Este mapa-mundo, que abrange cerca de ¾ da superfície do nosso planeta, mostra-nos a extensão daquela que é uma das mais desconhecidas expansões da Humanidade: a dos povos austronésios. Tratou-se, como aconteceu com os povos indo-europeus que vieram a povoar a Europa, o Próximo Oriente e o Subcontinente Indiano, de processos desencadeados pelo crescimento demográfico das populações, mas um crescimento muito lento, que se processou paulatinamente e se arrastou por milénios. Fazendo parte da pré-História, tudo o que neste momento se pensa saber sobre esses processos resulta dos trabalhos da arqueologia, das investigações da linguística e, mais recentemente, das da genética.
Uma das maiores surpresas da expansão austronésia é a localização do seu berço. Embora haja outras teorias – há-as sempre nestas circunstâncias – a predominante coloca a origem dos povos austronésios nas costas orientais da Formosa. Não há como iludir a ironia: a ilha é hoje maioritariamente povoada por chineses (98%) e constitui, como República da China e como expressão da recusa da aceitação da supremacia comunista no continente (a República Popular da China), uma das últimas expressões da Guerra-Fria. Mas é a sua praticamente ignorada população aborígene (2%) que é a depositária de uma saga que, iniciada há cerca de 5.000 anos, hoje abrange cerca de 400 milhões de pessoas.
Em contraste com a dos indo-europeus do mapa acima, a expansão dos povos austronésios foi predominantemente marítima e veio a prolongar-se até períodos que já eram históricos noutras partes do Mundo: a sua chegada a Madagáscar já será contemporânea com o Império Romano e a chegada à Nova Zelândia coincidirá com a nossa época das Cruzadas. A expansão fez-se inicialmente para os arquipélagos das Filipinas e da Indonésia que já se encontraram povoadas por imigrantes anteriores, povos de tez mais escura, que seriam aparentados com os actuais aborígenes da Austrália e os papuas da Nova Guiné. Só depois a expansão prosseguiu com a colonização de ilhas até então despovoadas.
Só os especialistas é que conseguem dar uma aparência de lógica de parentesco (veja-se o quadro acima, clicar para o ampliar) a um conjunto de quase um milhar de línguas actualmente faladas, exercício esse que comprovará uma raiz comum a elas todas. Ali aparecem idiomas falados na Indonésia, na Malásia, nas Filipinas, o tétum, que é o idioma coloquial de Timor-Leste, e ainda o maori neozelandês, idiomas falados em Madagáscar e outros falados quase do outro lado do Mundo, nos vários arquipélagos do Pacífico, tão longe quanto o estado norte-americano do Hawaii. O único lapso desta gesta é que não existe nenhuma potência – a Indonésia prefere o Islão... – que pretenda explorar os efeitos propagandísticos deste feito (pré)-histórico.
Já em jeito de aditamento e aproveitando para republicar o mapa inicial, valerá a pena chamar a atenção para algumas peculiaridades dos contornos geográficos da expansão. Uma delas é o facto dos austronésios nunca se terem conseguido implantar na Nova Guiné, um fracasso que Jared Diamond terá explicado satisfatoriamente num capítulo (17) de um livro que recomendo a leitura a interessados: Armas, Germes e Aço. Outra peculiaridade, essa por explicar satisfatoriamente, são as condições em que os austronésios terão conseguido colonizar Madagáscar vindos de Bornéu, percorrendo uma distância marítima superior de 7.000 km sem, como se pode acima verificar, quaisquer possibilidades de escalas para reabastecimentos.
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