01 julho 2015

SOBRE A EXPLORAÇÃO, NÃO A ESPACIAL, MAS A DOS FRACASSOS EM ASTRONÁUTICA


Há quase precisamente dois meses (a 29 de Abril), foi lançado um foguetão russo do cosmódromo de Baikonur com uma nave não tripulada transportando reabastecimentos para os seis cosmonautas então em órbita na Estação Espacial Internacional (ISS). Algo terá corrido mal já nas fases finais do lançamento, que puseram a nave a rodar sobre si mesma e incontrolável. São daquelas vicissitudes mais frequentes do que se pensa, o que estranhei desta vez foram as repercussões mediáticas do incidente, registado com uma riqueza de detalhes incomum para quem acompanha esses assuntos. Atribuí a causa a uma espécie de regresso da guerra-fria ao espaço. Embora a gestão da ISS seja um processo de cooperação internacional entre agências e entidades de vários países, a responsabilidade do fracasso do voo da Progress M-27M recaía, inteira, na agência espacial russa, a Roskosmos. E, aparentemente e sabendo-se como são as rivalidades e o ambiente entre norte-americanos e russos, haveria quem nas parcerias concorrentes rejubilasse, estimulando o noticiário sobre o fracasso alheio na comunicação social internacional, enfatizando os problemas defrontados pela Roskosmos, ao mesmo tempo que as mesmas notícias terminavam dando conta que os reabastecimentos perdidos por aquele voo...

...seriam rapidamente e sem dano substituídos por lançamentos de foguetões de entidades concorrentes, casos da agência espacial japonesa, a Jaxa ou então de duas empresas privadas norte-americanas também associadas ao projecto: a SpaceX e a Orbital ATK.¹ E como estas coisas são mesmo para acontecer, por vezes com um retoque de justiça poética, o lançamento da próxima nave de reabastecimento, o voo CRS-7, agora a cargo da SpaceX, veio a ter lugar anteontem (28 de Junho) e saldou-se por um outro fracasso, com o foguetão a explodir dois minutos e dezanove segundos depois de ter sido lançado do centro espacial de Cabo Canaveral. O que me tem divertido nas notícias deste novo desastre, noticiosamente muito mais interessante por já se tratar de um encadeamento de fracassos, é a diferença de como estão redigidas: ainda não se sabe a que se pode atribuir a culpa do fracasso do voo, mas definitivamente não haverá crise na SpaceX. Haverá por aí um axioma que estabelece que os organismos públicos – russos, como a Roskosmos – é que são mal geridos e que as empresas privadas – norte-americanas, como a Space-X – são-no sempre bem. O tópico bem pode ser inequivocamente científico mas não seja por isso que as opiniões induzidas para a comunicação social não passem de profissões de fé ideológica.

¹ Esquecendo-se as notícias de referir que a NASA, a agência espacial norte-americana, não dispõe actualmente de nenhum lançador para missões tripuladas para o espaço. Assim, para habitar a ISS ou se vai em naves russas, ou eventualmente em chinesas (se estes aderirem ao programa), porque em naves norte-americanas ou europeias... não se vai porque não as há.

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