29 março 2018

JUAN CARLOS DE BORBON: CINQUENTA E SEIS ANOS DE «BOA IMPRENSA» (até 2012...)

29 de Março de 1956. Num acidente trágico com arma de fogo, morre Alfonso, o filho mais novo de Juan de Borbon, o pretendente ao trono espanhol, que então vivia exilado no Estoril. Uma daquelas notícias pertinentes por se tratar de quem se trata e que valeria a pena desenvolver informativamente como o faz o Diário de Lisboa do dia seguinte (abaixo). Mas, mais importante do que a notícia - que tem um amplo desenvolvimento nas páginas interiores - explica, é aquilo que a notícia não explica. Típico de um jornalismo controlado pela censura como então acontecia em Portugal, as explicações sobre o que acontecera esquecem-se de referir que fora o irmão mais velho, o príncipe Juan Carlos, que disparara o tiro fatal. A mesma mordaça, ou ainda pior, se verificava também na imprensa espanhola onde o acidente tivera, como se imagina, ainda mais repercussão. Aí, a versão oficial - falsa - era que o ferimento fatal fora auto-inflingido.
Aliás, pode-se constatar quanto o tema era delicado e a omissão deliberada, logo através da escolha da fotografia usada pelo Diário de Lisboa para ilustrar a notícia, uma demonstração de amor fraterno que é protagonizada pelo príncipe Juan Carlos (então com 18 anos) para com o seu irmão Alfonso (de 14). Mas, num processo que hoje está (felizmente) esquecido, as redes sociais de há 62 anos puseram a circular a verdadeira versão dos acontecimentos, com o peso adicional de que, porque fora abafado pela censura, se tratar de um segredo (o que tinha um outro valor informativo!). Conclusão: pelo menos em Portugal todos souberam que fora Juan Carlos a disparar o tiro fatal. A questão perpetuou-se e serviu para, durante anos, alimentar teorias da conspiração alimentadas pelos círculos republicanos. Muito mais eficazes se mostraram os outros círculos que protegeram a imagem mediática de Juan Carlos, como príncipe e depois como rei, nos cinquenta e tal anos que se seguiram.
Observada agora a uma distância de seis anos, é forçoso constatar a fragilidade da imagem pública de Juan Carlos, quando se percebe a facilidade como ela se desmoronou completamente na sequência de um acidente (por coincidência associado à caça e também a armas de fogo...) ocorrido durante uma caçada no Botswana, estava a Espanha em plena crise económica em 2012. Tantas vezes amparado desde a sua ascensão ao trono em 1975, sobretudo quando das suas hesitações por ocasião do 23F (1981), dessa vez, por detrás das prontas desculpas do rei, assistiu-se subitamente a uma exposição dos segredos da casa real, que terão tornado a sua permanência no cargo insustentável. Actualmente, a repescagem da intensa vida sentimental de Juan Carlos tornou-se um tema de cariz cómico: Juan Carlos “tinha um helicóptero” só para se encontrar com amantes ou então Juan Carlos encontrou-se com amante num barco, mas rainha chegou e amante foi atirada à água. Estranha reviravolta da protecção que lhe começaram a conceder desde há 62 anos.

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