23 de Janeiro de 1918. Intercalado no meio dos acontecimentos dominantes da Grande Guerra, o papa Bento XV (abaixo, à esquerda) beatifica Nuno Álvares Pereira. O reconhecimento das virtudes do novo beato, especialmente nos seus últimos anos de vida, depois de aos 63 anos se ter tornado monge carmelita, foi particularmente moroso. Falecido em 1431, o processo da beatificação de Frei Nuno só se concluiu quase 500 anos após a sua morte. O Portugal que recebia a notícia assistia em simultâneo à experiência do presidencialismo conservador de Sidónio Pais. Por coincidência e daí por um mês, o governo português irá proceder à revisão da Lei de Separação do Estado das Igrejas, promovendo a reaproximação e o restabelecimento das relações diplomáticas de Portugal com o Vaticano, rompidas desde 1911. Mas o interesse dos conservadores portugueses não se irá ficar por ali, incentivando a partir de meados da década seguinte (1920) a causa da canonização do beato Nuno Álvares Pereira que, com a implantação do Estado Novo, recebeu a designação simpática (ainda que prematura) de Santo Condestável. Como acontecera em França com Joana d'Arc que, por coincidência, também morrera em 1431, e que fora beatificada em 1909, depois canonizada em 1920, pelo mesmo Bento XV, também por cá o Estado Novo queria arranjar um guerreiro-místico português e o precedente de França (11 anos!) mostrava-lhe que uma pressão discreta sobre o Vaticano não seria descabida para encurtar prazos para a canonização de Nuno Álvares Pereira, a tempo do novo Santo poder figurar em destaque nas cerimónias do regime de 1940, celebrando o duplo centenário da Fundação (1140) e da Restauração (1640). Por muito boas que tivessem sido, de reputação, as relações entre Portugal e a Santa Sé nessa altura, a verdade é que alguém no Vaticano se deve ter chateado com tanta insistência da parte portuguesa. E o dossier foi para debaixo da pilha e passaram-se décadas sem ouvir falar dele. Houve que esperar quase outro século (91 anos!), até 2009, sob o pontificado de Bento XVI, para que Nuno Álvares Pereira se tornasse canonicamente Santo, numa época em que o assunto já se tornara politicamente irrelevante.
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