07 junho 2024

CENAS TRISTES QUE SE FAZEM À PORTA DE UM TRIBUNAL

Começo por explicar que as imagens de um pouco mais de minuto e meio de declarações de Manuel Pinho ontem, à saída do tribunal, onde havia sido condenado a dez anos de prisão, estão disponíveis na página da TVI player. Mas o momento é bom demais para apenas ser apreciado televisivamente e por isso merece a sua transcrição. Para que se saboreie de outra maneira a evolução da atitude de Manuel Pinho que começa por tentar dissertar sobre a injustiça que acabara de ser cometida contra a sua mulher, se mostra depois arrogante para com os jornalistas que o interrompiam com perguntas sobre o essencial (a sua condenação e a de Ricardo Salgado), se vê a braços depois com uma ameaça de insurreição dos microfones se ele não mudasse de assunto para aquilo que verdadeiramente lhes interessava, até à fase em que passa aos elogios bajuladores para com aqueles que, ainda um minuto antes, tratara com tanta sobranceria («Vamos combinar uma coisa: se quer falar... comigo não fala! Eu não respondo»).

Manuel Pinho - «...em que se dizia que a colecção que a minha mulher criou é a jóia da coroa e uma das melhores do Mundo. No entanto...»
Confusão de vozes. Voz do jornalista da SIC a sobrepor-se: - «...foi condenado a dez anos de prisão. Era o que esperava?»
Manuel Pinho - «Eu agradeci... Eu agradecia que não me interrompessem, está bom?... Aaah... Ora bem, e foi condenada por ser casada comigo. Imaginem que era ao contrário. Que era um homem que arranjava um emprego por causa da mulher.»
Nova confusão de vozes de onde acaba a sobressair a voz da jornalista da RTP: - «Foi condenada, segundo o tribunal, porque ocultou o dinheiro...»
Manuel Pinho - «Eu agradecia que não me interrompesse. Vamos combinar uma coisa: se quer falar... comigo não fala! Eu não respondo. Muito bem.»
Ainda uma terceira confusão de vozes, com mais participantes, onde se ouve novamente o jornalista da SIC: «...vamos fazer perguntas...»
Manuel Pinho resigna-se e deixa cair o assunto da mulher - «Ora bem. Nós vamos recorrer porque a sentença não tem nada a ver com o que se passou no tribunal. Vocês cobriram o que se passou no tribunal... e não tem nada a ver. Nós tínhamos uma estratégia para este julgamento. Em primeiro lugar era fazer o possível que ele fosse rápido. Demorou sete meses e se não demorou quatro, não foi por razões que nos fossem imputadas... (a notícia abaixo é eloquente quanto a essa estratégia)
Manuel Pinho (continuação): - «É possível fazer um julgamento rapidamente. E depois uma grande aposta na transparência. E na transparência vocês foram fundamentais. Porque vocês relataram de uma forma precisa, honesta e fidedigna tudo o que se passou aqui. E portanto toda a gente sabe o que se passou aqui. E o que se passou aqui não tem nada a ver com a sentença. Portanto eu não estou agradecido à imprensa porque vocês cumpriram o vosso dever, mas quero aqui prestar a minha homenagem porque vocês são vítimas de muitas críticas...»

Saúdam-se as condenações. Deseja-se que seja apenas a primeira de outras que tardam, destacando a de José Sócrates. Quanto à cena que acima se reproduz, tal é a mediocridade demonstrada por Manuel Pinho que, fossem as circunstâncias outras, até seria de se manifestar alguma pena por este pateta que nem sabe engraxar com um decoro de sofisticação. Mas a verdade é que a corrupção foi de demasiados milhões para o destinatário que percebemos que ele é. Cinicamente, até se pode considerar que houve aqui um desperdício de recursos por parte de Ricardo Salgado, que pagou demais pelo que Pinho vale. Quanto ao comportamento dos microfones, eu vivo para o dia em que eles, por causa da indigência do que está a ser dito, espontaneamente os retirem da frente do entrevistado, como parece ter estado quase a acontecer ontem com Manuel Pinho.

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