11 de Janeiro de 1961. De Tanger, Marrocos, chega a notícia do naufrágio na noite anterior de um iate de luxo (sic) de bandeira hondurenha. Não havia notícias dos 40 passageiros (de nacionalidade israelita) nem de 2 dos 5 tripulantes da embarcação. Apreciada assim, a notícia suscita interrogações, a começar pelo facto de não se perceber o que andariam a fazer 40 passageiros israelitas num iate de luxo em pleno mês de Janeiro, às portas do Mediterrâneo, na época baixa dos cruzeiros turísticos... A notícia era estranha e a verdade, como se veio progressivamente a descobrir, era completamente outra. As discrepâncias começam logo pelo nome do navio que se afundara, que nunca se chamara «Prince», mas sim «Pisces»; porém, na altura do naufrágio, mudara o nome para «Egoz». E percebe-se porquê: o navio não era afinal nenhum iate de luxo; era um antigo draga-minas da II Guerra Mundial, com uma tripulação espanhola, alugado pelos serviços secretos de Israel para transportar clandestinamente judeus marroquinos de Marrocos para Gibraltar. A emigração para Israel dos judeus marroquinos fora proibida pelas autoridades locais depois de 1956, mas o êxodo prosseguira de forma clandestina. Esta fora a décima terceira viagem do navio, trazendo mais uma leva de 44 fugitivos (e não 40, como acima se notícia). E correra mal: o mau tempo fizera com que o navio se partisse e afundasse em pouco tempo. A verdade, substituindo a notícia, foi-se sabendo aos poucos, o capitão do Egoz, o espanhol Francisco Morilla, que fora um dos três sobreviventes, ficou preso em Marrocos. Em reacção e a partir de Israel, organizou-se uma campanha mediática internacional condoída com o destino daqueles emigrantes clandestinos judeus, criticando os marroquinos por bloquearem a emigração judaica, uma operação destinada a chamar a atenção para um dos aspectos do episódio, mas também para que se esquecesse as circunstâncias arriscadas (um navio sobrelotado em mau tempo...) em que o naufrágio ocorrera. Essas circunstâncias, as autoridades israelitas só as tornaram públicas em... 1993. Mas este é um daqueles exemplos de como há quem se apresse a fazer correr uma versão (conveniente) dos acontecimentos, e de como vale a pena, por vezes, esperar pelos desenvolvimentos das notícias para que a possamos compreender verdadeiramente. No computo final, e apesar das vicissitudes e das proibições, entre 1948 e 1967 cerca de 250.000 judeus marroquinos haviam emigrado, a grande maioria deles para Israel, onde hoje os marroquinos constituem a segunda maior comunidade de origem. Quanto à tragédia de há sessenta anos, tem-se vindo a repetir com uma regularidade inusitada - quase todos os meses. A cobertura mediática é que é outra...
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