Na Quinta-Feira que passou (30 de Maio), Angela Merkel esteve numa visita particular aos Estados Unidos, mais precisamente à reputada universidade de Harvard (Boston), onde foi convidada a fazer o discurso de graduação dos finalistas. O discurso começou em inglês, depois passou a ser em alemão (o que o tornou mais demorado, por causa da tradução) e acabou novamente em inglês. No total, uns 35 minutos, que poucos terão disposição de ouvir. O que é uma pena. Depois de catorze anos como chanceler da Alemanha e depois de anunciar que não se recandidata, Angela Merkel parece estar com uma disposição de não se ater a alguns dos protocolos que regem as relações internacionais, atitude que não deixa de ser interessante nesta época que é tão pontuada pela comportamento não convencional de Donald Trump. Figurão esse que foi um dos principais alvos do discurso de Angela Merkel, embora o tivesse sido com aquela cortesia cínica e cerimoniosa do velho continente, nunca o mencionando expressamente. O momento que considerei mais interessante foi aquele em que Angela Merkel, glosando o momento em que Ronald Reagan havia ido a Berlim instar Mikhail Gorbachev a deitar abaixo o outro Muro, apelou para que se derrubassem agora «os muros da ignorância e das mentalidades mesquinhas» («tear down walls of ignorance and narrow mindedness.») Os aplausos da audiência comprovaram que a popularidade de Donald Trump entre as elites académicas do outro lado do Atlântico também não será muito elevada. Mas o discurso vale por muito mais do que as críticas, vale pelas ideias e pelo que a oradora defende em alternativa, sugiro que seja ouvido.
Mas o que é curioso em toda esta história só começa agora. É que o discurso de Angela Merkel, apesar de interessante e mesmo com passagens noticiosamente potentes, passou completamente desapercebido do noticiário mundial, e isso incluiu sobretudo todas aquelas cadeias de televisão americanas que adoram dizer mal de Donald Trump: CNN, MSNBC, etc. Ora aqui elas tiveram um pratinho cheio mas, quiçá por causa da nacionalidade de quem criticava o figurão, o assunto pura e simplesmente não aconteceu. Claro que não passando pelos Estados Unidos, a nossa comunicação social nem cheirou o assunto, que isto de perceber alemão é muita complicado. E eu teria encerrado de bom grado o assunto por aqui se, quatro dias depois, não visse aqueles mesmos canais a transmitir em directo o mesmo figurão a passar em revista uns gajos mascarados... Pelos vistos, Trump veio à Europa. E isso é importante?... Isto já não me parece apenas a intenção de que detestemos Trump, trata-se mesmo do formatar das razões pelas quais estas cadeias de televisão querem que detestemos Trump.
Adenda: Quanto ao facto da nossa comunicação social se limitar a fazer uma ressonância acéfala do que os norte-americanos escolhem publicar, o exemplo abaixo do Observador é emblemático. Para mais quando é evidente, pelos títulos das notícias, que não aconteceu nada de importante que valesse a pena noticiar: Trump almoçou, jantou, lanchou... - todo o conjunto, sobretudo as fotografias com as toilletes da Melania figurariam muito bem numa daquelas revistas cor de rosa.
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