16 abril 2017

OS LÍDERES VERDADEIRAMENTE REVOLUCIONÁRIOS REGRESSAM DO EXÍLIO SEMPRE DA MESMA MANEIRA?

16 de Abril de 1917. A data que se costuma mencionar é outra (3 de Abril), mas essa diferença deve-se à discrepância então existente entre o calendário ocidental e o russo. Porém, foi há precisamente cem anos quando Vladimir Lenine regressou a uma São Petersburgo que entretanto se passara a denominar Petrogrado e que já depois disso, há cerca de um mês, se tornara a capital de uma nova Rússia republicana. O regresso do líder bolchevique vindo do exílio da Suíça fora uma movimentação arduamente negociada com a Alemanha imperial então em guerra com a Rússia. Com a Primeira Guerra Mundial ainda em curso e as fronteiras mais tradicionais bloqueadas pelas frentes de combate, o comboio onde viajava Lenine viera de Helsínquia na Finlândia, que então fazia também parte do império russo.

A fotografia da chegada do grande revolucionário à estação da Finlândia é única, é aquela que se exibe mais acima. Não existem outras que possam complementar a nossa opinião sobre a dimensão da multidão reunida para o acolher. Uma outra fotografia sua recolhida três dias ainda em Estocolmo, na Suécia, mostra que a entourage que acompanhou Lenine desde a Suíça era ainda bastante modesta. O que se pode exibir a respeito daquilo que aconteceu há cem anos são reconstituições posteriores em filme (acima) ou em pintura (abaixo), que acabam afectadas pela natureza hagiográfica revolucionária que o momento veio posteriormente a adquirir por causa do triunfo alcançado pela revolução bolchevique (que só veio a ter lugar daí por sete meses).
Rezam essas narrativas reconstituídas (aí já revistas tendo em conta que o momento fora retroactivamente histórico) que, acolhido delirantemente na gare, e seguido por uma numerosa multidão que o esperava e vitoriava, Lenine aproveitara depois um carro blindado que estava estacionado no largo da estação para se alçar para cima dele para dali proferir um discurso às massas populares revolucionárias que tão bem o acolhiam (discurso que, infelizmente, não encontrei preservado). Tratava-se de tempos inauditos, em que as multidões pareciam propensas a mitificar episódios banais. Recordem-se, a propósito, as aparições de Fátima que começarão a registar-se no mês seguinte, em Portugal, até do outro lado do continente europeu...
Uma outra data: 30 de Abril de 1974. Vindo directamente de Paris para Lisboa num voo da Air France, ficaram a faltar precisamente 15 dias para que coincidissem as datas de regresso do exílio dos dois grandes líderes comunistas, Álvaro Cunhal e Vladimir Lenine. É importante constatar que houve 57 anos a separar os dois acontecimentos. O compasso de espera de um mês de Lenine foi, neste caso português, encurtado por Cunhal para uns escassos cinco dias. A duração da sua viagem ainda mais encurtada foi e a tradicional gare do comboio foi agora substituída pela placa do aeroporto e pelo autocarro que trás os passageiros até ao terminal. Desta chegada já há muito mais que uma fotografia singela, o entusiasmo é agora registado em reportagens televisivas, incluindo as declarações do próprio Álvaro Cunhal, visivelmente emocionado mas também nervoso e ainda sem a desenvoltura que lhe conhecemos depois a usar um microfone, marcando sempre as distâncias aos jornalistas.

Porém, apropriadamente e como que por coincidência, mesmo à saída do aeroporto lá estava um (outro) carro blindado para o qual Álvaro Cunhal foi convidado a subir para dali proferir um discurso, quiçá mimetizando aquilo que outrora acontecera com Lenine. Qual pata de coelho para dar sorte ao PCP, a intenção foi boa, a concretização talvez menos, conforme se comprova pelas fotografias da ocasião (abaixo), que aquilo que ficara registado como revolucionariamente disciplinado quando do quadro com Lenine mais acima, parecia agora um caos, com Cunhal acompanhado de uma multidão de militares e alguns civis (entre os quais Mário Soares) todos ensanduichados em cima da Chaimite, numa descrição premonitória do que seria o caos característico da multiplicação de centros de poder no PREC português que ali apenas desabrochava. Como um bom marxista também Cunhal estava a descobrir que isso de se ser leninista depende das condições objectivas... e das condições subjectivas.

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