« - É preciso sanear a atmosfera, urge acabar com o espírito revolucionário; para isso é indispensável que todos os portugueses, sinceramente amantes da ordem e da República, se unam para que à desordem não suceda o caos. Julgo que tenho autoridade para falar assim, pois sabem todos que não entrei em revoluções, tendo pelo contrário conseguido evitá-las, fazendo-as abortar, pois julgo que é esta a forma de evitar as desastrosas consequências que delas advêm. Repito: julgo que é preciso – para não voltarmos ao passado que todos repudiam, para que se vença a crise apavorante que estamos sofrendo e para que termine de vez o ciclo revolucionário em que temos vivido – é indispensável trazer para a vida pública os republicanos velhos e os novos, leais e honestos, que queiram numa conjunção de esforços cooperar para sairmos da situação em que nos encontramos. Creio até fácil encontrar uma plataforma em que todos nos pudéssemos unir.»
« - Há princípios novos a estabelecer, há questões de direito constitucional a debater, quanto antes, pois estamos a dezoito meses do termo do mandato presidencial. Assim, entendo que a eleição do Presidente da República deverá sempre ser feita por sufrágio directo, tornando assim livre o Presidente de todas as dependências parlamentares. O Presidente seria eleito pela Nação e não por uma maioria parlamentar. Suponho que daqui adviriam inúmeras vantagens para a tranquilidade da vida política portuguesa. Quanto à organização do futuro Parlamento, sou de opinião que se devem manter as duas Câmaras: a Câmara dos Deputados, eleita por sufrágio directo; o Senado, constituído por representantes das classes. É necessário que o Parlamento seja o verdadeiro órgão da vontade nacional e, como tal, estabeleça as directrizes a que se terá de subordinar a vida do Estado e da Nação. No entanto é indispensável estabelecer bem claramente, na futura constituição, as funções do Poder Executivo e que este se rodeie de todas as condições de prestígio e força, para que possa exercer uma acção profícua e que não tenha de viver sempre em constante dependência do Poder Legislativo. Sou partidário da dissolução parlamentar, como meio de obviar aos desmandos do Poder Legislativo, é claro que, durante o período em que o Parlamento estiver dissolvido, o poder executivo deve ficar autorizado a legislar, mediante certas condições.»
« - Julgo necessário, ao bem do País e ao seu prestígio internacional, fazer-se a transição do regime ditatorial, para o regime constitucional, por meio de eleições livres, onde o direito de voto esteja completamente assegurado e a liberdade de votar completamente garantida. O Governo que presidir ao acto eleitoral deve dar as maiores garantias de imparcialidade e de isenção política. A Nação é senhora dos seus destinos e o Parlamento eleito a expressão legítima da sua vontade. As eleições devem ser feitas respeitando-se as liberdades públicas e mantendo-se a ordem. Entendamo-nos, porém, liberdade não pode ser considerada sinónimo de fraqueza, como também a ordem não deve ser sinónimo de reacção ou violência.»
« - A lei (das) incompatibilidades precisa de ser revista. Outra lei carece de ser remodelada com espírito liberal: é a Lei de Imprensa. É justo que quem cometa delitos sofra a sanção penal, mas é injusto sujeitar aqueles que exercem honestamente a profissão do jornalismo a regimes de excepção. Devem poder realizar amplamente a sua missão em absoluta igualdade de direitos com os indíviduos que exercem outras profissões liberais.»
Caro A.Teixeira,
ResponderEliminarEm tom provocatorio:
Um idiota util, portanto. E a partir de 1933 permancendo o resto inalterado, deixou de ser util... e foi tratado em conformidade.
Caro Lowlander
ResponderEliminarDeixei aqui esta evocação na expectativa de que quem a ler chegue a mais algumas conclusões para além da «utilidade» temporária de Vicente de Freitas no ciclo político que se seguiu nos anos imediatos à Revolução de 1926. Claro que, para isso, é preciso saber de antemão, o que se escreve a respeito deste período.
Uma das conclusões é para desmentir um mito construído pela Direita pró-Salazar, que Salazar foi como que "sugado" para as áreas do poder por causa de um certo "vazio" intelectual e ideológico que grassava entre os protagonistas militares iniciais do 28 de Maio. Esta entrevista demonstra absolutamente que não: havia quem tivesse ideias para o regime que se seguiria à Ditadura Militar. Salazar fartou-se de intrigar politicamente para os afastar.
A outra conclusão importante é a de desmentir outro mito, esse oriundo da Esquerda pró-republicana, a de que os participantes no 28 de Maio eram todos uns fascistas. Não há nada mais prático do que simplificar o inimigo. Ora esta entrevista mostra que isso não era assim: a descrição de Vicente de Freitas que se lê acima do que seria o período pós Ditadura Militar na sua concepção pode estar muito «adoçada», mas menciona, entre outros detalhes, eleições livres e confere importância ao poder legislativo. Ora isso é tudo o que o «fascismo» não é.
Esse contraste é que constitui para mim o tom provocatório da evocação. Vicente de Freitas é, ideologicamente, como um daqueles tios solteiros que morreu sem descendência, e a quem "ninguém vai lá pôr flores à campa", na construção das narrativas históricas.