Assim como Portugal com Goa, Damão e Diu, também a França possuía, embora em menor dimensão (508 km²), um conjunto de possessões na Índia (acima). A versão da História que subsiste é que, ao contrário do que aconteceu com o caso português em 1961, elas foram integradas na União Indiana sem quaisquer problemas em 1954. Um daqueles pormenores de efemérides que li recentemente, veio esclarecer-me que não foi tanto assim. A efeméride a que me refiro é a de 16 de Agosto de 1962 quanto, só então e oito anos depois dos factos, a Assembleia Nacional ratificou o Tratado em que a França cedia os territórios à União Indiana. A esta disposição de encerrar formalmente os problemas coloniais pendentes não seria estranho o facto de a mais importante colónia francesa, a Argélia, ter-se tornado independente de facto e de jure no mês anterior, em Julho de 1962. O que se passara em 1954 é que a União Indiana promovera discretamente um golpe de força – mas não com muita força... – em que derrubara a administração colonial francesa em Yanaom, um dos enclaves constituintes da Índia francesa. Não por acaso, o processo foi precisamente idêntico ao ocorrido nesse mesmo ano mas mês e meio depois em Dadrá e Nagar Haveli, enclaves portugueses. Se a reacção oficial portuguesa foi frontalmente hostil, a reacção francesa foi de uma hostilidade carregada de nuances. Em 21 de Julho de 1954 a França assinara os Acordos de Genebra, onde reconhecia a derrota na Indochina. Os dias da França como potência colonial na Ásia estavam contados. A França iria ceder na prática na Índia mas reservando-se o reconhecimento formal para melhor altura – oito anos depois, como acima se refere, já num outro quadro conceptual da presença francesa no Mundo¹. Mas a mudança do governo francês em 1954 foi também um alerta para as elites locais fazerem uma inflexão na sua atitude face a uma cada vez mais inexorável anexação pela União Indiana. E aí é engraçada, porque simbólica, a figura de Édouard Goubert (1894-1979), o deputado representante da colónia na Assembleia Nacional francesa (abaixo à esquerda), filho de francês e de franco-indiana, com a sua formação jurídica feita em Paris, um francófono e francófilo não muito dado a exotismos - tinha 60 anos à data da anexação... - que, para salvar a sua carreira e também para benefício da fábula histórica da anexação pacífica da Índia francesa, é hoje representado pintado (abaixo à direita) e até mesmo em estátuas com o quico – à Nehru – do nacionalismo indiano na cabeça.
¹ Para comparação, Portugal veio a reconhecer de jure a anexação das suas possessões indianas treze anos depois de ela ter ocorrido.
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