11 junho 2015

ACAUTELAMENTOS SOBRE AS VIRTUDES DE UMA TAP PRIVADA

Hoje, dia de decisões quanto ao destino da TAP, torna-se pertinente enfeitar os comentários a esse respeito com a fotografia de Leopoldo II (1835-1909), rei dos belgas por 44 anos (1865-1909), mais importante para o que se quer realçar por ele ter sido o accionista maioritário da sociedade (a Associação Internacional do Congo) que foi a detentora da única colónia privada registada da História: o Estado Livre do Congo (1877-1908). Ao contrário das outras potências, onde se contava Portugal, quando da repartição dos territórios africanos feita pela Conferência de Berlim (1884), os 2.344.000 km² na margem esquerda do Congo que foram atribuídos aos interesses de Leopoldo II receberam um estatuto jurídico distinto do de todas as outras colónias, fossem elas alemãs, britânicas, espanholas, francesas, italianas ou portuguesas. O Congo era gerido numa perspectiva privada, orientada para a produção imediata de lucros para os accionistas e, nesta época actual em que se tornou axioma que isso é sempre melhor do que ter critérios de exploração públicos, convém recordar o estigma para que foi remetida...
...a colónia propriedade-pessoal de Leopoldo II por causa dos métodos nele aplicados quanto ao tratamento das populações locais – e isso numa época em que o tratamento das populações africanas submetidas não constituía propriamente uma prioridade entre as opiniões públicas dos países colonizadores. Mas há que reconhecer que a amputação das mãos dos recalcitrantes e a publicação das suas fotografias em jornais de grande circulação das potências rivais (acima) teve um efeito arrasador naquilo que parecia ser um método eficaz adoptado pela famigerada Associação Internacional para a motivação das populações submetidas à sua tutela. No fim, pouco antes da sua morte, e considerada a pressão internacional, Leopoldo II teve que desistir do seu projecto de propriedade pessoal, legando o Congo à Bélgica em 1908 e rebaptizando-o de Congo belga, acabando por dar à colónia um figurino que era mais consentâneo com as entidades de direito internacional então aceites nessa época. Eu bem sei quanto o tema desagradará, mas os elogios mais exuberantes ao dinamismo da exploração privada, bem podem ser ainda hoje ilustrados com as mãos decepadas daqueles tempos.
Os meus votos vão para que depois da decisão de hoje não fiquemos futuramente com o mesmo olhar reflexivo e resignado deste chefe congolês a quem alegadamente cortaram a mão de uma das suas filhas como sanção por ele não ter conseguido alcançar a quota de borracha que lhe fora destinada...

1 comentário:

  1. Esta "comissão liquidatária" a que alguns teimam em chamar "governo", sabe que ainda pode privatizar os rios (com nascente no país) e os monumentos nacionais...
    Só espero que não tenham tempo para isso!!!

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