Ainda a pretexto da discrição intrínseca dos holandeses e para quem
conheça a história do nascimento dos Países Baixos, a partir do último terço do
Século XVI (1568), sabe que as Províncias Unidas se revoltaram originalmente
contra a dominação dos Habsburgos, sob a égide de um príncipe francês,
Guilherme de Orange (1533-1584). Mas o inimigo principal dos Países Baixos durante
os três séculos que se seguiram foi a França e a sua ambição assumida – sob Luís XIV,
sob a República e o Império – de se expandir para Norte, anexando-os. Será por isso compreensível que
essa fosse a cultura militar prevalecente no país em 1914, quando do início da Grande
Guerra.
Os Países Baixos eram neutrais mas o Comandante-Chefe holandês, o
relativamente discreto Cornelis Snijders (1852-1939 – tão discreto que a única página que existe a seu respeito na Wikipedia é a holandesa), não escondia as suas simpatias
pró-alemãs. Dessa vez, porque a Alemanha só invadiu a Bélgica, as simpatias daquele
general revelaram-se úteis: as relações militares entre os alemães, que ocuparam
o Norte da Bélgica, e os holandeses foram sempre excelentes entre 1914 e 1918,
embora Snijders tivesse vindo a ficar conotado politicamente por causa disso. Em
1918, quando a maré da guerra se tornara nítida, houve quem, no gabinete
holandês, tivesse pedido a sua demissão – recusada pela rainha Guilhermina.
Em 1933, já reformado, voltamos a encontrar um venerando Snijders de 80 anos a
encabeçar uma pequena formação política entre o conservador e o fascista, a
Aliança para a Reconstrução Nacional, tendo inclusive a sido eleito para o
parlamento. Quando da eclosão da Segunda Guerra Mundial parecia que a cena se
repetiria, só que o posto de Comandante-Chefe era agora ocupado pelo general Izaäk Reijnders (1879-1966). Mas os tempos tinham evoluído, o comportamento da
Alemanha de Hitler era mais imprevisível e as certezas que os Países Baixos se poderiam
manter à parte do conflito que se iniciava em Setembro de 1939 seriam bastante
menores.
A versão que se pode ler na Wikipedia é que Reijnders entrou num
conflito técnico quanto à melhor forma de estabelecer um perímetro defensivo
para o país e que por isso foi afastado pelo ministro da Defesa, Adriaan Dijxhoorn
(1889-1953) em Fevereiro de 1940. Os holandeses são excelentes a tornarem
credíveis estas explicações. O sucessor de Reijnders Henri Winkelman
(1876-1952), mais antigo que o antecessor, já havia até passado à reserva, mas
veio a revelar-se muito mais flexível para o estabelecimento de planos de
contingência de cooperação com os exércitos dos Aliados (belgas, britânicos e
franceses) na eventualidade de uma invasão alemã – que veio de facto a ocorrer
em 10 de Maio de 1940.
Os planos de nada valeram, a colaboração franco-holandesa para a
reconquista das pontes sobre o Moerdjik em 11 de Maio, assegurando a ligação entre
ambos, fracassou e Winkelman veio a render-se quatro dias depois. Mas ao menos
pode dizer-se que, com a inflexão assumida por Winkelman, os Países Baixos não haviam
sido ingenuamente apanhados numa situação militar que não queriam acreditar que
acontecesse (como foi o caso da Dinamarca). Mas se conto isto tudo é porque,
quando vejo as atitudes pelo ministro das Finanças holandês Jeroen Dijsselbloem
(1966- - os generais agora já não mandam nada...),
pergunto-me se ele conhecerá estes precedentes e com eles, manterá a preocupação de não
engajar demasiado o seu país numa estratégia que não será a do próprios...
De cima para baixo, Guilherme de Orange, Cornelis Snijders, Izaäk Reijnders,
Adriaan Dijxhoorn, Henri Winkelman e Jeroen Dijsselbloem.
Sem comentários:
Enviar um comentário