20 março 2023

O INCIDENTE SUBMARINO DA PENÍNSULA DE KOLA

(Republicação)
A península de Kola tem 100.000 km² e situa-se a Noroeste da Rússia, quase toda ela situada a Norte do Círculo Ártico. A sua importância para a Rússia advém da existência do porto de Murmansk que, apesar da sua localização no Mar de Barents, parte do Oceano Glacial Ártico, dispõe da grande vantagem das suas águas não congelarem durante o Inverno, ao contrário daquilo que acontece com todos os portos russos no Báltico. Apesar da sua localização remota em relação ao núcleo da Rússia (1.500 km até Moscovo), Murmansk é, ainda assim, o quarto porto da Rússia e é por tudo isso que ali se localiza uma das mais importantes bases navais russas, onde nomeadamente se albergam a esmagadora maioria dos seus submarinos. A abertura do filme A Caça ao Outubro Vermelho de 1990 (abaixo) enfatiza essa paisagem gelada que, como se pode observar no mapa acima, rodeia o prolongado fiorde que separa Murmansk do mar aberto.

Mas aquilo que aconteceu perto daquelas paragens a 20 de Março de 1993, há precisamente trinta anos, embora envolvendo também um submarino russo e outro norte-americano, já não foi propriamente do domínio da ficção. Enquanto um submarino russo, o Novomoskovsk de 11.700 toneladas (abaixo, na foto superior) realizava submerso manobras de treino no Ártico, havia um submarino americano, o Grayling de 4.200 toneladas, que o seguia discretamente, evitando ser detectado. Com tanta discrição que, a certa altura, o próprio Grayling perdeu o Novomoskovsk de vista (de ouvido, já que o meio de detecção é o sonar) e quando deu por ele, este fizera uma viragem de 180º e os dois estavam em rota de colisão! O comandante norte-americano ainda tentou desviar a rota e emergir - afinal, o seu navio é que era o prevaricador e, sobretudo, o seu navio tinha apenas ⅓ do deslocamento do seu opositor! - mas a manobra não conseguiu evitar que os dois submarinos colidissem, ainda só que de raspão.
Felizmente, apesar dos danos materiais, não houve danos pessoais em qualquer das tripulações, mas o incidente deixou a imagem dos americanos em péssimos lençóis. Já no ano anterior houvera um incidente semelhante também naquele local e, nessa altura, o secretário de Estado James Baker acorrera a Moscovo para acalmar um irritadíssimo Boris Yeltsin, que constatava que, para a US Navy, aquela história do fim da Guerra-Fria não era afinal para levar a sério. Apesar das promessas então feitas, agora em 1993, sob uma nova administração (Clinton), tudo parecia ter continuado na mesma. Como uma qualquer outra burocracia que funciona por inércia, a máquina de guerra norte-americana recusou-se a abdicar do seu ganha-pão apesar da tão propagada alteração da situação estratégica. E claro que há uma outra burocracia que cuida que não se dê atenção desmesurada a estes incidentes e que a sua memória não se prolongue por demasiado tempo...

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