A notícia da viagem espacial de Richard Branson encheu os cabeçalhos da comunicação social como se fosse um meteorito vindo do espaço, sem pré-aviso e sem explicações quanto ao seu verdadeiro significado. Cumprissem os jornalistas a sua função e os seus leitores aperceber-se-iam que a viagem não foi «histórica» (como a classifica abaixo o Público) e que não «despontou» nenhuma «nova era espacial» (como se escreve no Observador). A organização de Branson anda nisto para ganhar dinheiro - levar turistas endinheirados para o espaço, como se lê naquela notícia de 2017 - e o que os palhaços dos jornalistas andam a fazer-lhes é a conceder publicidade gratuita por eles terem realizado uma banalidade técnica*. Publicidade que, por ser de borla, pode ser desperdiçada na esmagadora maioria de destinatários, que não tem e nunca virá a ter os 250 mil dólares necessários para pagar uma passagem. Agora, aquilo que preocupará essa esmagadora maioria é, em vez das idas ao espaço e no caso português presente, é o problema das idas ao restaurante. Não sei quem é a Sandra Cachide que twittou as verdadeiras palavras históricas de uma nova era impaciental, mas reconheço que ela mostra ali um verdadeiro faro jornalístico para denunciar e fazer-se eco das verdadeiras preocupações sociais, e não aquilo que se percebe ter sido plantado por agências de comunicação. A prioridade das pessoas comuns não é o espaço, a prioridade das pessoas comuns é ir livremente a um restaurante.
*O primeiro voo suborbital tripulado realizou-se em 5 de Maio de 1961
Só um pequeno esclarecimento. A comunicação social portuguesa acompanhou a viagem com grandes destaques à semelhança do que se passou no resto do mundo ocidental. Tornou-se num tema mediático, daí o interesse da comunicação social. Também não foi uma banalidade técnica, porque o veículo que foi usado, ao contrário do passado, foi um veículo reutilizável, algo que nunca tinha acontecido no passado num voo suborbital. É histórico porque é a primeira vez que uma nave de uma empresa privada faz um voo suborbital. Obviamente que a Virgin não está nisto para perder dinheiro e estes voos privados são um negócio, mas abrem uma porta nova no acesso ao espaço que até agora não existia. Isto não é unicamente uma questão de turismo é também a possibilidade de termos experiências científicas a bordo a preços relativamente acessíveis.
ResponderEliminarAgradeço o seu pequeno esclarecimento. Lamento dizer-lhe que só concordo com muito pouco do que escreveu. A começar pela sua justificação pelos destaques dados por toda a comunicação social. Aquilo que descreve é um fenómeno de arrastamento por simpatia - fenómeno que concordo consigo que aconteceu - mas que em si não justifica que os órgãos de comunicação se demitam da sua função e sejam agentes activos de acções de «publicity» (no sentido original da palavra: publicidade não paga) da Virgin. Não terá sido uma «banalidade técnica», concedo, mas em lado algum pude ler, para benefício e instrução dos leitores, que o primeiro voo suborbital tivera lugar em Maio de 1961... Claro que a tecnologia disponível sessenta anos depois permite esses detalhes que menciona ou não: em vez de um astronauta, são vários, as cápsulas e os foguetes são reutilizáveis, etc. Agora, tornar «histórico» o facto de ser «a primeira que uma nave de uma empresa privada faz um voo suborbital» é conferir um estatuto - histórico - a algo que não o é. Ninguém registou como tal a primeira vez que uma nau «privada» fez a viagem marítima para a Índia depois de Vasco da Gama... porque é irrelevante. Assim estamos com os voos suborbitais... Estas viagens «abrem uma porta nova de acesso ao espaço»... para quem tiver um quarto de milhão de dólares. De facto, o turismo espacial torna-se acessível a outras bolsas, mas recordo-lhe que o turismo espacial começou... há vinte anos. E quanto a isso de «as experiências a bordo» passarem a ter «preços relativamente acessíveis» também me parece outro argumento comercial da Virgin. O programa de experiências espaciais na Estação Espacial Internacional dura desde 2000.
ResponderEliminarNuma improvável hipótese de que aqui retorne para ler a minha resposta ao seu comentário e o demonstre por escrito, José Matos, espero que a repetição do «acontecimento histórico», agora protagonizado pela empresa concorrente de Jeff Bezos, o faça finalmente compreender que não se repetem acontecimentos «históricos» substantivamente idênticos... todas as semanas.
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