12 fevereiro 2018

REFERENDOS A SÉRIO QUE DEPOIS NÃO FORAM LEVADOS A SÉRIO

12 de Fevereiro de 1956. Uma notícia local muito discreta anuncia a realização de um referendo na ilha de Malta, então possessão britânica. O que a metrópole propunha, através daquele referendo, aos 320.000 malteses que então viviam na ilha, era a hipótese da integração no Reino Unido. De acordo com a proposta, Malta seria representada em Westminster por três deputados (é esse o significado do postal acima), embora possuísse também parlamento e autonomia interna, num formato semelhante ao que vigorava, por exemplo, na Irlanda do Norte. Simultaneamente, eram feitas fortes promessas de que se iriam tomar medidas concretas para que o padrão de vida médio dos malteses se aproximasse do dos habitantes do Reino Unido. O referendo decorreu durante dois dias. No final, o Sim venceu substantivamente recolhendo 67.600 votos (77%) contra 20.200 (23%) de Nãos, mas com uma baixa afluência às urnas, na ordem dos 90.000 eleitores (59% do eleitorado), a mostrar que uma apreciável percentagem deles (havia cerca de 150.000 eleitores registados) se havia manifestado abstendo-se de participar. De qualquer modo, teria sido uma base eleitoral sólida para prosseguir o processo político da integração, não fosse o interesse progressivamente menor do poder britânico. Para estes, a posição estratégica de Malta no centro do Mediterrâneo perdia gradualmente importância com o encolher do Império Britânico. A nacionalização do Canal do Suez pelos egípcios e o fiasco subsequente terá sido um momento crucial para a descoberta pelo Reino Unido de que Malta perdera todo o interesse. Deu-se assim uma inflexão brusca nos propósitos britânicos, o resultado do referendo livre e democrático de há 62 anos foi convenientemente esquecido e oito anos depois, em Maio de 1964, organizou-se um outro referendo, a respeito de uma nova constituição para Malta que concederia, acessoriamente, a independência ao país. Apesar deste referendo desdizer o anterior, também ganhou o Sim com 65.700 votos (54,5%) contra 54.900 (45,5%) de Nãos, uma afluência de quase 130.000 eleitores entre mais de 160.000 possíveis (79,7%). Malta tornou-se independente quatro meses depois desse outro referendo, a 21 de Setembro de 1964, mas, o que me parece mais importante em toda esta esquecida inflexão política, é a lição de que a importância dos referendos está em convocá-los, nos interesses políticos de quem os convoca e nas perguntas que estes últimos colocam ao eleitorado. Neste caso, a partir do momento em que deixou de interessar ao governo britânico integrar Malta no Reino Unido, o assunto saiu de agenda, independentemente de qual fosse a opinião do povo maltês. Muito engraçados são os exercícios dos nacionalistas malteses a procurar desvalorizar os resultados do referendo de 1956 face ao de 1964. A verdade é precisamente ao contrário: os votos favoráveis registados em 1956 (67.600 - 44% de todo o eleitorado) são até mais do que os de 1964 (65.700 - 40%)...

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