Ainda a propósito de misseis e numa certa continuidade do poste anterior, permitam-me o lamento de, por reconhecer algum armamento, não conseguir embarcar por vezes em certas ilusões cinematográficas. É o caso da cena acima, que foi retirada do filme Atrás das Linhas do Inimigo de 2001, onde um F-18 Superhornet norte-americano realiza um magistral e emotivo bailado evadindo-se a uma bataria de misseis terra-ar de origem nitidamente soviética lançados para o derrubar, até ele ser atingido precisamente pelo último missil, passados alguns minutos de alucinante perseguição e angustiante expectativa. O que é notável é que praticamente tudo está errado naquela cena. Em primeiro lugar porque o avião, à baixa altitude a que o vemos voar, nunca conseguiria bater os misseis em velocidade. Estes últimos são reconhecíveis como tratando-se de 9M37, foram lançados de uma plataforma Strela-10 (conhecida na NATO sob a designação SA-13). Atingem quase imediatamente uma velocidade de Mach 1,6. Ora o F-18 pode atingir essa e até velocidades superiores (até ao máximo de Mach 1,8) mas só o consegue fazer a altitudes muito superiores (40.000 pés – 12 km) onde o ar é muito mais rarefeito. Por isso o avião teria sido rapidamente alcançado pelos mísseis. Mas, em segundo lugar e admitindo-se que não o tendo sido, também não precisaria de se cansar tanto a evadi-los, pois a autonomia de um 9M37 é curtíssima: 5 km de distância, 3.500 metros de altitude, são cerca de 10 a 15 segundos em voo, nada da perseguição assanhada que se vê no filme. Em terceiro lugar, pela configuração das asas, é impossível que aqueles misseis realizassem todas aquelas verdadeiras acrobacias aéreas, verdadeiros contorcionismos a desafiar as leis da aerodinâmica. Para remate e em quarto lugar, o piloto, para adquirir mais manobrabilidade, larga os depósitos externos de combustível do caça e isso é impossível de fazer em voo num F-18 - ao contrário de outros aparelhos, só é possível removê-los no solo. Antes de toda esta recente polémica do Benfica para o Sporting atribuía-se a Jorge Jesus uma frase verdadeiramente interessante, treinava ele o Sporting de Braga e dizia ele que o Sporting de Braga só podia ser campeão (de futebol) na play-station. Pois bem, quando vejo filmes de guerra, e eles estão assim retocados para propiciarem mais emoção, não me conseguem transmitir a essencial ilusão do cinema, tornam-se em algo semelhante ao que Jesus se referia, a um qualquer jogo virtual saído de uma play station.
Óptimo trabalho de investigação!
ResponderEliminarParabéns!