14 abril 2014

A CAMPANHA DE 1815

Ainda nem um ano decorrera depois da sua abdicação e já Napoleão se aborrecia de morte na ilha de Elba para onde fora desterrado. Em 26 de Fevereiro partira com um destacamento de 600 homens da guarda que os Aliados haviam tido o obséquio de lhe deixar e em 20 de Março, à custa das deserções entre as unidades militares enviadas para o combater, regressava a Paris em glória. Já aqui os mencionei, mas os consecutivos cabeçalhos de O Monitor, o jornal oficial da monarquia de Luís XVIIII são um exemplo único, não apenas de História mas também de Ciência Política, de como, quando seriamente confrontado, um regime se pode decompor tão rápida quanto espontaneamente:

O ogro da Córsega acaba de desembarcar no golfo Juan.
O tigre chegou a Gap.
O monstro dormiu em Grenoble.
O tirano atravessou Lyon.
O usurpador está a quarenta léguas da capital.
Bonaparte avança a grandes passos, mas nunca entrará em Paris.
Napoleão estará amanhã em frente das nossas muralhas.
O imperador chegou a Fontainebleau.
Sua Majestade Imperial entrou ontem no Castelo das Tulherias, no meio dos seus fiéis súbditos.
Mas descontando a aspecto caricatural da solidez do poder restaurado dos Bourbons, a situação estratégica da França não mudara em relação à que existira em 1814, como se comprova pelo mapa acima. Sobre ela recomeçaram a confluir, como acontecera no ano anterior, um conjunto de exércitos aliados, a um ritmo apenas perturbado pela remobilização de quem já se pensava em paz. Desta vez, Napoleão ainda contou com a Primavera para organizar e abastecer as forças de que dispunha. Mas a iniciativa, mais uma vez, tinha que ser sua: a 15 de Junho ele atravessava a fronteira norte e no dia seguinte engajava-se e vencia os prussianos em Ligny. Depois venceu em Wavre. Porém, dois dias depois, Napoleão já não conseguiu fazer o mesmo com britânicos em Waterloo (veja-se a sequência abaixo). Haviam sido estes últimos, recorde-se, que até haviam chegado atrasados à conquista de Paris no ano anterior, mas desta vez terão sido eles a assestar o golpe de misericórdia nas ambições de Napoleão.
Há que reconhecer que, apesar do aspecto simbólico, do ponto de vista estritamente militar o desfecho da batalha de Waterloo terá apenas simplificado o desfecho desta campanha de 1815 que, de outro modo e como no passado, teria de prosseguir com outras manobras e ainda mais batalhas tácticas de Napoleão a tentar impedir desesperadamente que não só os britânicos e os prussianos, mas também os 150.000 russos e os 200.000 austríacos ainda mais distantes se concentrassem junto a Paris numa outra força de combate combinada impossível de derrotar. Como num segundo encore de uma actuação teatral, desta já não foram precisas as hesitações de 1814: Napoleão abdicou por uma segunda vez e irreversivelmente logo em 22 de Junho.
Em marchas forçadas, nos primeiros dias de Julho, britânicos e prussianos já estavam nos arredores de Paris. O tratamento dado pelos vencedores à França vencida foi desta vez substancialmente mais severo: pessoalmente, Napoleão foi desterrado para a ilha de Santa Helena perdida no meio do Atlântico Sul; territorialmente, alguns territórios que haviam permanecido franceses (acima: Philippeville, Saarbrücken, Landau e Chambéry) foram-lhe retirados; financeiramente, foi estabelecido um oneroso programa de reparações garantido pela presença de tropas de ocupação em território francês (abaixo), um processo que a França viria a conhecer por mais duas vezes, em 1870 e 1940.

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