21 julho 2007

OS MIRAGE III E OS MIG 21, OS COW-BOYS E OS ÍNDIOS DO AR

O Estado de Israel passou os primeiros 20 anos da sua existência (1948-67) a desenvolver um notável programa de capitalização das simpatias alheias, a começar pelos sentimentos de remorso dos países vencedores da Segunda Guerra Mundial. Poucos saberão que a União Soviética de Estaline foi a primeira potência a reconhecer o Estado de Israel e que a Checoslováquia foi um dos seus primeiros fornecedores de material de guerra. Só depois, a lógica da Guerra-Fria os colocou em campos opostos.

O sucesso do programa constatava-se nos princípios de 1967 quando o bloco ocidental em peso tomava como suas as penas de Israel no conflito israelo-árabe. Depois, Israel passou os 40 anos seguintes a ser muito mais selectivo nas opiniões públicas que procurava cativar (Estados Unidos), até chegar à situação actual, onde a hostilidade europeia o levou a desenterrar o fantasma do congénito anti-semitismo europeu… Mas isso, não interessa agora para a nossa história.
Pelo contrário, nessa outra encarnação eram os norte-americanos que eram antipáticos e não queriam fornecer a aviação militar aos israelitas que se equilibrasse áquela que os soviéticos estavam a fornecer aos países árabes. Foi a oportunidade de ouro de ver os produtos da indústria francesa (os caças Mirage III – primeira fotografia) a participarem no que era percebido como uma frente de combate da Guerra-Fria contra o último grito da tecnologia soviética (os caças Mig 21 – fotografia de baixo).
Nesta disputa explicada com a simplicidade de um jogo de crianças, com cow-boys bons e índios maus, a reputação do Mirage III cresceu subitamente, como se fosse impulsionada por um afterburner (ou pós-combustão*), devido ao sucesso israelita na Guerra dos Seis Dias, em Junho de 1967, que começou a ser ganha quando os israelitas adquiriram superioridade aérea sobre os árabes: os combates terrestres – donde Israel saiu sempre vitorioso – foram todos travados sob um céu israelita

Sob essa impressão de superioridade técnica, o Mirage III tornou-se um poderoso argumento da política externa francesa junto da generalidade dos países árabes, especialmente os produtores de petróleo. Assim, em 1970, por exemplo, a França acordou vender 50 Mirages III à Líbia, numa transacção aparentemente absurda para um país que tinha naquela época uma força aérea militar incipiente. O tema foi levado também para a ficção, nomeadamente através da BD de Tanguy e Laverdure (abaixo).
O emirato dessa ficção chamava-se Sarrakat, ficava algures na península Arábica, era riquíssimo em petróleo (claro está!) e o emir designado chamava-se Azraf, estava a formar-se incógnito como piloto de caça na força aérea francesa e era baixinho e com um bigode fino, parecia decalcado da figura do rei Hussein da Jordânia. Os maus tinham usurpado o trono e comprado Migs 21 e Azraf, quando chegasse ao trono, iria provavelmente comprar muitos Mirages III, que os bateriam em combate aéreo (abaixo)…
A verdadeira História é outra… A esmagadora maioria da aviação árabe (incluindo os Mig 21) foi abatida no solo – como se vê na fotografia abaixo, onde ainda se nota a silhueta do Mirage III de reconhecimento, encarregado de avaliar os estragos… – e os resultados dos combates individuais no ar travados naquela Guerra, embora fossem globalmente favoráveis aos israelitas, isso resultava muito mais do melhor treino fornecido aos seus pilotos do que às características técnicas dos aparelhos que pilotavam…
O que os israelitas pensavam realmente da superioridade dos Mirage III face à tecnologia soviética, veio a compreender-se depois, quando eles não descansaram enquanto não equiparam a sua força aérea, no final da década de 70, com caças F-15 de origem norte-americana e não impediram os seus potenciais oponentes – nomeadamente o Egipto – de os vir a adquirir. Hoje, os F-15 – um caça que é só operado por israelitas, sauditas e japoneses, além do país de origem... – ainda constituem a coluna vertebral da sua força aérea…

* Dispositivo acoplado aos tradicionais motores a reacção que permite, à custa de um consumo de combustível múltiplo do normal, obter acelerações significativas. Só costuma ser usado pela aviação militar.

2 comentários:

  1. Embora a aviação egípcia tenha sido destruída no solo, os combates aéreos "Mirage"-"Mig-21" deram vantagem ao primeiro devido ao melhor treino dos pilotos, que se deram ao luxo de abater os "Mig" a tiros de canhão... Parece que os mísseis "ar-ar" da "Matra" eram demasiado caros!!!

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  2. Caros e sobretudo escassos, pois qualquer stock de mísseis tende a desaparecer rapidamente quando uma força aérea entra em operações de combate, como os argentinos descobriram em 1982, quando gastaram os seus Exocet e queriam comprar mais aos franceses...

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