12 janeiro 2022

A «CONJURA PREPARADA CONTRA A SEGURANÇA DO ESTADO» - QUAL CONJURA?

Se já algumas vezes se exibiram aqui exemplos de como podem ser exageradas acutalmente as descrições das consequências do funcionamento da censura nos jornais, desta vez podemos apreciá-la, à censura, em todo o seu esplendor, exibindo esta primeira página da edição do Diário de Lisboa de há 70 anos. Quem lesse a pequena notícia do canto inferior esquerdo com o título Ordem Pública, ou sabia de antemão a que «conjura» se estariam a referir os «telegramas, ofícios, cartas e outras missivas» que o «sr. ministro do Interior» recebera, ou então não era certamente pelo que constava da notícia que ficava informado. E também não havia outras notícias noutro local do jornal esclarecendo o leitor quem fazia parte da conjura, como havia sido descoberta, nem o que acontecera aos conjurados. E também não encontrei notícias a respeito nas edições do Diário de Lisboa dos dias seguintes. Mas prometo que o leitor do Herdeiro de Aécio vai ficar mais esclarecido que o do jornal de há 70 anos. Os conjurados eram os membros da «Organização Cívica Nacional» e haviam sido presos no dia 7 de Janeiro pela PIDE durante uma das suas reuniões na sede da organização, na rua da Assunção, nº 4. Compunham-na o brigadeiro reformado António de Sousa Maia, o coronel reformado Luís Gonzaga Tadeu, o major reformado Daniel Alexandre Sarsfield Rodrigues, o capitão reformado Henrique Galvão, o capitão na reserva Henrique Pereira Monteiro de Macedo e o capitão-tenente reformado José Moreira de Campos. Eram tudo nomes de militares tradicionalmente associados a conspirações para derrubar o Estado Novo, uma novidade da lista seria o capitão Henrique Galvão, que fora até há pouco tempo um dos deputados do regime, e que agora se mudara para o outro lado. Mas, nitidamente, a censura velava para que o assunto não fosse noticiado. Tanto assim que depois de presos, os conjurados vieram a ser julgados no Tribunal Militar de Santa Clara, um julgamento que terminou em 11 e 12 de Dezembro daquele mesmo ano. As penas (de dois e três anos) será o menos importante. Veja-se abaixo, à esquerda, o que o Diário de Lisboa noticiou - conseguiu noticiar - naqueles dois dias. Não contêm nada de substantivo sobre o que ocorrera. Em contraste (e talvez o jornal o tivesse feito expressamente), chega a ser ridículo a comparação dessas duas notícias com o conteúdo de uma outra, também publicada num desses dois dias, de evocação de um outro julgamento, também em Tribunal Militar, que ocorrera precisamente 30 anos antes.

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