28 julho 2013

A CHEGADA A LONDRES DA MARCHA DE JARROW

Jarrow é uma cidade do norte de Inglaterra a cerca de dez quilómetros de Newcastle. Os problemas da cidade com o desemprego datam da Grande Depressão na década de 1930 e, não por acaso, desde essa época, há quase oitenta anos, que os deputados eleitos por aquele círculo eleitoral têm sido continuamente do Partido Trabalhista. Em 1936, a deputada local Ellen Wilkinson, também conhecida por Ellen-a-Vermelha, tanto por causa das suas convicções radicais como pela cor do seu cabelo, promoveu uma marcha em direcção a Londres para chamar a atenção para o gravíssimo problema do desemprego em Jarrow que então se cifrava em valores próximos dos 70%! Os cerca de 200 marchadores demoraram quase um mês a percorrer os quase 500 km que separavam Jarrow de Londres, onde chegaram na noite de 31 de Outubro, momento pintado acima. Política e economicamente a marcha não foi nenhum sucesso: o primeiro-ministro conservador Stanley Baldwin recusou-se a receber uma delegação sua, alegadamente para não estabelecer precedentes; a petição de 11.000 assinaturas que os acompanhava foi acolhida na Câmara dos Comuns com palavras de simpatia mas sem quaisquer medidas concretas quanto à reanimação da indústria da construção naval de Jarrow.
O que torna o quadro do início interessante não é evidentemente a mestria do autor, antes a rivalidade que o separava da promotora da marcha. Thomas Dugdale que o pintou era não apenas um esteta dândi que exibia ostensivamente um lenço colorido no bolso do colete para se distinguir dos tons desmaiados em voga à época, mas também um político conservador, membro do parlamento por Richmond, um círculo eleitoral vizinho e rival do de Jastrow no norte de Inglaterra que, em vez de se tornar vermelho, virara azul com um historial - actual - de mais de um século elegendo consecutivos deputados conservadores. A pintura realça o contraste entre dois mundos, um deles representado pelos dois jovens, ele indolente e alheio, ela lânguida mas curiosa, que fumam os seus cigarros por boquilhas, enquanto o fogo do mundo exterior é representado pelos clarões das tochas dos marchantes que aparece diluído numa espécie de borrão anónimo onde não se esquecem as silhuetas tranquilizadoras da fila de polícias a cavalo que a acompanham. A indiferença posada, nesta pintura praticamente desconhecida tão bem protagonizada pelo jovem que se entretém a fazer argolas de fumo, ocorreu-me a propósito do perfil dos participantes na recente cerimónia da tomada de posse e reposse dos dezanove secretários de estado (foto acima).
Sabe-se o quanto à esquerda se tem a irritante mania de deter o monopólio das preocupações sociais, o que historicamente até nem sempre é suportado pela verdade, mas também tem sido verdade que a imagem promovida pelo actual governo nos últimos dois anos e o seu constante alheamento ao impacto e aos efeitos colaterais da acção governativa, tão bem sintetizada naquela fotografia de gente eficiente mas sem mais nada, até pode conseguir transformar em potenciais manifestos anti-governamentais velhos cartazes eleitorais do CDS de 1975…

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