A Força Aérea norte-americana (USAF) tem uma base em Thule. Thule fica na Gronelândia e a Gronelândia é muito fria. Como Thule fica no Norte da Gronelândia as temperaturas na base serão ainda mais baixas que no resto da ilha. E como o episódio se desenrolou em 21 de Janeiro de 1968 (no pico do Inverno, portanto) é mesmo sob uma sensação gélida que a história tem de ser compreendida. Nesse dia permanentemente escuro de Janeiro de 1968 (naquelas latitudes naqueles meses o Sol mal se levanta acima do horizonte), um bombardeiro B-52 da USAF (abaixo, à esquerda) cumpria a sua missão de alerta voando interminavelmente durante horas uma rota em forma de infinito a 35.000 pés de altitude. E, porque o desconforto era grande, o co-piloto havia arranjado umas almofadinhas de espuma de borracha para colocar sobre o assento. Haviam-se passado já umas cinco horas de voo quando a tripulação tiritando achou que o aquecimento da cabine não estava a funcionar adequadamente. O mesmo co-piloto, o major Alfred d’Amario Jr. – o friorento do grupo, provavelmente... – accionou um dispositivo adicional para aquecer a cabine que sugava ar de exaustão dos reactores. Só que o ar estava muito quente (220ºC) e, porque os ventiladores se situavam precisamente sob os assentos(!), pegaram fogo às almofadinhas.
O operador de radar, o major Frank F. Hopkins, deu pelo cheiro a borracha queimada, identificou a origem dele, a tripulação ainda tentou apagá-lo com os extintores mas o fogo e o fumo propagaram-se, declarando-se o fogo a bordo, provavelmente o pior perigo para um avião voando em altitude de cruzeiro. O piloto, o capitão John Haug pediu a Thule autorização para proceder a uma aterragem de emergência. Não a chegou a realizar porque, passado algum tempo, o fogo deve ter atingido e destruído alguma cablagem vital e o B-52 perdeu a energia eléctrica. A tripulação iria ter que saltar de pára-quedas. Naquele dia a temperatura ambiente era de -30º C. O vento e o consequente efeito de windchill tornavam-na equivalente a -42º C. Naquelas condições, qualquer parte exposta do corpo arriscar-se-ia a uma severa queimadura pelo frio em cerca de dois minutos. Por isso, para aumentar as hipóteses de sobrevivência da sua tripulação, o piloto tentou aproximar o mais possível o avião de Thule antes de o abandonar por último, a cerca de 5 km do início das pistas. Já sem ninguém, o B-52 sobrevoou totalmente Thule antes de posteriormente descrever uma bizarra volta de 180º e vir despenhar-se sobre o mar gelado.
Dos sete tripulantes, seis chegaram vivos ao solo. O último a saltar, o capitão Haug, veio a pousar são e salvo e ajudado pelo vento no meio do complexo de pistas da própria base aérea. O primeiro a saltar ainda a 10 km de distância das pistas, o navegador, o capitão Curtis Criss, foi o último a ser encontrado quase 24 horas depois e teve que amputar os dois pés. Mesmo assim, e consideradas as circunstâncias, é consolador pensar que, na altura com 43 anos, o capitão conseguiu continuar a jogar golfe e que veio a sobreviver mais 40 anos ao desastre. Desastre esse que nada teria de notável não se desse o caso do B-52 transportar 4 bombas termonucleares (acima). O local do despenhamento (abaixo) ficou totalmente contaminado – a sua (custosa) limpeza foi um evento de interesse mediático – e a existência de um B-52 em espaço aéreo dinamarquês transportando armamento nuclear tornou-se um problema de política interna dinamarquesa, já que o desastre indiciava que uma política assumida de ausência de armamento nuclear em solo dinamarquês estaria a ser violada. Investigações posteriores, mais de 25 anos depois, concluíram que, a haver hipocrisia e dissimulação, ela seria mais da responsabilidade do lado dinamarquês do que do norte-americano...
Retrospectivamente, já se imaginou se algo semelhante se tivesse passado nas Lajes?
Sem comentários:
Enviar um comentário