transmitida em directo para os telejornais nos Estados Unidos. Não houvera inimigos nas praias a resistir à invasão, apenas batalhões de repórteres, cameramen, microfones e holofotes, holofotes esses que, se a situação tivesse sido séria, teriam sido uma preciosa ajuda para os snipers emboscados... Mas dez meses depois, todo aquele poderoso dispositivo ficara confinado ao papel de uma pletórica força policial que, nesse dia de Outubro de há 30 anos, recebera a incumbência de ir apanhar os membro do principal gangue de Mogadíscio. A operação correu mal: dois helicópteros UH-60 Black Hawk foram abatidos sobre a cidade e ficaram isolados. A missão passou a ser o resgate das tripulações dos helicópteros e depois o resgate de quem fora resgatar as tripulações. Vinte anos após a saída do Vietname, o desempenho dos norte-americanos em operações contra-subversivas continuou a mostrar-se ali tragicamente ineficaz: a mesma exuberância de meios e poder de fogo de sempre, mas acompanhada de uma enorme carência daquilo que eles designam (ironicamente) por inteligência (informações) a respeito do inimigo. No fim dos combates, os norte-americanos acabaram por sofrer 18 mortos, 73 feridos e 1 prisioneiro enquanto combatiam contra um inimigo que possuía uma superioridade numérica esmagadora e que os enfrentava num cenário de combate urbano, onde a superioridade de fogo dos norte-americanos tinha mais dificuldade em expressar-se. Apesar disso, os norte-americanos infligiram centenas, quiçá mesmo um milhar (ou talvez mais) de mortos ao inimigo, mas o kill-ratio é irrelevante quando não existe uma acção política que explique aos seus soldados e à sua opinião pública porque é que se morre em Mogadíscio e por Mogadíscio. O destacamento norte-americano foi rapidamente retirado da Somália por decisão do presidente Clinton. E, num arrobo "à britânica" de prestigiar um desastre militar para deixar de ser tão desastroso, em 2002 foi lançado um filme intitulado «Black Hawk Down» cujo trailer usei para ilustrar o texto.
Sem comentários:
Enviar um comentário