07 abril 2012

ONDE É QUE FICA O MALI?

No passado dia 22 de Março, unidades militares malianas comandadas por oficiais de baixa patente (a face mais visível do movimento é um capitão) tomaram o poder em Bamaco, capital do Mali. Longe vão os anos em que episódios destes nos jovens países africanos eram uma rotina tolerada. Primeiro, porque os jovens países africanos deixaram de ser jovens – o Mali já é independente há mais de 50 anos. E depois, porque os modismos da ordem internacional atravessam tempos acentuadamente anti-militares e, quando de um golpe de estado contra um governo saído de eleições, está convencionado que os militares nunca têm razão para o derrubar, e que, mesmo em caso de dúvidas, se aplica esse dogma de fé.

O novo regime militar maliano, que se baptizou com o nome de Comité Nacional para a Recuperação da Democracia e Restauração do Estado (CNRDRE), veio a ser acolhido com uma hostilidade manifesta por todos os agentes internacionais. Da França, antiga potência colonial, e pela voz do ministro dos negócios estrangeiros Alain Juppé, veio a condenação do golpe e a defesa do respeito das regras democráticas e constitucionais. O secretário-geral da ONU, Ban-Ki Moon, manifestou o apoio da organização que dirige à ordem constitucional no Mali. O problema é que a tal ordem constitucional se mostrava bastante desordenada e terá sido contra essa desordem que os golpistas agiram.

Não teria sido preciso um acompanhamento muito detalhado da situação política interna maliana – e por isso as declarações de Juppé e Ban-Ki Moon são indesculpáveis pela sua hipocrisia – para se saber como o regime deposto do presidente Amadou Touré se estava a mostrar impotente para enfrentar as revoltas secessionistas que, desde Janeiro deste ano, se desencadearam no Norte do país. Essa foi a causa invocada pelos militares do CNRDRE para o golpe e, nessa perspectiva, compreende-se melhor que eles tenham atropelado a ordem constitucional do Mali à procura de novas soluções que preservassem a integridade territorial do Mali, conforme os acontecimentos posteriores vieram demonstrar.
Nem de propósito, o movimento secessionista nortenho com o nome de Movimento Nacional de Libertação Azawad (MNLA) proclamou a 6 de Abril a independência do Norte do Mali baptizado com o nome de Azawad (acima¹). Embora, na guerra da informação, haja uns cromos que querem passar a ideia que as causas para isto só têm 15 dias e começaram apenas depois do golpe de estado², parece perceber-se agora que a situação interna no Mali seria muito mais grave do que pareceria e que não terá adiantado muito à comunidade internacional andar a descarregar as culpas nos militares golpistas porque, ao enfraquecerem-se as forças do governo central, apenas se incentivaram as do separatismo.

Numa pirueta cuidadosamente encenada para não parecer pirueta, os representantes dos países da vizinhança (CEDEAO) assinaram rapidamente com os militares um acordo-quadro para a criação de um governo que terá a missão de conduzir a transição, gerir a crise no Norte do país e organizar eleições livres, transparentes e democráticas. Ou seja e decifrando (que isto de organizar eleições livres, transparentes e democráticas em países que estão divididos em dois poderes políticos antagónicos assemelha-se à quadratura do círculo): os regimes militares podem tornar-se afinal menos maus quando exista a ameaça que o próprio país se cinda internamente pelas suas fracturas étnicas…

¹ Apesar das aparências geográficas, em Azawad, por ser desértica, vive apenas 10 a 15% de toda a população maliana.
² Há também quem mostre não perceber patavina do assunto, confundindo tudo e todos.

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