08 dezembro 2019

O JULGAMENTO DE TRAICHO KOSTOV

8 de Dezembro de 1949. Uma das notícias em destaque era a de mais um daqueles espectaculares julgamentos tanto ao gosto dos países comunistas da Europa oriental, onde se procurava mimetizar o que acontecera nos finais da década de 1930 em Moscovo. Desta vez, o julgamento-espectáculo tinha lugar em Sofia, capital da Bulgária. O réu-vedeta do julgamento chamava-se Traicho Kostov, fora o segundo da hierarquia do estado e do partido desde Setembro de 1944 até Março passado, quando, em desgraça, perdera todos os cargos políticos e administrativos que exercia e se vira rebaixado à condição de director da Biblioteca Nacional de Sofia. Mas isso fora apenas um degrau da queda. Daí a dois meses e meio, em Junho de 1949, era expulso do partido e preso. Nem seis meses transcorridos aparecia agora no banco dos réus acusado de tudo e mais alguma coisa:
a) de ser o líder de uma organização clandestina que tinha como objectivo derrubar o governo pela violência;
b) de que havia cometido acções visando propositadamente o agravamento das relações amistosas entre a Bulgária e a União Soviética e os outros países comunistas;
c) de que se colocara sob as ordens dos serviços de informações britânicos, americanos e jugoslavos;
d) de que, em funções oficiais e perante governos estrangeiros, havia deliberadamente desempenhado essas funções em detrimento da Bulgária;
e) de que cometera actos visando a desorganização da economia nacional e do sistema de abastecimentos do país;
f) de que mantinha estreitas ligações políticas com Tito (um anátema, pois este último rompera com Estaline!).
Kostov repudiou esta sua detalhada confissão por escrito mas, mesmo assim, o julgamento prosseguiu em sua ausência. A colaboração da vítima era apenas um retoque não indispensável da coreografia do julgamento. Kostov foi enforcado na noite de 16 para 17 de Dezembro de 1949*.
Recorde-se que, nem há dois meses e como aqui evocámos no Herdeiro de Aécio, acontecera um episódio decalcado a papel químico deste na Hungria. Se nos tentarmos colocar na posição dos nossos contemporâneos destes acontecimentos, ser-se então militante comunista e pugnar para trocar a ditadura do professor Salazar por uma outra ditadura que assim se percebe ter aquele contornos era uma atitude que perderia qualquer racionalidade: que se derrubasse a ditadura, mas por um regime que não fosse outra ditadura, ainda por cima mais sangrenta que a que já existia!
* Por coincidência e por esta mesma época, o secretário-geral do PCP, Álvaro Cunhal, que havia sido preso pela PIDE a 25 de Março de 1949, estava a ser julgado. Mas não foi enforcado: não havia pena de morte em Portugal. Faltava-lhe esse avanço socialista.

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