
O mundo da diplomacia sempre me pareceu cosmético. Um jogo de espelhos em que nada será o que parece.
Com excepção de Ana Gomes. Mas aí, confesso que gostaria de ter presenciado os seus exames de admissão à carreira para descobrir quem e como a deram como aprovada… Quando pessoa amiga me explicou que naquele mundo o embaixador é o embaixador, a embaixadora é a embaixadora (como Ana Gomes…) e ainda há o
cargo de embaixatriz (a mulher do embaixador) percebi que o mundo da diplomacia é tão
subtil que
pôde ter entregue uma declaração de guerra à gramática da língua portuguesa e ninguém ter dado por isso…
É que há uma regra de formação dos femininos, vinda do latim, a língua dos romanos, aqueles
chatos por vezes tão pouco diplomáticos, que estabelece que o feminino de palavras como imperador, embaixador ou actor se forma com o sufixo
–triz: imperatriz, embaixatriz, actriz. O que suponho tenha acontecido é que o mundo diplomático se tenha confrontado com gerações sucessivas de esposas de embaixadores com um
carácter mais assertivo que assumiam como suas por
osmose a importância e o título dos cônjuges e tenha havido a necessidade de distinguir essas
pretensas das outras, as
legítimas, quando a carreira se abriu enfim às mulheres.

Note-se que o preço a pagar em
ridículo por esta solução tão diplomática quanto criativa (mas não canónica...) é que o marido de uma embaixadora pode vir a ser diplomaticamente designado por
embaixatriço… Mas o propósito deste extensíssimo preâmbulo é o de relembrar a capacidade de interferência que as ditas
embaixatrizes podiam (podem) assumir na actividade dos cônjuges, nomeadamente quando das inerentes actividades sociais que envolvessem a presença do casal… Uma qualquer quezília conjugal poderia provocar a provável retaliação social por parte da
embaixatriz que deixaria sempre o embaixador perante um dilema…
Ou
fazia as pazes com a embaixatriz ou comparecia na cerimónia sozinho pretextando que a consorte tinha uma daquelas
doenças diplomáticas – uma solução sempre de curto prazo… – ou então fazia-se acompanhar por ela, pagando o seu
preço nas expressões mal encaradas e contrariadas que a consorte entendesse distribuir durante a ocasião. Ou seja, o mesmo dilema que se colocava a José Sócrates em relação a Teixeira dos Santos por ocasião da sua comunicação televisiva de ontem... O primeiro-ministro optou pela última solução e tivemos direito a uma contínua expressão carrancuda do ministro das Finanças ao longo da alocução…
Nota: A fotografia inicial foi copiada do
blogue duas ou três coisas do embaixador Seixas da Costa, a quem a agradeço, assim como a constatação que se tornou
diplomaticamente correcto escrever os títulos dos cargos, por mais importantes que sejam (primeiro-ministro, juiz, general, embaixador), em letra minúscula.
Cá para mim, a Ana Gomes entrou naquela época em que ainda não havia juízas e outras profissões de prestígio, tradicionalmente ocupadas por homens. Aí pelo fim dos anos 70, princípio da década de 80.
ResponderEliminarEntão, as primeiras candidatas tiveram um pequeno bónus e entrou tudo que se apresentou a concurso, desde que munidas da respetiva licenciatura.
Funcionou o politicamente correto e também o facto de haver ainda poucas pretendentes.