Mesmo constatando a existência desde há muito da liberdade de imprensa no Reino Unido, é forçoso constatar a coexistência dela com um consenso entre a opinião publicada para que fotografias como o instantâneo que acima se exibe não apareçam publicadas com frequência nos jornais, mesmo entre aquela imprensa tabloide, mais iconoclasta. Neste caso, a cena passa-se algures perto de Epsom, no princípio do mês de Junho de um dos primeiros anos da década de 1920, quase há cem anos. Na traseira do landau, que se dirige para o tradicional Derby equestre, reconhece-se o rei George V e, à sua esquerda, um dos seus filhos, Henry, o Duque de Gloucester. Mas o que torna a fotografia muito pouco british é a presença de um pedinte que, correndo, acompanha a carruagem estendendo o boné, num gesto universal de quem lhes pede uma esmola. Uma observação mais cuidadosa ao pedinte leva a identificar-lhe uma condecoração batendo-lhe no peito o que indicia que se estará na presença de um veterano da Grande Guerra (1914-18) que há bem pouco tempo terminara. O episódio não deixa de ser notável quando nos lembramos que essa Grande Guerra começara precisamente porque um monarca (no caso, um herdeiro) morrera assassinado a tiro em circunstâncias muito semelhantes às da fotografia. Eu bem sei, por um caso já aqui publicado com Olavo V da Noruega, que não é raro os monarcas andarem por aí sem porta moedas, e talvez isso justifique as expressões constrangidas da realeza naquelas circunstâncias. Mas o momento fotográfico está lá, sem atenuantes, e diz muito, e o que ele diz não é propriamente abonatório, nem para a monarquia britânica, nem para a sua solidariedade social, uma sociedade em que os ricos estão muito distantes dos pobres, um assunto que nem mesmo os famosos jornais sensacionalistas locais gostam de abordar.
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