Por causa de hoje ser o centenário do assassinato do arquiduque Francisco Fernando em Sarajevo, assassinato esse que esteve na origem da Primeira Guerra Mundial e porque – como já é motivo de troça por o evocar recorrentemente – neste blogue já se escreveram postes sobre muitos assuntos importantes, tomei a liberdade de republicar o abaixo que foi escrito já há quatro anos, não apenas sobre o assassinato mas sobretudo sobre o casal assassinado.
A história do arquiduque austríaco Francisco Fernando a que, ao ser assassinado em Sarajevo em 28 de Junho de 1914, se atribui o começo da Primeiro Guerra Mundial encerra alguns pormenores interessantes que vale a pena contar. Começando por o conhecer em fotografia, vemos nela um homem de olhos muito claros, vestido, como seria de esperar, de uma forma distinta (isso incluiria naquela época uns enormes bigodes armados) mas não muito bonito, de uma fisionomia quase porcina.
Aos 12 anos tornou-se anormalmente rico, mesmo para um arquiduque austríaco, ao acumular a sua própria fortuna com a de um primo, Francisco, duque de Modena (Itália), que o fizera seu herdeiro universal. Foram também circunstâncias inesperadas (o suicídio do seu primo Rudolfo) que o fizeram herdeiro do trono aos 25 anos (1889). Mas, por outro lado, era também um homem invulgarmente determinado, que quis casar por amor, muito abaixo do que se considerava ser a sua classe social, apesar das descomunais pressões em contrário.
Contra as pressões do seu tio, o imperador Francisco José, Francisco Fernando pediu a intercessão do papa Leão XIII ou a do imperador alemão Guilherme II (acompanhando-o acima), mas foi só após quatro anos de impasse, que a grande paixão da sua vida se veio a concretizar (1900), quanto o noivo já contava 35 anos e a noiva 31 (Sophie Chotek, oriunda da baixa nobreza checa – mas germanófona), e mesmo assim, a autorização estava cheia de ressalvas: tratava-se de um casamento morganático, o que queria dizer que a esposa não adquiria por casamento o mesmo estatuto do marido.
Também os filhos que resultassem do matrimónio não adquiriam os respectivos direitos sucessórios. A praxe infligida ao casal começou na própria cerimónia do casamento, a que quase ninguém da família imperial austríaca assistiu, e continuou a prolongar-se em todos aquelas cerimónias da Corte vienense em que os dois eram obrigados a apresentarem-se separados, por causa dos pesados protocolos. Mas havia uma excepção a esse ritual: no protocolo militar, Sophie era reconhecida simplesmente como a esposa do general comandante-chefe e autorizada a figurar ao lado do marido…
Esse terá sido um dos factores tomados em conta por Sophie ao decidir-se a acompanhar o marido naquela sua visita de carácter militar a Sarajevo. A possibilidade de poder deslocarem-se e aparecerem juntos nas cerimónias devia ter para eles um valor tal que os levou a assumir o risco. O resto da História é conhecida, mas não deixa de ser uma das pequenas ironias que Sophie tenha morrido pela felicidade de aparecer numa fotografia como a de cima. A enorme ironia foi a Áustria-Hungria ter partido para a guerra para vingar a morte de um príncipe de certa forma subversivo e tão pouco apreciado na própria corte de Viena…
Foi por acaso, que Gavrilo Princip (o assassino) deu com os arquiduques e apenas porque o motorista destes se enganou no caminho. E este apenas se enganara no percurso porque o arquiduque teimara em alterá-lo e passar pelo hospital para ver o estado dos feridos do verdadeiro atentado original – que fora cometido com uma bomba mas que acertara no carro errado. Ao contrário do que acontecera em Portugal em Fevereiro de 1908, Gavrilo não foi morto no local, nem sequer foi depois executado judicialmente. Foi condenado a 20 anos de prisão. Mas talvez a maior ironia foi a que ele quase sobrevivia à Guerra que desencadeou: morreu em Abril de 1918, de tuberculose ou foi mais uma vítima da famosa gripe espanhola. Tinha 23 anos.
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