A ópera infantil Brundibár foi composta originalmente em 1938 pelo compositor Hans Krása, baseada num libreto de Adolf Hofmeister (os dois autores são judeus checos). E porque Krása fora inicialmente internado no gueto de Theresienstadt (hoje Terezín), a ópera veio a ser representada umas dúzias de vezes naquele gueto durante a Segunda Guerra Mundial. Uma dessas representações aconteceu há precisamente oitenta anos, a 23 de Junho de 1944, quando o gueto foi visitado por uma delegação do Comité Internacional da Cruz Vermelha. A delegação era composta por três elementos, encabeçada pelo suíço Maurice Rossel, acompanhado de dois funcionários dinamarqueses (a Dinamarca estava ocupada pela Alemanha). A visita foi programada para durar todo o dia, mas seguia uma cenografia preparada pelos alemães de antemão, uma verdadeira encenação de aldeia Potenkin, onde se incluía a representação da ópera do vídeo acima. A realidade era outra: o menino com bigode que acima vemos a desempenhar o papel principal - o de Brundibár - chamava-se Hunze Triechlinger e foi um dos 33.000 mortos que viriam a morrer de subnutrição, doença e outras más condições que vigoravam no gueto de Theresienstadt. Outros 88.000 internados - como o compositor Hans Krása - foram deportados para Auschwitz, onde a grande maioria veio a morrer. Dos 140.000 internados que passaram por Theresienstadt durante a guerra, cerca de 23.000 terão sobrevivido. O instante de felicidade aparente do vídeo acima também não deve esquecer o facto de que o relatório de Maurice Rossel nada assinalava de anómalo, era um endosso da narrativa que os alemães das SS haviam preparado. Mais do que o homem, é um dos momentos mais embaraçosos da história da Cruz Vermelha que falhou clamorosamente nos objectivos que se proclama defender. Significativamente o relatório de Maurice Rossel só se tornou público em 1992, 48 anos depois dos factos.
Embora não haja a certeza que o vídeo inicial seja da representação de Brundibár feita para os membros da delegação da Cruz Vermelha de há 80 anos, esta última fotografia foi tirada pelo próprio Maurice Rossel nesse dia 23 de Junho de 1944, fotografia que apensou ao seu relatório.
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