Este poste
precisa de ser redigido com o cuidado de procurar evitar mostrar uma
clarividência do autor quanto à evolução da actual crise europeia que ele não
teve. Mas, depois do problema das crises europeias se ter propagado da Grécia à
Irlanda, a Portugal, a Chipre (de que ninguém fala), sempre considerei que a
conduta do governo português parecia ser a mais razoável: portar-se bem, não fazer
ondas, porque era previsível que o efeito de contágio iria atingir outros
países maiores (Espanha, Itália), o que iria forçar a uma mudança de regras do
jogo na União Europeia.
Apostava-se nisso porque o
liberalismo nos fez esquecer quanto é o poder político que define essas regras do
jogo. Na História não se conhecem, porque irrelevantes, as opiniões dos
presidentes da Siemens ou da BASF sobre a forma como Adolf Hitler
conduzia a política externa da Alemanha nos finais da década de 1930, quando acabou
por precipitar o seu país e a Europa na Segunda Guerra Mundial. Mas, escrevia
eu, o efeito de contágio haveria de chegar aos países e às economias que,
devido à sua dimensão, não poderiam ser socorridas como antes e o caso mudaria
de figura.
Mas não. A
Espanha anda há uns meses a fazer de conta que não está aflita, porque quem a
poderia ajudar não sente o problema como aflição sua, enquanto Madrid engole os maiores desaforos de Barcelona e ontem a Moody’s baixou o rating da República Francesa. De Gaulle teria perguntado ironicamente se a Moody’s se
tratava de uma empresa de refrigerantes rival da Coca-Cola, mas o seu
sucessor François Hollande está condicionado a levá-la com outra seriedade. Mas se
a inundação já molha os pés dos franceses evidencia-se que não há pão na casa europeia.
E, se eu
antecipara que os acontecimentos seriam razoavelmente assim, a situação agora afigura-se-me
descontrolada, como um filme que perdeu o script, como se, para recuperar o período histórico usado mais acima, depois da Áustria e da Checoslováquia, a Alemanha tivesse invadido a Polónia e as potências ocidentais tivessem contemporizado
uma vez mais*. Depois disto, embora não se sabendo como, apenas resta a certeza
que a Europa se irá federar… ou desagregar. Como aconteceu com Cunhal, a vida parece
reservar a Mário Soares a amargura de assistir com vida ao desmoronar do seu
projecto.
* Em vez da declaração de guerra franco-britânica.
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